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Ciência e Cultura
Print version ISSN 0009-6725On-line version ISSN 2317-6660
Cienc. Cult. vol.54 no.2 São Paulo Oct./Dec. 2002
BIOMECÂNICA
O grande e lento Tyranossaurus rex
A evolução da biomecânica tem permitido enormes avanços no entendimento de como ocorre a integração funcional de músculos e ossos para a realização de certos movimentos. Em particular, esses estudos são extremamente úteis para profissionais de Educação Física, médicos e fisioterapeutas, que podem investigar de modo preciso causas e tratamentos para situações específicas. Mas a aplicação desses estudos biomecânicos não se restringe à medicina.
Em recente estudo publicado na revista Nature, os pesquisadores americanos John Hutchinson e Mariano Garcia divulgam estimativas mais precisas sobre o movimento de um ser que já está extinto há milhares de anos, o Tyrannosaurus rex. Mesmo pesando cerca de seis toneladas, e com pernas de aproximadamente dois metros e meio, especulava-se que os T. rex podiam se mover a velocidades elevadas, de até 72 km/h. Essas estimativas eram baseadas em comparações anatômicas com outros animais de proporções similares.
Os pesquisadores americanos consideraram que as estimativas existentes indicavam que o T. rex era muito veloz para o seu tamanho, e usaram a biomecânica para criar um modelo no computador capaz de analisar a massa muscular necessária para efetuar a corrida. Inicialmente, eles criam um modelo do animal e um diagrama de forças para determinar a massa muscular mínima por perna para manter o equilíbrio estático. Usando o modelo, foi concluído que o T. rex precisaria quase 90 % de sua massa total nas pernas para conseguir correr, o que é impossível (o valor máximo já observado em vertebrados é da ordem de 50%).
Esse resultado decorre do fato bem conhecido de que a massa de uma criatura aumenta muito mais rapidamente com o tamanho do que a força que os músculos podem exercer. Ou seja, quando os animais vão crescendo, os seus músculos têm que ser cada vez maiores para suportar seu próprio peso. Mas, com os músculos, aumenta-se o peso, o que certamente limita o tamanho final e os movimentos possíveis.
O modelo foi ainda testado em galinhas e jacarés e, nesses animais, os resultados concordam com as predições, indicando que uma galinha já poderia correr com aproximadamente 9% de sua massa nos músculos das pernas. Sabe-se que uma galinha tem 17% da massa em suas pernas (mais do que suficiente para correr), mas uma galinha de 6 toneladas teria que ter 99% da massa total em cada perna para conseguir esse mesmo feito (o que comprovadamente é impossível).
Com certeza a resposta sobre a questão da velocidade dos dinossauros não está respondida, pois muitos dos parâmetros necessários nos cálculos são, obviamente, estimados no caso de animais extintos. Entretanto, postula-se agora que, no máximo, um T. rex poderia correr a 20 km/h, velocidade suficiente para alcançar outros dinossauros mais lentos, suas presas naturais. De um modo geral, esse estudo em particular mostra que a união de ciências aparentemente tão distantes, como antropologia, biologia, anatomia e física, pode trazer resultados interessantes.
Marcelo Knobel