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    Ciência e Cultura

    versão impressa ISSN 0009-6725versão On-line ISSN 2317-6660

    Cienc. Cult. v.59 n.1 São Paulo jan./mar. 2007

     

     

     

     

    CSI TUPINIQUIM

    Institutos de perícia usam biologia molecular na investigação policial

     

    No seriado norte-americano CSI, sigla para Crime Scene Investigation, uma equipe de peritos usa e abusa da ciência e da tecnologia para desvendar crimes que acontecem em Las Vegas, Miami ou Nova York, dependendo da versão da série. Nos episódios, cuja estrutura de busca do criminoso lembra o clássico Sherlock Holmes, coisas simples como um fio de cabelo ou restos de cigarro, a até o cheiro de um perfume na cena do crime, são evidências que compõem a investigação. Confrontadas em um banco de dados de DNA ou via equipamentos high tech de última geração, ajudam na identificação dos criminosos. Longe da ficção, a resolução de casos criminais por meio da biologia molecular é um dos ramos atuais da genética forense, que se popularizou, inicialmente, pela investigação de paternidade biológica ou outros vínculos genéticos por meio dos exames de DNA.

    Os métodos laboratoriais empregados nas análises criminais são os mesmos usados nos exames de investigação de paternidade. Ambos utilizam os princípios técnicos e acadêmicos da genética de populações humanas. No Brasil existem hoje vários grupos de excelência trabalhando na área, a maioria deles ligados a universidades. Isto significa, segundo o pesquisador Sidney dos Santos, da Universidade Federal do Pará (Ufpa), que muitos laboratórios brasileiros têm capacidade instalada para trabalhar com genética forense. No entanto, poucos se têm dedicado a desenvolver pesquisa básica na área.

    MARCADOR GENÉTICO Uma das pesquisas conduzidas por Santos na Ufpa é o desenvolvimento de um conjunto de marcadores genéticos de ancestralidade indígena, africana e européia capaz de identificar e quantificar a mistura interétnica individual. "Isto significa que é possível quantificar a proporção de genes dessas origens em cada indivíduo analisado", explica Santos. A proposta inicial de Santos era usar os marcadores em estudos de associações entre doenças genéticas e mutações específicas. "Entretanto, sabemos que a possibilidade de estimar a mistura interétnica individual pode ser um coadjuvante no processo de investigação criminal, quando se tem uma evidência biológica do suspeito", afirma o pesquisador. "Ainda trabalhamos no nível de conjecturas; há um longo caminho entre disponibilizar a metodologia e resolver as implicações éticas que este tipo de ação pode exigir", considera Santos.

    Uma versão brasileira do CSI pode ser encontrada no Instituto de Pesquisa e Perícias em Genética Forense da polícia civil carioca, que trabalha em conjunto com a Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). O Instituto recebe desde amostras de material de investigações criminais, como parentes que vão doar sangue e, é claro, os próprios suspeitos, para coleta de material genético a ser confrontado com as evidências. O laboratório do Instituto analisa o DNA retirado de evidências como roupa com sangue ou sêmen; sangue coletado de armas ou de veículos envolvidos em crimes; sangue revelado por luminol em roupas, estofamentos ou outros revestimentos; esfregaços oral, vaginal ou anal de vítimas de violência sexual; amostras encontradas em corpos carbonizados ou em ossadas. "Todo este material é preparado para se obter um ‘perfil genético’ que será comparado com parentes, caso se deseje identificar o doador da amostra questionada, ou com o suspeito, caso se deseje identificar o criminoso", explica Rodrigo Soares de Moura, especialista em genética forense da UFRJ e coordenador do Laboratório de DNA da polícia carioca.

    GERAR PROVAS CONTRA SI MESMO Todo exame de DNA é comparativo. Hoje os institutos de perícia trabalham com casos fechados, comparando o DNA do suspeito com o das evidências criminais. Nos casos negativos não há possibilidade de comparar o DNA dos locais de crime com o de potenciais agressores. O que fazer, portanto, quando não há suspeito? Nesse caso uma ferramenta útil seria um banco de DNA criminal, semelhante ao do seriado americano. O banco é um conjunto de tipos diferentes de DNA, os chamados marcadores genéticos. Ele funciona, na verdade, como um banco de impressões digitais. "Se pudéssemos contar com um banco de DNA teríamos uma ferramenta poderosa contra a impunidade, notadamente em homicídios, crimes sexuais e na identificação de pessoas mortas ou desaparecidas", diz Paulo Roberto Fagundes, coordenador de projetos especiais da Secretaria Nacional de Segurança Pública.

    Um banco de dados de DNA poderia esclarecer crimes sem suspeitos de forma rápida e objetiva. Entretanto, para ser usado em juízo, o doador teria que autorizar a análise de seu perfil genético. No Brasil uma pessoa acusada de um crime não é obrigada a fornecer amostra para que seu DNA seja analisado e comparado com o DNA obtido de cena de crimes. "Ninguém é obrigado a gerar prova contra si mesmo. Para construir um banco de DNA criminal teríamos que mudar a Constituição brasileira", explica Moura. Outro uso para o banco de marcadores genéticos seria na identificação de corpos. "O material genético das ossadas é preparado, analisado e alimentaria um banco de DNA. Quando se analisa parentes de desaparecidos, pode-se encontrar, por confronto genético direto, a pessoa desaparecida", explica.

    Vários países têm banco de dados de DNA criminal: EUA, Inglaterra, Canadá, Alemanha, França, Austrália, Nova Zelândia. "A questão é que tipo de crime está sujeito a incluir a pessoa no banco. Na Inglaterra, por exemplo, até em crimes leves se prevê inclusão legal do DNA do agressor no banco", conta Fagundes. Em todos os países onde se implantou um banco de DNA, existiu uma discussão jurídica precedente. No Brasil, essa discussão está, hoje, no âmbito do Ministério da Justiça.

     

    Patrícia Mariuzzo