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    Ciência e Cultura

    versión impresa ISSN 0009-6725versión On-line ISSN 2317-6660

    Cienc. Cult. v.57 n.3 São Paulo jul./sep. 2005

     

    CENTENÁRIO

    SARTRE: O EXERCÍCIO DA LIBERDADE

     

    Esse ano comemora-se o centenário de nascimento do filósofo e escritor Jean-Paul Sartre, considerado um dos principais intelectuais franceses, com uma trajetória singular que une filosofia, literatura, teatro e compromisso com as principais questões políticas de seu tempo. A imagem pública de intelectual engajado e freqüentador assíduo dos cafés parisienses mescla-se com o reconhecimento de sua filosofia existencialista e de sua obra literária.

    A obra literária de Sartre constitui-se na representação dos seus principais conceitos filosóficos. Nesse sentido, são inseparáveis. Com o intuito de popularizar a sua filosofia através da literatura, as obras literárias de Sartre são relevantes porque conseguem abranger um público maior. Para Sartre, a linguagem deve ser um instrumento que revele possibilidades de transformação da realidade, afirma Luís Antônio Contatori Romano, em sua tese de doutorado sobre a passagem de Sartre pelo Brasil em 1960, defendida na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), em 2000.

    BIOGRAFIA Sartre nasceu em Paris, no dia 21 de junho de 1905. Em 1924, ingressou no curso de filosofia da Escola Normal Superior onde conheceu a fundadora do feminismo moderno, Simone de Beauvoir. Desde então, nunca mais se separaram. Em 1933, Sartre passou um ano estudando em Berlim, período em que teve contato com as obras de filósofos como Kierkegaard, Husserl, Karl Jaspers e Heidegger, referências importantes para a sua filosofia. De volta à França, Sartre publicou os seus primeiros romances, dentre eles A náusea (1938).

    EXISTÊNCIA E ENGAJAMENTO Durante a Segunda Guerra Mundial, o filósofo foi convocado a prestar serviços militares, sendo preso pelos alemães em 1940. Permaneceu cerca de um ano num campo de concentração e, conseguindo escapar, retornou a Paris. Em 1943 iniciou a sua colaboração com o movimento de resistência francesa contra a ocupação alemã. Nesse mesmo ano, a primeira peça teatral de Sartre – As moscas – é encenada, e o seu primeiro e principal tratado filosófico – O ser e o nada – publicado.

    A existência precede a essência. Esse é o mais popular e emblemático princípio da filosofia existencialista de Sartre. O homem não possui uma essência dada a priori: ele é aquilo que faz no decorrer de sua vida. Nesse sentido, nenhuma determinação, seja da ordem da natureza – como a hereditariedade – seja de ordem metafísica – como Deus – explica o que seja o homem: ele é fruto de um processo marcado pela liberdade de escolha num contexto de possibilidades. O homem constrói a si mesmo por meio do exercício da liberdade.

    É preciso lembrar que, para Sartre, a liberdade não é uma faculdade humana abstrata ou puramente espontânea. A liberdade é uma atitude concreta e sempre situada. Cada indivíduo está inserido no mundo no qual pesam sobre ele desde fatores pessoais, como a família e a condição social, até a própria configuração histórica de sua época. A existência depende da conduta que cada um assume em relação a essas contingências. O homem é inteiramente responsável por aquilo que ele é. E a responsabilidade, pensada como o engajamento no mundo, é um valor inerente à liberdade.

    A VISITA AO BRASIL No período pós-guerra, a solidariedade com a luta pela independência da Argélia contra o colonialismo francês e a visão otimista da revolução cubana revelam o interesse de Sartre pelos problemas dos chamados países do Terceiro Mundo. Em agosto de 1960, Sartre e Simone de Beauvoir desembarcam no Brasil, permanecendo no país durante dois meses. A reconstituição do significado dessa visita foi o objetivo da tese de doutorado de Contatori Romano, publicada pela editora Mercado das Letras em parceria com a Fapesp, em 2002. O autor avalia a recepção da obra de Sartre e sua influência na filosofia, na literatura e no teatro brasileiros, assim como a repercussão das posições políticas do filósofo francês no país.

    Além de percorrer o itinerário do casal – ciceroneado pelo escritor Jorge Amado – que incluiu palestras em universidades, entrevistas e visitas a uma favela carioca, e a um terreiro de candomblé em Salvador, Romano pesquisa as críticas de intelectuais católicos brasileiros ao ateísmo presente na filosofia sartriana; as implicações de uma literatura popular, proposta por Sartre para o Brasil; e a montagem de suas peças teatrais por grupos como o Teatro Brasileiro de Comédia (TBC) e o Oficina.

     

    Carolina Cantarino