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    Ciência e Cultura

    versão impressa ISSN 0009-6725versão On-line ISSN 2317-6660

    Cienc. Cult. v.58 n.2 São Paulo abr./jun. 2006

     

     

    DO CONCEITO À PALAVRA: OS DICIONÁRIOS ONOMASIOLÓGICOS

    Maurizio Babini

     

    O desenvolvimento técnico e científico da sociedade globalizada conduz a uma intensa criação lexical. Essa situação gera a necessidade de tornar os conhecimentos acessíveis a um número de usuários cada vez maior. Nesse sentido, é importante sistematizar as informações em repertórios lexicográficos, terminográficos e em bases de dados eletrônicas.

    Mas que tipo de dicionário ou de base de dados seria mais eficaz? Todos os repertórios lexicográficos e terminográficos podem fornecer a definição e o significado de uma palavra ou de um termo mas, como encontrar essa palavra ou esse termo, se não os conhecemos? Como chegar à expressão, se temos somente seu conceito ou parte deste? Os dicionários onomasiológicos são instrumentos importantes para o atendimento dessa necessidade.

    O objetivo principal deste trabalho é analisar diferentes tipos de repertórios onomasiológicos com o intuito de auxiliar na compreensão dos mecanismos que permitem passar do conceito à palavra e vice-versa.

    O ponto de partida de nossa análise será a origem e o emprego do termo onomasiologia. Esses aspectos serão tratados no primeiro item deste artigo. Nele apresentaremos também uma definição de dicionário onomasiológico ou dicionário com caráter onomasiológico.

    Em seguida, exporemos o modelo semântico de Bernard Pottier. Esse modelo permite, a nosso ver, compreender melhor o percurso semasiológico (do interpretante) e o percurso onomasiológico (do enunciador), que subjazem ao funcionamento dos dicionários onomasiológicos.

    No terceiro item serão analisados os principais tipos de dicionários onomasiológicos, isto é, os dicionários denomindados ideológicos, analógicos, terminológicos e onomasiológicos.

    Devido aos limites deste artigo, não nos ateremos aos dicionários eletrônicos, ontologias ou outros modelos de obras lexicográficas e terminográficas elaboradas em suporte informático. Nosso objetivo principal é abordar aspectos gerais das tipologias dos repertórios onomasiológicos.

     

     

    ONOMASIOLOGIA: ORIGEM E EMPREGO DO TERMO O termo onomasiologia foi utilizado pela primeira vez em 1903 por A. Zauner, em um estudo sobre os nomes das partes do corpo humano nas línguas românicas – Die romanischen Namen de Körperteile. Eine onomasiologische studie (1).

    A definição de onomasiologia proposta por Vittorio Bertoldi na Enciclopedia Italiana di Scienze, Lettere ed Arti, de 1935 (2) é considerada como uma referência na matéria:

    Por onomasiologia entende-se um aspecto particular da pesquisa lingüística que, partindo de uma determinada idéia, examina as várias maneiras com as quais essa idéia encontrou expressão na palavra.

    Assim, segundo Bertoldi, a onomasiologia (em lingüística) trata dos aspectos ligados ao processo da denominação (que vai da idéia ao signo).

    Quando esses aspectos são estudados comparando-se, do ponto de vista cronológico e geográfico, as diversas expressões que uma idéia assume em diferentes línguas, a onomasiologia é também chamada de lexicologia comparada. Este termo foi empregado pela primeira vez pelo suíço E. Tappolet em 1895, em um trabalho sobre os nomes de família – Die romanischen Verwandtschaftsnamen mit besonderer berücksichtigung der französischen und italienischen Mundarten. Ein Beitrag zur vergleichenden lexikologie (3).

    As investigações científicas sobre onomasiologia enquanto lexicologia comparada tiveram grande desenvolvimento sobretudo no domínio das línguas românicas, uma vez que o latim permitia, para alguns grupos de idéias, resgatar mais de dois mil anos de história lexical. Nesses trabalhos, o ponto de partida é o latim, língua na qual são descritos os conceitos, permitindo a comparação dos mesmos nas diferentes línguas românicas. Dessa maneira, foram analisadas dezenas de grupos de idéias, tais como as estações e os meses do ano, a flora, a fauna, os aspectos da vida humana etc.

