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    Ciência e Cultura

    versão impressa ISSN 0009-6725versão On-line ISSN 2317-6660

    Cienc. Cult. v.55 n.1 São Paulo jan./mar. 2003

     

    Pintura

    O PERCURSO DE REBOLO E DO SANTA HELENA

     

     

    Duas exposições em São Paulo durante o segundo semestre de 2002 homenagearam a produção de um movimento da pintura contemporânea brasileira que, até hoje, não é devidamente reconhecido como tal. Rebolo 100 anos, inaugurada no Museu de Arte Moderna (MAM) na data de aniversário do imigrante espanhol Francisco Rebolo Gonsales em 22 de agosto, e Operários na Paulista, uma realização do Museu de Arte Contemporânea (MAC) com o Sesi, reunindo obras que contam a história do Grupo Santa Helena.

    Diferente dos pintores modernistas, artistas vinculados à elite paulistana do início do século passado que patrocinou a Semana de Arte de 22, os pintores "proletários" ­ onde se incluem Rebolo, Volpi, Pennacchi, Bonadei, Rizzotti, Zanini, Clóvis Graciano, Manoel Martins e Humberto Rosa ­ foram mestres autodidatas das tintas. Misturando seu trabalho de sobrevivência em profissões tão diversas como mecânico, açougueiro ou pintor de paredes, imprimem na pintura contemporânea brasileira, paisagens, cores e tons comparáveis aos grandes mestres internacionais. São reconhecidos pela técnica das cores e pela proximidade com pintores do Novecento italiano ou do Impressionismo francês; tudo sem que tivessem contato direto com o exterior, devido à sua origem humilde.

    "Com exceção de Fúlvio Pennacchi, que veio adulto da Itália e que teve contato com o que se produzia lá fora, os demais não dominavam as regras da pintura, não tinham feito cursos, não conheciam esses mestres; aprendiam uns com os outros, no diálogo profícuo entre as paredes do Santa Helena da década de 30. A aproximação com os impressionistas, atribuída e identificada em algumas obras, foi acidental", explica Elvira Vernaschi, historiadora e crítica de arte que dividiu a curadoria da exposição do MAM com Lizbeth Gonçalves, filha de Rebolo.

    É o caso da semelhança do quadro "Cena de jogo num bar", de Rebolo com a pintura de mesmo tema retratada por Cèzanne ­ de quem ele nunca tinha ouvido falar. É o que mostra um depoimento capturado pelo documentário de Olavo Tavares de Araújo, integrante da mostra: quando perguntado sobre o pintor francês, quis saber em que bairro morava ou se era torcedor do Corinthians, um dos times onde Rebolo jogou profissionalmente como ponta-direita e para quem criou o símbolo definitivo do timão, com âncora e remos agregados à bandeira paulista. "Como pintavam diretamente da natureza, essa semelhança ocorreu em diversos momentos, de forma não proposital", acrescenta a curadora.

    A exposição comemorando o centenário do pintor conseguiu reunir, de um acervo bastante espalhado entre membros da família, particulares e instituições, 150 pinturas a óleo, além de fotos, documentos, objetos e o filme/documentário. Essa panorâmica da trajetória produtiva de Rebolo começa em 1934, quando aluga salas do edifício Santa Helena, destruído algumas décadas depois para a construção do pátio do metrô entre as praças da Sé e Clóvis Beviláqua, na capital paulista, e constitui um movimento importante da pintura contemporânea.

     

     

    Embora Rebolo e os amigos, que se agruparam em torno do Santa Helena, não sejam merecidamente reconhecidos como movimento e nem tenham a exaltação dos nomes da Semana de Arte de 22, suas obras são essenciais para construir a identidade nacional na pintura contemporânea. Para Elvira, a intenção da mostra era celebrar a vida produtiva do pintor, que se manteve ativo até meses antes de sua morte em julho 1980, e expandi-la também para outras instituições, num projeto que começou três anos antes, sob o comando de Lizbeth Gonçalves. A exposição Operários na Paulista, sob coordenação da diretora do MAC, Elza Ajzenberg, cumpriu esse papel, ao compor um cenário fundamental para entender a arte originária do Santa Helena. O objetivo agora é viajar com a exposição de Rebolo, primeiramente para a Bahia, o que vem sendo negociado com o MAM, que facilitaria uma extensão da viagem até o Ceará, cujo significado se amplia pois algumas obras expostas mostram paisagens da região, resultado de suas viagens ao Nordeste entre os anos de 1971 a 1979.

    Dois projetos em andamento, a cargo também de Lizbeth, devem consolidar a comemoração a Rebolo: a criação do Instituto Rebolo a ser instalado na casa onde o pintor viveu a maior parte de sua vida, no Morumbi, e que está intacta; e relançamento do livro Rebolo, publicado em 1986 sob patrocínio da empresa MWM, e que foi revisto para a próxima reedição, antecipa Elvira.

     

    Wanda Jorge