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    Ciência e Cultura

    Print version ISSN 0009-6725On-line version ISSN 2317-6660

    Cienc. Cult. vol.55 no.2 São Paulo Apr./June 2003

     

     

    ACUPUNTURA

    Diminui preconceito entre médicos brasileiros e cresce procura por tratamento com agulhas

     

    A acupuntura começa a ocupar espaço nos ambulatórios públicos e cresce a procura de pacientes por esse tipo de tratamento, assim como dos médicos em se especializar na área. Hoje, já existe atendimento público em Porto Alegre, Maceió, Vitória, Teresina, Curitiba, Fortaleza, Manaus, Florianópolis, Brasília e Campinas. Os principais centros de pesquisa em acupuntura estão na China, Japão, Coréia, EUA e Alemanha. No Brasil, a prática de tratamento com agulhas chegou provavelmente junto com imigrantes japoneses, há mais de 100 anos e, apenas em 1995, o Conselho Federal de Medicina reconheceu a acupuntura como especialidade médica.

    A eficiência da acupuntura sempre foi um tema polêmico no ambiente médico brasileiro mais ortodoxo, embora seja uma prática milenar na China. Para Paulo Farber, médico pesquisador da Universidade de São Paulo (USP), a associação errada - e freqüentemente estimulada pela mídia - da acupuntura com o místico e o oculto estimula esse descrédito e pode ser decorrente da tradução literal das metáforas utilizadas na China para explicar os seus efeitos. "O significado das metáforas não é facilmente apreendida pelos médicos ocidentais, o que não significa que não exista uma explicação científica para elas", diz Farber.

     

     

    O colega de Farber na USP, o professor Wu Tou Kwang, concorda que a pesquisa científica pode ajudar a desvendar passagens nebulosas dos livros antigos sobre acupuntura, explicando seus fundamentos neurofisiológicos, pois é utilizada pelos chineses há mais de 5000 anos com eficiência. Farber defende o incremento de pesquisas nessa área, inclusive para alertar os profissionais sobre os efeitos colaterais da acupuntura, quando aplicada de forma incorreta.

     

     

    É caso, por exemplo, de um paciente que procura tratar por acupuntura uma dor articular no joelho. "Sabe-se que em muitos pacientes esse tipo de dor pode ser causado pela bactéria Borrelia burgdorferi que causa a doença de Lyme, ou tem a dor causada devido a reação à presença da bactéria Chlamydia trachomatis. A presença desses organismos causa um processo inflamatório na região alterando a circulação local e produzindo substâncias como o tromboxane, que é vasoconstritor. Isso impede a proliferação das bactérias para outras regiões do organismo, mas também impede a concentração de antimicrobianos no local da inflamação. Se você só aplicar a acupuntura, pode provocar a vasodilatação da região do processo inflamatório e uma migração das bactérias para outros locais do corpo. Isso pode causar problemas sérios como alterações no ritmo cardíaco. Mas se você usar antimicrobianos e acupuntura aumenta a concentração de antimicrobianos no local afetado e possibilita um tratamento de melhor qualidade do que com tratamentos isolados" explica Farber.

     

     

    O maior número e melhor qualidade das pesquisas sobre o assunto permitem desenvolver técnicas específicas usadas em estudos experimentais em acupuntura, evitando que o sugestionamento, tanto dos pacientes como dos pesquisadores, interfira nos resultados das pesquisas. A pesquisadora Roxana Knobel concluiu, com sua tese de doutorado na Unicamp, que a acupuntura pode reduzir a dor de gestantes em trabalho de parto. Ela obteve diferença significativa entre gestantes tratadas com acupuntura em relação às que não se submeteram a este tratamento. Para a pesquisa, Roxana formou dois grupos de mulheres: um com gestantes que realmente recebiam acupuntura, e outro em que o tratamento com agulhas era simulado, por meio de técnicas específicas já testadas por outros cientistas. Nenhuma das mulheres do experimento sabia se estava recebendo ou não o tratamento e nem os médicos que realizaram o parto. Roxana observou que as mulheres tratadas com acupuntura sentiram menor intensidade de dor, avaliada através de uma escala de dor, e necessitaram de menores quantidades de remédios analgésicos do que as outras.

    A equipe médica de Farber no Centro de Estudos em Acupuntura Científica (Ceac) na capital paulista tem alcançado resultados eficientes no tratamento integrado (acupuntura juntamente com outros tratamentos como alopatia ou fitoterapia). "Os casos mais impressionantes são aqueles relacionados a patologias neurológicas. Em nosso ambulatório, um paciente portador de esclerose lateral amiotrófica teve a paralisia revertida ao ponto de hoje poder correr. Outro paciente voltou de uma viagem do Nordeste com a doença de Guillan-Barré e ficou paralítico dos membros inferiores. Chegou com prognóstico fechado de neurologistas de um importante hospital de São Paulo e, após pouco mais de um mês de tratamento integrado, pode retornar ao ambulatório andando, sem qualquer ajuda", conta o médico.

    No Brasil, as pesquisas em acupuntura estão começando. O primeiro estudo experimental foi realizado por Marcelo Zugaib e Paulo Farber na Faculdade de Medicina da USP e finalizado em 1997. Esse estudo mostrou que a eletroacupuntura induz o trabalho de parto. A pesquisa de laboratório com ratas mostrou que a energia elétrica nos pontos de acupuntura chegava até o útero, através das veias e artérias, causando contrações. Isso ocorre por que o corpo funciona como um circuito elétrico fechado, onde as veias e artérias são os fios condutores, e o condutor elétrico é o plasma, componente do sangue que, por ser formado por íons, é capaz de gerar eletricidade.

     

    Juliana Schober