    Dentre os trabalhos que tiveram como ponto de partida a língua latina destaca-se a obra monumental de Wartburg, Französisches Etymologisches Wörterbuch - FEW, de 1928 (4), que apresenta uma minuciosa descrição histórica do vocabulário galo-românico. Mas é em 1952 que Wartburg, juntamente com Hallig, redige a obra que é considerada um marco nos estudos sobre onomasiologia: o Begriffssystem als grundlage für die lexikographie (Système raisonné des concepts) (5).

    No âmbito das obras lexicográficas, o adjetivo ideológico é freqüentemente empregado como sinônimo de onomasiológico. É importante ressaltar que sua origem está ligada a "conjunto de idéias" e os dicionários ideológicos seriam, de acordo com a intenção original, dicionários organizado em função das idéias, e não dicionários com cunho ideológico (no sentido de valores morais ou sociais), como o termo poderia sugerir.

    Os dicionários ideológicos nasceram na segunda metade do século XIX e o médico inglês Peter Mark Roget é considerado o iniciador desse tipo de repertório. Publicou, em 1852, o Thesaurus of english words and phrases, classified and arranged so as to facilitate the expression of ideas and assist in literary composition (6). Na edição em francês desse livro (1859), o tradutor, T. Robertson, adotou como título Dictionnaire ideologique : recueil des mots, des phrases, des idiotismes et des proverbes de la langue française classés selon l’ordre des idées (7).

    Esse trabalho foi traduzido para diversas línguas e utilizado como modelo para várias obras lexicográficas. A denominação dicionário ideológico ganhou a preferência dos países de língua latina, enquanto que, nos países de língua inglesa, a tendência foi a de chamar de thesaurus.

    O adjetivo ideológico, associado ao termo lexicografia, foi utilizado pela primeira vez por F. de Tollenaere quando, logo após a publicação do Système raisonné des concepts de Hallig e Wartburg, escreveu um artigo intitulado Lexicografia alfabética ou ideológica (8), no qual criticou severamente o trabalho desses dois autores.

    Segundo Baldinger (9) são onomasiológicos os repertórios cujas unidades lexicais são classificadas em função dos conceitos que representam; por outro lado, são considerados como semasiológicos os repertórios cujas unidades lexicais são classificadas em função da forma, em ordem alfabética. Nesse sentido, os dicionários terminológicos cujas unidades lexicais são classificadas em ordem sistemática são repertórios onomasiológicos.

    O problema que um dicionário onomasiológico deve resolver é exatamente o inverso daquele de um dicionário semasiológico: dada uma idéia (noção ou conceito), deve-se encontrar a unidade lexical ou o termo que a exprima. Em um dicionário semasiológico, o ponto de partida é o significante de um termo ou palavra; em um dicionário onomasiológico o ponto de partida é o significado. Assim, neste último tipo de obra lexicográfica deve-se encontrar um termo ou palavra desconhecida partindo do significado. Um dicionário onomasiológico ou de caráter onomasiológico é, portanto, um repertório em que é possível se passar da idéia (noção ou conceito) à unidade lexical.

    OS PERCURSOS ONOMASIOLÓGICO E SEMASIOLÓGICO Em Semântica geral (10), Bernard Pottier propõe um interessante modelo de descrição do percurso gerativo da enunciação, modelo que nos permite melhor entender os conceitos de onomasiologia e de semasiologia.

    Conforme nos posicionamos do ponto de vista do enunciador (emissor) ou do interpretante (receptor), temos, respectivamente, o percurso onomasiológico, que vai da intenção de dizer ao enunciado, e o percurso semasiológico, que vai do enunciado à sua interpretação. Pottier (p.16) apresenta esquematicamente o percurso onomasiológico como segue:

     

     

    O enunciador tem como ponto de partida o mundo referencial (R). Quando tem a intenção de dizer (querer dizer), começa a conceptualizar sua intenção (Co). Essa conceptualização deve, então, ser expressa em signos, em um processo de semiotização, que se realiza pelos meios fornecidos por um sistema semiótico. Em nosso caso, o sistema semiótico utilizado pelo enunciador é uma língua natural (LN).

    Para Pottier, as virtualidades da língua correspondem ao sistema semiótico da língua e aos "mecanismos de enunciação que permitem as realizações discursivas". A passagem da conceptualização à semiotização se faz através do que Pottier chama de fenômenos de designação, isto é, fenômenos pelos quais se estabelecem as relações entre o mundo referencial e os sistemas das línguas naturais.

    A enunciação é, portanto, a passagem das virtualidades da língua aos discursos realizados portadores de significação e se dá por meio do que o autor chama de fenômenos de significação, ou melhor, os fenômenos pelos quais "os significados da língua se tornam significações em discurso" (p.20).

