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    Ciência e Cultura

    versión impresa ISSN 0009-6725versión On-line ISSN 2317-6660

    Cienc. Cult. v.55 n.3 São Paulo jul./sep. 2003

     

     

     

    ENTREVISTA

    As múltiplas formas da inteligência

     

    Geralmente a fama de inteligente vai para quem domina uma partida de xadrez ou é capaz de resolver intrincados cálculos matemáticos. A área das ciências cognitivas, porém, identifica em simples comportamentos rotineiros e até automáticos, também uma forma de inteligência: "atos banais como um simples bate-papo no bar ou o preparo de um café são difíceis de serem reproduzidos por seres artificiais ou de serem apreendidos por modelagens computacionais". O cientista Pim Haselager, da Universidade de Nijmegen, em Amsterdã, dedica-se a esse assunto desde 1991. Com o apoio de uma bolsa da Fapesp, iniciou uma pesquisa em parceria com a Unesp de Marília (SP), onde ficará, em trimestres alternados, até o final de 2004. O cientista elogia o alto nível dos pesquisadores brasileiros e defende a interdisciplinaridade para a melhor conhecer a cognição humana.

    O que significa, realmente, ser inteligente?

    PIM HASELAGER O conceito da inteligência é muito complicado e tentamos descobrir o que é. Quando os estudos sobre ciências cognitivas começaram, em meados dos anos 60, pensava-se em inteligência como algo complexo, como resolver problemas matemáticos. Claro que é um exemplo de um comportamento inteligente, mas também o são as coisas cotidianas e simples, como fazer café. Hoje, quando se estuda comportamento inteligente das criaturas vivas e artificiais [robôs], parece muito mais complicado simular esses atos normais na vida cotidiana. Assim, para o estudo das ciências cognitivas, o conceito de inteligência se expande um pouco.

    É possível mapear a complexidade das atividades humanas mentais?

    No século XVII, Descartes dizia que a natureza e o corpo podem ser explicados de modo mecânico, mas a mente não. A ciência cognitiva, porém, não aceita essa fronteira. Claro que agora não é possível compreender todos os aspectos da mente, especificamente os emocionais. A mente tem aspectos diversos e integrá-los é muito difícil. Nossa abordagem interdisciplinar é impulsionada pelas perguntas filosóficas sobre a natureza da inteligência. Mas precisamos, também, de pesquisas científicas, experimentos psicológicos, neurociência etc.

    Quantos anos tem esse campo de estudo?

    A partir de 1956, começaram a ocorrer conferências importantes sobre o tema. Nos anos 60, houve um grande debate em torno do behaviorismo e, na década seguinte, as ciências cognitivas tornaram-se uma força dominante na área da psicologia e inteligência artificial incluindo mais fortemente a neurociência, mais ou menos nos anos 80. É difícil dizer quando a disciplina começa, mas os primeiros passos foram dados nessa cronologia. As ciências cognitivas têm tido grandes sucessos que, em contrapartida, geram novas perguntas.

    O estudo da cognição humana auxilia o entendimento da inteligência artificial?

    A história da inteligência artificial é muito interessante porque, como eu disse, começamos a procurar entender mais como resolver problemas: a higher cognition, ou cognição mais avançada, como jogar xadrez e a matemática. É possível criar modelagens que sejam muito boas nessas áreas isoladas. Isolada porque um computador que joga xadrez não precisa saber nada sobre outras coisas e pode ser igual ou melhor ao campeão do mundo; mas ele não precisa saber o sentimento do que é ganhar ou perder. Entender inteligência normal é falar com pessoas em um botequim, tomar café, falar sobre a vida e não jogar xadrez. Estes são aspectos muito mais complicados para produzir modelagens em inteligência artificial.

     

     

    O quão distante está vermos robôs agindo de acordo com suas próprias vontades?

    A questão é sempre difícil, porque cada palavra que você usa é uma pergunta. O que é vontade? É um problema como a inteligência. Mas acho que é possível falar de vontade como autonomia. Quando um sistema tem vontades próprias, ele tem um grau de autonomia.

    Neste sentido, até agora pelo menos, fornecemos as metas para os robôs, mas tentamos criar sistemas que sejam mais autônomos. Isso porque queremos compreender mais sobre a nossa autonomia, a nossa vontade.

    Mas essa é uma meta a ser atingida?

    Não é uma meta criarmos criaturas artificiais que façam o que elas querem, porque é perigoso na área social. Mas queremos saber mais sobre as nossas vontades e nossas capacidades de ser livre, de criar coisas, de viver e, por isso, criar sistemas com um certo grau de autonomia, poderá ajudar.

     

    Germana Barata