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    Ciência e Cultura

    Print version ISSN 0009-6725On-line version ISSN 2317-6660

    Cienc. Cult. vol.59 no.1 São Paulo Jan./Mar. 2007

     

    BIBLIOTECA ELETRÔNICA

    ROYAL SOCIETY DISPONIBILIZA SEU ACERVO NA INTERNET

     

    A Royal Society, uma das mais respeitadas instituições científicas do mundo, tornou disponível seu acervo eletrônico. Não chega a ser a mítica Biblioteca de Alexandria, no Egito, que reuniu o maior acervo cultural e científico da Antigüidade (entre 400 e 700 mil rolos de papiro), mas o tamanho do arquivo em artigos, por exemplo, é invejável: mais de 60 mil, desde o ano de 1665. Além dos pesquisadores em ciências naturais, a coleção deve interessar a historiadores, filósofos e sociólogos da ciência. E também aos meramente curiosos.

    Mais que um retrato histórico de mais de 300 anos, os arquivos compõem um filme, contando grande parte da história da filosofia natural, em reforma a partir do século XVI, e da ciência, da qual apresenta trabalhos seminais. A lista inclui preciosidades como: as primeiras observações de organismos sob os recém-inventados microscópios; a descoberta de diversos planetas e luas do sistema solar (Marte, Urano, Oberon); os papers de Isaac Newton, inclusive o primeiro – "Nova teoria sobre luz e cores"– publicado em 1672, ano em que se tornou membro da Royal Society e descreveu também o projeto do telescópio refletor; a série de experimentos com eletricidade de Michael Faraday, no século XIX; trabalhos de Charles Darwin; e a teoria da relatividade einsteiniana, entre tantos outros marcos científicos.

    A primeira edição da Philosophical Transactions foi publicada em março de 1665, apresentando a correspondência do filósofo natural e diplomata Henry Oldenburg, o primeiro secretário-adjunto da sociedade, com os principais cientistas europeus. Oldenburg foi o primeiro editor da revista. Na carta-dedicatória, além das devidas deferências à realeza de um "obediente e humilde servo" e a Deus, ele exalta o potencial da ciência (bem como dos cientistas), sobretudo a local, e se propõe a disseminar "encorajamentos, investigações, direções e padrões que deverão animar audiências universais".

    ORIGEM NO DEBATE Portanto, com a abertura de seus arquivos em 2006 a Royal Society apenas estende e aprofunda a missão baconiana a que sua primeira publicação se dedicou desde o início: ao relatar os estudos e trabalhos do engenho humano "em muitas partes consideráveis do mundo" e, com isso, expandir o alcance dos princípios racionais e da "civilização". Fundada oficialmente em 28 de novembro de 1660, a entidade nasceu a partir de encontros de filósofos naturais que, na década de 1640, se dedicavam a discutir as idéias de Francis Bacon. A idéia era promover reuniões semanais para acompanhar experimentos – cuja curadoria coube inicialmente a Robert Boyle – e discutir o que hoje se denominariam "tópicos científicos".

     

     

    Em 1624, Bacon havia publicado A nova Atlântida, espécie de utopia em que o governo da ilha fictícia de Bensalem cabia aos sábios (meio sacerdotes, meio cientistas), que compunham a "Casa de Salomão". Estava posto o projeto de domínio total da natureza, num programa de pesquisas extremamente atual: prolongar a vida, devolver a juventude, mitigar a dor, curar doenças incuráveis, criar instrumentos de destruição (armas, veneno), acelerar a germinação, fabricar "compostos ricos" para a terra, produzir alimentos novos, fabricar novos fios e novos materiais, criar ilusões e maiores prazeres para os sentidos. Bacon defendia que conhecimento era poder, e não somente "argumento ou ornamento". Divorciada da ciência e da filosofia, a política poderia se tornar destrutiva e não construtiva. Para tanto, fazia-se necessário organizar a própria pesquisa, estimular a comunicação e o intercâmbio dos pesquisadores em atividade e fornecer patrocínio real ao avanço de idéias e experimentos. A Coroa britânica ouviu seus conselhos.

    O FAZER CIENTÍFICO Pode-se notar como era artesanal o modo de fazer o que viria a ser a ciência. Os trabalhos eram, em geral, de um único autor, periodicidade bastante irregular, e os relatos tinham tom pessoal. Todas as disciplinas cabiam numa única revista. Não havia separação entre amadores e profissionais: cientistas eram diletantes, excêntricos, cavalheiros, teólogos. A escala da atividade científica era pequena, as oportunidades de emprego eram raras. Se uma descoberta ou invenção se mostrava útil, isso não era parte de um esforço sistemático para obter inovações técnicas e muitas vezes nem se dava de forma intencional.

    Foi somente no século XIX que a atividade de pesquisa científica se profissionalizou e passou a integrar, como capital, o sistema de produção, conquistando espaço crescente nas universidades, indústrias e governos. Petróleo, eletricidade, aço e motor de explosão, setores industriais nos quais a pesquisa de cunho mais teórico se mostrou de grande utilidade, abriram os olhos da classe capitalista. Em especial, aos das empresas gigantes que surgiam, frutos da concentração de capital, não escaparia a percepção da importância da pesquisa como meio de estimular ainda mais a acumulação de capital.

     

    Flávia Natércia