    Conseqüentemente, é muito importante, segundo Pottier, fazer também uma distinção entre os modelos frásticos em língua, que contêm significados em potencial, e os discursos realizados, que, ao contrário, são portadores de significação.

    O percurso semasiológico é o do interpretante e acontece no sentido contrário ao do enunciador. Parte do discurso realizado (texto oral ou escrito) para chegar à compreensão. Vejamos o esquema correspondente ao percurso semasiológico ( p.17):

     

     

    O interpretante consegue compreender um discurso pela identificação e interpretação dos diferentes elementos discursivos que o compõem. Compreender um discurso significa, para o interpretante, poder representá-lo mentalmente, "conceitualizá-lo desprendendo-se rapidamente dos signos da língua natural que ele identificou e que lhe serviram de trampolim para a compreensão" .

    Segundo Pottier, o mundo referencial (R), mesmo sendo o verdadeiro ponto de partida e de chegada dos dois percursos, não deve obrigatoriamente ser objeto de estudo do lingüista, "já que o conceitual (Co) pode, por si só, ser o ponto de partida para o enunciador e o ponto de chegada para o interpretante". O conceitual é, para esse autor, o "lugar da representação mental que se tornou independente das línguas naturais e dos outros sistemas semiológicos, e sede da encenação" (p.18).

    Pottier considera a língua como um saber por meio do qual se realizam: 1) a transformação das representações mentais em signos e em esquemas (no caso do percurso do enunciador – onomasiológico); 2) a interpretação (no caso do percurso do interpretante – semasiológico).

     

     

    Nesse esquema vemos a passagem da conceptualização ao discurso. As fases que nos interessam no âmbito deste trabalho são a encenação, no nível conceitual, e a transformação em signos e em esquemas (processo de lexemização), no nível da língua.

    No nível do conceitual, Pottier concebe dois tipos de conceitos que permitem realizar a encenação: os conceitos gerais (ou conceitos) e os conceitos universais (noemas) (p.71). Os conceitos gerais poderiam ser agrupados, segundo o autor, em quatro grandes categorias (p.72), a saber:

     

     

    Em todos esses conceitos haveria, segundo o autor, "um componente natural (experiência comum) e um componente cultural (elementos específicos de acordo com o lugar e o tempo)" .

    Os conceitos universais ou noemas são, para Pottier, "representações relacionais, abstraídas da experiência, mas cujos traços lingüísticos assumem formas muito variadas nas LN" e "um noema aparece, portanto, como uma relação abstrata universal que subjaz às operações semânticas gerais das línguas e é visualizável a fim de se aproximar, o máximo possível, da intuição de uma representação mental compartilhada" (p.78).

    Após a transformação dos conceitos em esquemas, operação que se realiza através de conceitos gerais e de noemas, ocorre a lexemização, que se realiza no nível da língua, por meio da escolha dos signos lingüísticos.

    Os elementos do modelo de Pottier aqui expostos são, a nosso ver, de grande importância para se compreenderem os dois percursos que subjazem ao processo gerativo da enunciação e o funcionamento dos dicionários semasiológicos e onomasiológicos.

    DICIONÁRIOS ONOMASIOLÓGICOS: TIPOLOGIA Há muitos tipos de repertórios que podem ser considerados como onomasiológicos. Em nosso trabalho trataremos essencialmente dos seguintes:

    • dicionários ideológicos;
    • dicionários analógicos;
    • dicionários terminológicos;
    • dicionários onomasiológicos.

    É importante ressaltar que, às vezes, os termos thesaurus, dicionário ideológico e dicionário analógico são utilizados para denominar um mesmo tipo de repertório. Há, portanto, uma diferença entre o objeto denominado e objeto definido. Segundo Rey-Debove (11), alguns repertórios lexicográficos e terminológicos, embora recebam denominações diferentes, representam, na verdade, um mesmo tipo de obra.

    Assim, sob a denominação de dicionário ideológico encontramos, geralmente, repertórios que têm uma macroestrutura semelhante à do Thesaurus de Roget. Do mesmo modo, o Dicionário analógico da língua portuguesa, de Carlos Spitzer (12), possui características muito semelhantes a esse Thesaurus.

    No âmbito deste trabalho, quando nos referimos aos dicionários ideológicos temos em mente obras que se assemelham, do ponto de vista da estrutura e do funcionamento, ao Thesaurus de Roget; e quando nos referimos aos dicionários analógicos, temos como referência o Dicionário analógico da língua francesa, de P. Boissière (13).

