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    Ciência e Cultura

    Print version ISSN 0009-6725On-line version ISSN 2317-6660

    Cienc. Cult. vol.55 no.3 São Paulo July/Sept. 2003

     

     

    RICARDO LÍSIAS

     

     

    MARIA – É só pra me ajudar a limpar o jardim aqui de casa.

    MENINO – Limpar o que que tem pra limpar aqui?

    MARIA – É que eu não consigo sozinha. Desde que comprei essa casa, ainda não pude limpar o jardim.

    MENINO – Tem que tirar tudo esses papel aqui?

    MARIA – Você me ajuda e depois a gente pode comer alguma coisa lá na cozinha, eu acho que ainda tem um pedaço de bolo.

    MENINO – Eu limpo tudo aqui e aí a gente come bolo lá na cozinha?

    MARIA– Mas você não precisa ficar preocupado: vou te pagar direitinho.

    MENINO – Eu vou tirar tudo essas coisa daqui aí a senhora vai me pagar?

    MARIA – Você me ajuda a limpar o jardim e eu te pago e se você tiver com fome a gente pode comer alguma coisa na cozinha, depois do serviço.

    MENINO – Aí depois que eu limpar tudo eu vou entrar aí na sua casa?

    MARIA– Mas você não precisa se preocupar porque eu vou te pagar pelo serviço.

    MENINO – E eu tenho que recolher tudo essas coisa tudo?

    MARIA – Você não precisa se preocupar porque eu vou te pagar direito. E se você ficar com fome, talvez você fique com fome porque o trabalho é um pouco cansativo, a gente pode comer um pedaço de bolo lá na cozinha.

    MENINO – E eu vou limpar tudo a grama tudo?

    MARIA – É só para tirar a sujeira, recolher esse lixo, depois eu mesma cuido das plantas.

    MENINO– Aí depois a senhora vai cuidar das planta do jardim?

    MARIA – Eu quero só que você tire esse lixo que jogam aqui. Eu vou fechar a janela para não entrar inseto dentro de casa.

    MENINO – Ali é que tá a janela bem ali?

    MARIA – Pois é, ficou em cima do jardim. Eu não queria desse jeito, mas como o preço estava bom, acabei comprando.

    MENINO – Deixa eu ver o dinheiro do pagamento aí.

    MARIA – Você não precisa se preocupar, eu vou te pagar direitinho. E se você ficar com fome, a gente pode comer um pedaço de bolo lá na cozinha.

    MENINO – Mostra aí o dinheiro aí.

    MARIA – Este é suficiente para você?

    MENINO – Cadê o dinheiro, mostra aí o dinheiro.

    MARIA – Olha aqui, e se depois você ficar com fome, a gente pode comer um pedaço de bolo na cozinha.

    MENINO – Não tem dinheiro aí não sua louca.

    MARIA – Eu vou te pagar tudo isso aqui.

    MENINO – Cala a boca aí velha louca não tem dinheiro aí não.

    MARIA – Eu vou te pagar tudo isso aqui, seu malcriado.

    MENINO – Velha louca não tem casa aí nada sua velha louca.

    MARIA – Deixa de ser malcriado, menino, a sua mãe não te ensinou a respeitar os mais velhos não, seu malcriado?

    MENINO – Não tem casa aí nada sua velha louca.

    MARIA– Vai embora, malcriado, vai embora por que eu vou telefonar para a polícia.

    MENINO – Não tem telefone aí nada sua velha louca.

    MARIA – Seus pais não te deram educação não, seu moleque?

    MENINO – Nem tem casa aí nada velha gagá.

    MARIA – Você não tem família não, seu malcriado?

    MENINO – Tem casa aí não velha.

    MARIA – Você não tem família?

    MENINO – Tem casa nada aí.

    MARIA – Você é que não tem família.

    MENINO – Tem nada aí não velha louca.

    MARIA – Você não tem mãe, não, seu moleque?

    MENINO – Tem casa nada velha.

    MARIA – Você não tem mãe!

    MENINO – E você não tem casa!

     

    Ricardo Lísias é autor do romance Cobertor de estrelas (Editora Rocco, 1999) e da novela Capuz (Editora Hedra, 2001). O trecho apresentado é parte de seu novo romance, a ser lançado pela Editora Rocco.