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    Ciência e Cultura

    versión impresa ISSN 0009-6725versión On-line ISSN 2317-6660

    Cienc. Cult. v.58 n.4 São Paulo oct./dic. 2006

     

     

    A ATOMIZAÇÃO DA ESTRUTURA SINDICAL BRASILEIRA APÓS A CONSTITUIÇÃO DE 1988

    Carlos Henrique Horn

     

    A Constituição Federal de 1988 (CF 1988) trouxe consigo relevantes mudanças no marco jurídico do sistema brasileiro de relações de trabalho. No que se refere especificamente à organização sindical, essas mudanças representaram uma ruptura, ainda que parcial, com o modelo do corporativismo estatal inaugurado nos anos 1930. Assim, a CF 1988 suprimiu as disposições que autorizavam a interferência direta do poder executivo na organização e gestão das associações sindicais, dentre as quais se incluíam a exigência de reconhecimento estatal para funcionamento e a possibilidade de destituir diretores sindicais. Porém, diversos traços essenciais do corporativismo estatal foram preservados, com destaque para o monopólio da representação na base dos sindicatos e o acesso a fontes de financiamento tributário.

    Algumas das modificações decretadas pela nova Constituição, em especial o direito de sindicalização dos funcionários públicos e a supressão da exigência de reconhecimento do Ministério do Trabalho para o funcionamento das associações sindicais, ampliaram o espaço normativo para a criação de novos sindicatos. Com efeito, desde o final dos anos 1980, o número de sindicatos cresceu vertiginosamente no país, tornando ainda mais atomizada a organização sindical brasileira. Os dados da pesquisa sindical realizada pelo IBGE mostram que o número de sindicatos passou de 9.118 para 15.961 sindicatos entre 1987 e 2001 (1). Os sindicatos de empregados urbanos e de trabalhadores autônomos apresentaram as maiores taxas de crescimento, multiplicando seu número, respectivamente, por 2,6 e 5,2 nos anos entre a promulgação da CF 1988 e o início do novo século. De outro lado, os sindicatos rurais de trabalhadores e de empregadores, bem como os de profissionais liberais, evidenciaram variações substancialmente menores. A tabela 1 apresenta as variações médias anuais no número de sindicatos em três períodos distintos. Os dados do período 1987-1992 capturam as alterações vinculadas aos anos imediatamente posteriores à promulgação da CF 1988, ao passo que os do período 1992-2001 correspondem grosseiramente aos anos 1990 (2).

     

     

    Dentre as várias questões suscitadas por esse crescimento dos sindicatos, uma delas está em saber se a aceleração observada após 1988 constitui um fenômeno singular na história da criação dessas organizações no Brasil. Se notarmos que o número de sindicatos já era elevado no ponto de partida, ou seja, que a atomização da organização sindical precede a nova Constituição, não parece incorreto supor que um crescimento mais acelerado no seu número poderia ter ocorrido num passado mais remoto. Alguma luz sobre essa questão pode ser lançada com base nos dados da tabela 2, em que se combinam informações de diferentes fontes sobre a evolução do número de sindicatos entre 1945 e 2001.

     

     

    Os dados da tabela 2 sugerem que um crescimento excepcional após 1988 caracteriza apenas a trajetória das organizações de empregados urbanos. A variação no número assemelha-se à do total dos sindicatos urbanos, porém com oscilações mais acentuadas. Assim, a expansão do intervalo 1945-1966 foi relativamente mais intensa, sobretudo no período entre meados dos anos 1950 e dos anos 1960, ao passo que o decréscimo ocorrido no auge do regime autoritário foi mais pronunciado. Já o crescimento exponencial ocorrido nos anos posteriores à CF 1988 não apresenta precedente desde 1945 (3). Quanto aos demais tipos de sindicatos, entretanto, o crescimento numérico após 1988 não configura uma singularidade. Isto porque, em determinados períodos do passado, o número deles aumentou em ritmo ainda mais rápido do que o verificado recentemente. Este é particularmente o caso dos sindicatos rurais de trabalhadores e de empregadores entre os anos 1960 e 1970 e dos sindicatos de profissionais liberais entre 1977 e 1987.

    A trajetória excepcional dessas agremiações de empregados urbanos explica-se, em larga medida, pelo direito à sindicalização dos funcionários públicos inscrito na Carta Magna. A criação desse tipo de sindicato contribuiu com 38,2% da variação no número de organizações de trabalhadores urbanos entre 1987 e 2001 (4). Mas também os sindicatos de trabalhadores no comércio, em transportes terrestres e em estabelecimentos de educação cresceram de forma exponencial nesse período. O boom no número de sindicatos de empregados urbanos não foi acompanhado, todavia, por crescimento proporcional dos associados a eles. O processo de atomização caracterizou-se não apenas por um maior número de associações, mas também pela redução de seu tamanho médio. Em 1988, o tamanho médio dos sindicatos de empregados urbanos era de 2.499 associados; em 2001, reduzira-se para 1.459. Essa redução no tamanho médio das organizações afetou todos os tipos de sindicatos nos anos 1990. Com isso, a estrutura sindical passou a contar com maior participação dos de menor porte. Por exemplo, enquanto os sindicatos de trabalhadores urbanos com até mil associados correspondia a 43,4% do total em 1987, essa percentagem saltou para 60,8% em 2001.

    A organização sindical brasileira evidenciou enorme crescimento no número de agremiações após a promulgação da CF 1988. Esse crescimento fez com que aumentasse seu grau de atomização, em particular nos segmentos de empregados urbanos e de trabalhadores autônomos. Nos primórdios do novo século, portanto, um traço característico básico da organização sindical é a existência de milhares de associações na base da estrutura, com número de associados, em média, ainda menor do que o registrado no período que antecede à nova Constituição.

     

    Carlos Henrique Horn é economista, professor do Departamento de Ciências Econômicas e do Programa de Pós-Graduação em Economia – Área de Desenvolvimento Econômico, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).

     

     

    NOTAS E REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

    1. IBGE. Sindicatos: indicadores sociais 2001. Rio de Janeiro: IBGE, Departamento de População e Indicadores Sociais, 2002.

    2. A delimitação dos períodos vincula-se, ainda, à disponibilidade de dados da Pesquisa Sindical do IBGE, cuja série se refere aos anos de 1987 a 1992 e ao ano de 2001.

    3. Não há dados divulgados sobre a evolução dos sindicatos de trabalhadores autônomos antes de 1987. Ainda assim, em face da variação exponencial em seu número após a promulgação da nova Constituição, não parece incorreto também associá-los à singularidade que caracteriza os sindicatos de empregados urbanos.

    4. Dado subestimado em virtude de os sindicatos de professores da rede pública (federal, estadual e municipal) e de auxiliares de administração e empregados em estabelecimentos de ensino da rede pública não estarem computados no segmento, mas junto com os trabalhadores do setor privado em estabelecimentos de educação e cultura.