    Os dicionários ideológicos e os analógicos foram concebidos para resolverem as dificuldades que o usuário enfrenta ao consultar um dicionário tradicional. De fato, neste as entradas são classificadas em ordem alfabética e é possível encontrar os "significados" das palavras (as "idéias" que elas representam) partindo de sua forma. Mas apresentam um problema: como encontrar uma palavra quando se conhece apenas sua "idéia", seu conceito?

    A macroestrutura dos dicionários ideológicos se compõe de partes características. A primeira é, geralmente, o plano de classificação das idéias, que é o esqueleto do dicionário, e contém as idéias (tópicos) principais da obra. O plano de classificação das idéias corresponde ao sistema conceitual dos dicionários terminológicos e tem suas raízes nos primeiros dicionários (glossários) da humanidade.

    Em seguida, os tópicos contidos no plano de classificação são desenvolvidos em quadros sinópticos que contêm subconjuntos ou classes de idéias (subtópicos).

    A terceira parte dos dicionários ideológicos (parte analógica) é formada por grupos de palavras ligadas, com base em diferentes critérios, a cada uma das idéias contidas nos quadros sinópticos. Em cada grupo de palavras são indicados sinônimos da palavra-entrada e seus contrários (antônimos), permitindo, assim, buscas por meio desses elementos. O principal critério adotado para a reunião das palavras em grupos é a analogia.

    Por analogia os autores dos dicionários ideológicos e analógicos entendem as palavras da língua ligadas um à outra "seja por uma comunidade de idéias, seja por relações de emprego freqüentes de causa, de meio, de efeito, etc., em uma palavra, por uma analogia qualquer" (13). A analogia é, portanto, uma relação entre "palavras que são coligadas pelo sentido" (14).

    A última parte dos dicionários ideológicos contém, listadas, em ordem alfabética, todas as palavras (idéias) contidas no dicionário. Esse componente estrutural do dicionário varia de uma obra para outra e pode conter, ou não, definições. De fato, em alguns dicionários ideológicos essa parte se caracteriza como um índice alfabético remissivo que orienta o leitor sobre onde encontrar a palavra que deseja; em outros, além dessas informações, são apresentadas definições das diferentes acepções que a unidade lexical em questão possui na língua.

    Nesses repertórios, os principais pontos de partida das buscas de tipo onomasiológico são o plano de classificação das idéias e os quadros sinópticos. O princípio do funcionamento do dicionário ideológico é o de encontrar palavras, isto é, significantes, partindo das idéias ou conceitos que eles designam, seguindo, normalmente, uma organização de sentido que vai do mais genérico ao mais específico: das idéias contidas no plano de classificação aos quadros sinópticos e aos grupos de palavras. Em seguida, com base na analogia, o percurso pode assumir características bem diferentes, permitindo a passagem de um grupo de palavras a outro. Essa passagem é indicada ao leitor por remissivas.

    Os dicionários analógicos surgiram quase no mesmo período que os dicionários ideológicos. Na França, em 1862, Prudence Boissière publicou o Dictionnaire analogique de la langue française (15). Segundo esse autor, os dicionários analógicos devem atender às mesmas necessidades que os dicionários ideológicos, ou seja, permitir encontrar as palavras quando se conhece somente a idéia ou o conceito que elas representam.

    Por essa razão, as diferenças entre dicionários analógicos e ideológicos não são muito grandes: os analógicos não contêm, em geral, nem um plano de classificação das idéias, nem os quadros sinópticos. Segundo Boissière, esses não servem ao usuário, devido ao fato de que são sistemas muito complexos.

    O dicionário de Boissière divide-se em duas partes: a alfabética e a sintética. Diferentemente das demais obras lexicográficas e terminográficas onomasiológicas, essas partes não se sucedem, ou seja, não se apresentam uma após a outra. De fato, ambas coexistem nas mesmas páginas, que são divididas horizontalmente: na superior, encontra-se disposta a parte alfabética, e na inferior, a parte sintética. Na alfabética são listadas todas as palavras (idéias) contidas no dicionário, enquanto que, na sintética, as palavras são agrupadas, por analogia, em torno de uma palavra-chave ou idéia principal. As definições das palavras são apresentadas na parte sintética.

