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    Ciência e Cultura

    versão impressa ISSN 0009-6725versão On-line ISSN 2317-6660

    Cienc. Cult. v.58 n.4 São Paulo out./dez. 2006

     

     

     

    Vivemos um momento delicado na história do planeta. E não por razões cósmicas, cosmológicas, astronômicas ou mesmo astrológicas. Não por razões naturais, pois, mas por razões culturais, quer dizer, por motivações sociais, políticas, religiosas e que tais.

    Enumerar os graves problemas que o homem hoje enfrenta, em diferentes circunstâncias, mas com a mesma, intensa e indeslindável presença, é fazer desfilar uma lista interminável de alegorias do mal, da dor e do sofrimento.

    Entre essas alegorias do padecimento humano nas sociedades contemporâneas está, qual uma locomotiva da crueldade do progresso, a do desemprego, a da falta de trabalho, a da ausência de perspectiva para o exercício de uma profissão, a da falta de ocupação e, consequentemente, a da negação da identidade pessoal por falta total do espelho no qual se reproduz a imagem social de nossas semelhanças e de nossas diferenças. Estamos no ponto de nos percebermos feitos ou só de semelhanças – o que produz, como significado, o ruído ensurdecedor do silêncio absoluto –, ou de puras diferenças – o que gera o silêncio alucinante do alarido contínuo.

    Globalizam-se as condições de reprodução do capital financeiro ao preço de sacrifícios regionais – chamados emergentes – nunca antes conhecidos.

    Daí o risco de que as populações possam vir a dissociar a democracia dos benefícios do bem-estar social gerado pelo desenvolvimento da economia. O que é ruim para os indivíduos, péssimo para a sociedade e pior ainda para os futuros da qualidade de vida do homem e do meio ambiente no planeta.

    Uma das virtudes apregoadas da democracia é a visibilidade de suas formas de decisão, de representação e de participação das sociedades na formulação dos destinos de seus repousos e de suas transformações.

    A hipocrisia democrática que só ponha ao alcance das populações os simulacros de seus benefícios sem, contudo, permitir-lhes o acesso real ao conforto material de suas liberdades ideológicas e/ou virtuais corre o risco de gerar, na percepção de seus atores e usuários, uma contradição perversa entre liberdade e bem-estar social.

    Nesse momento, a hipocrisia subsumirá a sinceridade, e o vício, não tendo mais tributo a pagar a quem quer que seja, confundirá a virtude com uma inconveniência passageira a ser contornada para o pleno triunfo dos finalismos que tudo justificam.

    Passa-se, assim, do equilíbrio ético construído entre o vício e a virtude para a plena vigência do cinismo de resultados competitivos, acirrando os individualismos a ponto de ameaçar a consistência dos elos que sustentam o contrato social que oferece condições de vida ao homem e que é razão de ser de sua vida em sociedade.

    A questão do trabalho, do emprego, da ocupação, da mobilidade social é grave no mundo contemporâneo e mais grave ainda em países como o Brasil, pois aponta para a necessidade de medidas políticas urgentes dos governos, das entidades e das instituições nacionais e internacionais, que alterem a rota de colisão em que as nossas sociedades foram postas pelo primado do capital especulativo e pouco produtivo, não só do ponto de vista econômico, mas sobretudo do ponto de vista social, político e cultural.

    É ao Trabalho que se dedica o núcleo temático deste número da revista, sob a coordenação do professor Marcio Pochmann, reunindo importantes pesquisadores e estudiosos do assunto no país.

    Ficção, poesia, reportagens, notícias e informações fazem, como sempre, as margens dinâmicas dos fluxos temáticos que correm no intervalo entre Ciência e Cultura.

     

    CARLOS VOGT
    Editor chefe, outubro de 2006