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    Ciência e Cultura

    versión impresa ISSN 0009-6725versión On-line ISSN 2317-6660

    Cienc. Cult. v.59 n.1 São Paulo ene./mar. 2007

     

     

     

    QUÍMICA

    Conceito do que é tóxico muda através dos tempos

     

    Substâncias consideradas benéficas hoje podem ser declaradas tóxicas amanhã. Para melhorar a qualidade da vida, a história registra tentativas de lidar com as doenças, com as pragas dos alimentos, com a contaminação da água e com a higiene do ambiente. Nesse processo de percepção de que bons resultados imediatos podiam não garantir a segurança no longo prazo, foram saindo de cena práticas usuais, como a ingestão de substâncias — petróleo, clorofórmio e amônia (veja tabela) — consideradas terapêuticas para uso humano no passado. Se tal utilização nos parece bizarra atualmente, não se pode descartar a proibição futura de compostos hoje consumidos largamente.

    A Sociedade Norte-Americana de Química (ACS, na sigla em inglês) estima que haja 11 milhões de substâncias químicas no mundo, das quais 80 mil utilizadas na indústria alimentícia e farmacêutica, e também no uso doméstico. Porém, somente cerca de 6% possui dados de toxicidade."A principal conseqüência é o fato de muitas substâncias serem liberadas ao consumo, sem um devido estudo toxicológico, capaz de detectar características nocivas à saúde humana após uso prolongado", alertam os autores de um levantamento das substâncias químicas, publicado recentemente no periódico científico Química Nova (vol.29, outubro de 2006), os pesquisadores Luiz Cláudio Ferreira Pimentel, Camille Rodrigues Chaves e Layla Alvim, orientados pelo professor do Departamento de Química Analítica da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Júlio Carlos Afonso.

     

     

    Com a explosão da indústria química no século XIX, multiplicou-se a síntese e produção de substâncias com aplicação para corantes, medicamentos, explosivos, fertilizantes e outros, consolidando-se, no século seguinte, como a ciência responsável pela transformação da natureza. O fascínio por esse poder transformador da química como panacéia dos problemas humanos, ofuscou qualquer tentativa de estabelecer cuidados na manipulação e uso de seus produtos. Apenas em 1920 surgiu o símbolo de veneno (caveira branca em fundo preto) em rótulos de produtos químicos.

    No Brasil, isso ocorreu ainda mais tarde, em 1943, com a Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT) que estabeleceu os meios de caracterizar as profissões que ofereciam periculosidade e insalubridade a trabalhadores, graças à exposição e uso contínuo de produtos químicos.

    DDT E TALIDOMIDA O DDT (diclorodifeniltricloroetano), inseticida largamente empregado no combate a mosquitos transmissores de doenças, como a malária, e de pragas da monocultura, foi um dos precursores da Revolução Verde, dos anos 1970, que questionou fortemente o impacto da tecnologia na saúde humana e ambiental. Os efeitos cumulativos do DDT — no organismo e meio ambiente — só aparecem no longo prazo. Na década anterior, a luz vermelha acendeu também para a indústria farmacêutica com os inúmeros casos de deformações constatadas em fetos e recém-nascidos, conseqüência do uso indiscriminado da talidomida, usada como sedativo e hipnótico. Tais evidências obrigaram um maior controle na liberação e comercialização de novas drogas. Atualmente, os medicamentos passam por testes pré-clínicos em cultura de células e em animais, para então chegar a três fases de testes em humanos: fase 1 - em pacientes saudáveis; fase 2 - em grupo de pacientes doentes; fase 3 - em amostra maior de pacientes doentes. A chamada fase 4 ocorre depois que o medicamento está liberado para consumo.

    Mesmo após passar por tantos testes rigorosos e aprovação de agências fiscalizadoras como a norte-americana FDA e a nacional Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), casos como a suspensão da venda de drogas largamente consumidas ainda surpreendem. "A velocidade com que um medicamento ou produto novo é difundido em nível mundial tem a ver com a disputa existente entre os lados científico e financeiro dos fabricantes de produtos farmacêuticos e químicos", alertam os autores da pesquisa.

     

     

    LISTA DOS PROIBIDOS Nos anos 1990, pós ECO 92 (Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente e o Desenvolvimento), foi a vez da retirada progressiva de produtos contendo CFC (cloro/flúor/carbono) do mercado, devido a seu impacto danoso na camada de ozônio, fenômeno que saiu dos jargões científicos para o cotidiano da população.

    O foco hoje está nos produtos que utilizam nanotecnologia, já disponíveis no mercado, ainda sem qualquer avaliação de riscos, além de outros amplamente consumidos, cuja segurança só poderá ser melhor avaliada com o passar do tempo, como, por exemplo, os adoçantes artificiais. Embora alguns se espantem com o procedimento, os testes exigidos para aprovação de produtos muitas vezes não dão conta de efeitos em longo prazo e nem de combinações com outros hábitos de vida, assim como ocorreu com as gorduras Trans (ou "transversos", formadas pelo processo de hidrogenação natural ou industrial) e alimentos que contêm ingredientes transgênicos, que não estão proibidos, mas que precisam estar discriminados na rotulação do produto. "Todas as novas tecnologias possuem riscos e, a rigor, somente o tempo permite aferir o nível real de segurança do emprego das mesmas", enfatizam os autores da pesquisa.

     

    Germana Barata