    As buscas de tipo onomasiológico se dão, nessa obra, por meio de ambas as partes e seguem, como princípios, os mesmos que regem o funcionamento dos dicionários ideológicos. Os dicionários analógicos possuem diferentes macroestruturas e o modelo proposto por Boissière tornou-se apenas uma referência para seus sucessores, que nem sempre o seguem na íntegra.

    O Dictionnaire de la machine-outil de Wüster (1935) é, sem dúvida, um marco na história das obras terminográficas e da própria onomasiologia (16). Para a Teoria Geral da Terminologia (TGT), a terminologia procede de modo onomasiológico, partindo dos conceitos. Antes de realizar uma obra terminográfica, o terminológo organiza os conceitos em ordem sistemática (no sistema conceitual) e, em seguida, busca os significantes que os designam.

    Do mesmo modo que os dicionários ideológicos, muitos dicionários terminológicos contam, em sua parte inicial, com o sistema conceitual da obra, que contém todos os termos definidos na mesma. Do ponto de vista prático, o sistema conceitual é o principal ponto de partida das buscas de tipo onomasiológico, como ocorre nos dicionários ideológicos. Um significante desconhecido pode ser localizado percorrendo-se o sistema conceitual que se organiza, geralmente, de modo hierárquico (de sentido): dos termos mais genéricos aos mais específicos. Os termos correlatos (related terms) também auxiliam nas buscas de tipo onomasiológico nos dicionários terminológicos, permitindo a identificação, por analogia, de um termo desconhecido.

    Os dicionários onomasiológicos, enquanto objetos denominados, são os mais recentes de todos os analisados anteriormente neste artigo. Segundo nossos estudos, o primeiro repertório assim intitulado foi o Dictionnaire onomasiologique de l’ancien occitan, de Kurt Baldinger, cujo primeiro fascículo foi publicado em 1971. Baldinger pertence à escola que poderíamos chamar de "Heidelberg", que muito contribuiu para a produção desse tipo de obra. Entre os alunos de Baldinger estava Henri Vernay, autor do Dictionnaire onomasiologique des langues romanes (17), cujo primeiro volume surgiu em 1991. Outros volumes foram publicados anualmente entre 1992 e 1996 (18).

    Esse tipo de dicionário continua a tradição dos estudos de onomasiologia nas línguas românicas (cf. Supra Item 1). Na obra de Vernay em particular, cada volume apresenta, logo no início, algo parecido com o plano de classificação das idéias, que caracterizam os dicionários ideológicos. O latim, utilizado para descrever os conceitos, é o ponto de partida para a busca dos equivalentes nas diferentes línguas neolatinas da obra.

    CONCLUSÕES A análise a que procedemos dos vários tipos de repertórios com caráter onomasiológico permite-nos chegar à conclusão de que não existe um único mecanismo de expressão da onomasiologia e que essa pode assumir formas diferentes em cada obra lexicográfica ou terminográfica. O percurso que permite encontrar uma unidade lexical ou terminológica tendo como ponto de partida seu conteúdo semântico (idéia ou conceito) faz-se, geralmente:

    • pelo sistema conceitual ou pelo plano de classificação das idéias (conceitos), normalmente apresentados no início das obras;
    • pela classificação sistemática das entradas;
    • pela sinonímia;
    • pela antonímia;
    • por analogia.

    Um dicionário de tipo onomasiológico deve contar com modelos de macroestrutura e de microestrutura capazes de permitir a busca de uma palavra tendo como ponto de partida seu conteúdo.

    Nesse sentido, um dicionário terminológico, nos moldes propostos por Wüster, é uma obra com caráter onomasiológico elaborada com base nas principais relações de significação mantidas entre os termos de um domínio especializado.

    Os diferentes repertórios que analisamos neste trabalho exploram, de um modo ou de outro, os principais mecanismos que permitem a realização do percurso onomasiológico. Opõem-se, por natureza, aos dicionários tradicionais, nos quais se parte do significante para se chegar ao significado (seguindo, portanto, o percurso semasiológico). Acreditamos, porém, que os dicionários devessem, de modo geral, permitir encontrar tanto "as palavras pelas idéias" quanto "as idéias pelas palavras". Nesse sentido, consideramos que os lexicógrafos e os terminólogos tenham ainda longo trabalho pela frente.

     

    Maurizio Babini é professor da Universidade Estadual Paulista (Unesp), campus de São José do Rio Preto. Graduou-se em letras pela Universidade de Bolonha (Itália), obteve os títulos de mestre e doutor na Universidade Lumière Lyon2, na França, onde lecionou por sete anos. Desenvolve pesquisas sobre diferentes aspectos da língua italiana, notadamente na interface com a terminologia e a lingüística computacional. É autor de livros publicados no Brasil e na França.

