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    Ciência e Cultura

    versión impresa ISSN 0009-6725versión On-line ISSN 2317-6660

    Cienc. Cult. v.59 n.2 São Paulo abr./jun. 2007

     

     

     

    AQUECIMENTO GLOBAL

    Pesquisador denuncia o lucrativo mercado de cotas de carbono

     

    Enfim, parece que o planeta despertou para as evidências que o clima está mudando e que todos os alertas — tidos como alarmistas por muita gente de peso — disparados nas últimas décadas sobre aquecimento global eram mesmo para valer. Quando os Estados Unidos retiraram o apoio ao Protocolo de Kyoto, o mundo se uniu, incrédulo, em indignação.

    Eleito como solução mágica na época, a entrada em vigor do Protocolo tornou-se questão de honra para algumas organizações ambientais, que fizeram uma contagem regressiva sobre quantas assinaturas ainda eram necessárias. Nada mais ilusório, porém, aponta Larry Lohmann, pesquisador da fundação sueca DHF e autor do livro Carbon trading. Segundo ele, o Protocolo, e principalmente o comércio de carbono nele previsto, muda pouco o cenário mundial das emissões de carbono. Trata-se um mecanismo de mercado, pouco prático e nada efetivo, que promove o comércio do direito de poluir. Acabou funcionando de maneira perversa, ao drenar as atenções de soluções mais radicais e efetivas que, agora, se mostram urgentes. O pesquisador considera que a única saída é promover uma regulação dura, que taxe e controle a indústria poluente, ao lado de reformas estruturais e investimentos fortes na redução do consumo de energia.

    Todas as tentativas atuais para transformar o carbono em negócio acabam ajudando os piores poluidores a continuar poluindo, diz Lohmann. Hoje, os setores industriais mais responsáveis pela crise climática estão ganhando enormes pacotes grátis de recém-criados direitos de poluir que eles podem transformar em enormes lucros. Na Europa, por exemplo, as usinas de geração de energia colecionam centenas de milhões de libras por ano de lucros, simplesmente por fazerem o que sempre fizeram, enquanto o cidadão comum sofre com o aumento do preço da eletricidade.

    Para o pesquisador, os grandes poluidores beneficiam-se comprando direitos de poluir mais, a partir de projetos no exterior em que, supostamente, economizariam carbono. Por exemplo, uma empresa britânica de cimento ou de petróleo que quer continuar a poluir como sempre, mas não recebeu suficientes cotas grátis de poluição por seus governos, pode suprir a desvantagem simplesmente comprando créditos a baixo custo de, digamos, uma estação eólica na Índia, "economizadora de carbono".

     

     

    Além de ser injusto, tudo isso simplesmente encoraja os piores poluidores do Norte a protelar o afastamento estrutural dos combustíveis fósseis que a questão climática exige no longo prazo. "Por que inovar se você pode, ano após ano, comprar bem barato os direitos de poluição de alguém?" pergunta Lohmann. Na Europa, até as próprias indústrias, em alguns casos, estão apontando que essa não é a maneira de enfrentar a mudança climática e aceitam discutir uma regulamentação mais dura.

    Ele destaca, ainda, que é importante lembrar que foram os EUA que estavam por trás do impulso de tornar o Protocolo de Kyoto um documento pelo comércio de carbono. A Europa e o Hemisfério Sul estavam inicialmente céticos, mas depois acataram a idéia. Embora os EUA tenham abandonado o Protocolo de Kyoto, várias empresas dos EUA continuam, a favor dele.

    A Enron é um bom exemplo. Ela apoiou o tratado porque queria ganhar dinheiro com o comércio de carbono — e se enfureceu com George W. Bush por não assiná-lo. Em contrapartida, corporações como a ExxonMobil, não apoiaram por ainda não estarem preparadas para o comércio de carbono e, inicialmente, nem admitissem a responsabilidade humana sobre o clima. Bush ligou-se ao grupo da Exxon.

    Mas, mesmo que tivesse assinado Kyoto, ainda teria representado apenas o triunfo de uma facção das empresas dos EUA sobre a outra, conclui Lohmann.

     

    Rafael Evangelista