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    Ciência e Cultura

    versão impressa ISSN 0009-6725versão On-line ISSN 2317-6660

    Cienc. Cult. v.58 n.3 São Paulo jul./set. 2006

     

     

     

    SAÚDE

    Cresce o número de denúncias contra conduta médica em São Paulo

     

    O número de denúncias contra médicos no estado de São Paulo cresceu 130% em dez anos e a média diária de queixas só fez aumentar no ano passado. Segundo pesquisa realizada por Krikor Boyaciyan, diretor do Conselho Regional de Medicina do Estado (Cremesp), em sua tese de doutorado defendida na Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), o aumento ocorreu entre 1994 e 2004, passando de 4 para mais de 9 denúncias diárias; em 2005, a média de queixas cresceu ainda mais: 12 por dia.

    Com base em tais dados, em seu trabalho Boyaciyan mostra que pouco mais de 16% das quase 24 mil denúncias registradas culminou em processo legal e, dessas, 12% eram ligadas às áreas de ginecologia e obstetrícia. Entre as causas para esse crescimento, o pesquisador enumera algumas questões conjunturais da prática e da formação médica, assim como um maior acesso à informação por parte dos pacientes, o que os têm tornados mais questionadores e conscientes de seus direitos.

     

     

    GINECOLOGIA E OBSTETRÍCIA A pesquisa de Boyaciyan centrou-se nas denúncias contra 781 profissionais, em sua maioria homens de 31 a 45 anos, com até 20 anos de carreira, formados em escolas privadas e que não passaram por residência médica nem obtiveram título de especialista. Um dos fatores atribuídos à conduta questionada pelos pacientes é a quantidade elevada de horas trabalhadas por médicos em início de carreira, aliada às condições hospitalares nem sempre adequadas. "O médico jovem se sujeita a muitas horas de plantão, em diferentes lugares, o que leva a um estresse contínuo e maior chance de negligência e erro", argumenta.

    Outra evidência apurada no estudo é a falta de rigor dos médicos no preenchimento dos prontuários dos pacientes. Apenas 6% desses documentos estavam preenchidos corretamente: "esses profissionais se esquecem que o prontuário do paciente é a maior defesa do médico, a prova documental de seus procedimentos". Boyaciyan acrescenta que 70% das denúncias foram relacionadas a óbito materno ou fetal durante o parto. "A gravidez gera uma expectativa positiva de vida e, quando isso não se concretiza, a família tende a culpar o médico", argumenta.

    NEGLIGÊNCIA Pode parecer que atualmente existe mais incompetência dos médicos, ou falhas na sua formação e na infra-estrutura das clínicas e hospitais, mas o cardiologista Elcio Rodrigues da Silva, perito do Instituto de Medicina Social e Criminologia do Estado de São Paulo (Imesc) há mais de 20 anos, atribui à negligência o papel principal nessa questão dos erros médicos.

    Para a dissertação de seu mestrado, em andamento, Silva analisou 119 processos judiciais que discutiam a prática médica, entre 2001 e 2003, e adianta que em quase 60% deles o médico não executou procedimentos básicos. "Muitas vezes, a necessidade de ser ágil, devido à quantidade de trabalho, é incompatível com a boa prática médica." afirma.

    Em contrapartida, o conselheiro e corregedor do Conselho Federal de Medicina (CFM) Roberto Luiz D’avila, considera que é preciso evitar mal-entendidos e falsas expectativas diante de um tratamento. "No Brasil, estamos próximos do exagero visto no denuncismo, onde tudo é erro médico. Os médicos não têm obrigação ou compromisso de cura e sim de acompanhamento e cuidado", diz.

    Mesmo com o crescimento no número de denúncias, uma pesquisa do Ibope de agosto de 2005 mostra que é nesses profissionais de saúde que o brasileiro mais confia. Os médicos receberam voto de confiança de 81% dos 2.002 eleitores consultados em 143 municípios, índice acima de instituições como a igreja católica, que obteve 71% da confiança dos entrevistados e as forças armadas, com 69%.

    Outro aspecto importante nesse cenário é o maior acesso a informações, que aumenta a capacidade de duvidar e contestar os atos médicos por parte dos pacientes. Aliado a isso, estão os mecanismos facilitadores criados por universidades e grupos sociais ligados ao sistema judiciário, que prestam assistência gratuita à população carente, para que requeiram seus direitos diante das falhas desses profissionais.

     

    Mariella Oliveira