     

     

    NOTAS E REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

    1. Zauner, A. Die romanischen Namen de Körperteile. Eine onomasiologische studie. Romanische Forschungen. nº 15, p. 339-530. 1903.

    2. Bertoldi, V. Enciclopedia Italiana di Scienze, Lettere ed Arti. Roma: Treccani, 1935.

    3. Tappolet, E. Die romanischen Verwandtschaftsnamen mit besonderer Berücksichtigung der französischen und italienischen Mundarten. Ein Beitrag zur vergleichenden lexikologie. Estrasburgo: sem ed., 1895.

    4. Wartburg, W. (von). Französisches etymologisches wörterbuch (FEW). 22 vol. Bonn; Klop; puis Leipzig et Berlin: Teubner; Bâle: Lichtenhahn. Desde 1928.

    5. Hallig, R., Wartburg (von) W. Begriffssystem als Grundlage für die lexikographie : Versuch eines Ordnungsschemas. Berlin: Akademie-Verlag, 1963. A primeira edição é de 1952, mas utilizamos a de 1963 para fins deste artigo.

    6. Roget, P.M. Thesaurus of english words and phrases: classified and arranged so as to facilitate the expression of ideas and assist in literary composition. 1852. Não tivemos acesso à edição de 1852 e utilizamos para este trabalho a edição de 1956 da Longmans and Green. Essa é uma reimpressão do Thesaurus de 1936, que foi revista por Samuel Romilly Roget. Contém o prefácio e a introdução da primeira edição (1852), o prefácio à edição de 1879, escrita por John L. Roget, e o prefácio à edição de 1936, escrita por Samuel Romilly Roget.

    7. Robertson, T. Dictionnaire idéologique : recueil des mots, des phrases, des idiotismes et des proverbes de la langue française classés selon l’ordre idées. Paris : A. Derache. 1859.

    8. Tollenaere, F. de. Lexicographie alphabétique ou idéologique. Cahiers de lexicologie. Nº2, p. 19-29. 1960.

    9. Baldinger, K. Teoría semántica : hacia una semántica moderna. Madrid : Alcalá, 1970.

    10. Pottier, B. Sémantique générale. Paris : PUF, 1992.

    11. Rey-Debove, J. Étude linguistique et sémiotique des dictionnaires français contemporains. La Haye/Paris : Mouton. 1971.

    12. Spitzer, C. S. J. Dicionário analógico da língua portuguesa. 2e edição Porto Alegre (BR) : Livraria do Globo. 1952.

    13. Boissiere, P. Dictionnaire analogique de la langue française : répertoire complet des mots par les idées, des idées par les mots. 3e éd. Paris : Aug. BoyerM (s.d.)

    14. Le petit Robert : dictionnaire de la langue française. Paris : Dictionnaires Le Robert, 1996. (CD-Rom)

    15. Vide nota 13.

    16. Embora o Dictionnaire de la machine-outil, de Eugen Wüster, tenha sido publicado em 1935, a edição de maior referência é a que segue: Wuster, E. Dictionnaire multilingue de la machine-outil. Notions fondamentales, définies et illustrées, présentées dans l’ordre systématique et l’ordre alphabétique. Volume de base anglais-français = The machine tool. An interlingual dictionary of basic concepts comprising an alphabetical dictionary and a classified vocabulary with definitions and illustrations. English-French Master Volume, London : Technical Press. 1968.

    17. Vernay, H. Dictionnaire onomasiologique des langues romanes - DOLR. Vol. 1 (Monde abstrait – monde concret; Le monde humain; La vie humaine ; L’anatomie humaine). Tübingen: Niemeyer. 1991.

    18. Vernay, H. Dictionnaire onomasiologique des langues romanes : DOLR.Tübingen: Niemeyer. Volumes : 2 Domaine psycho-physique; Domaine moral et intellectuel. 1992; 3 Adhésion / refus ; Vérité – contre-vérité ; Le domaine cusal ; États et changements d’états ; Organisaiton de l’espace. 1993; 4 Relations interhumaines ; Activité-travail. 1994; 5 Monde professionel; Monde agricole ; Eaux et forets ; Viticulture. 1995; 6 Subsistance ; cuisine et repas ; Domaine vestimentaire ; Ameublement. 1996.