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    Ciência e Cultura

    Print version ISSN 0009-6725On-line version ISSN 2317-6660

    Cienc. Cult. vol.60 no.3 São Paulo Sept. 2008

     

     

     

    SOFTWARE LIVRE

    Fórum internacional reúne público recorde e espelha diversidade da comunidade brasileira

     

    Perl, python e java, combinados com postgre, mysql, misturados ao debate sobre inclusão digital e software público e complementados com palestras sobre zope, drupal. Tudo isso regado a um intenso debate sobre um constante questionamento das regras do sistema de propriedade intelectual e um interessante debate sobre os impactos sociais do software livre. Mistura curiosa de evento técnico, feira de informática e congresso científico, o Fórum Internacional de Software Livre (Fisl), realizado anualmente em Porto Alegre teve, neste ano, seu maior público. No último mês de abril, foram registradas 7417 pessoas a circularem pelos prédios da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul em três dias de evento, um recorde que confirma o Fisl como a maior reunião de entusiastas do software livre da América Latina.

    Os participantes vieram de 21 países e de todos os estados brasileiros, misturando-se em um espaço dividido entre stands empresariais, salas de debates e áreas organizadas por usuários de diferentes tipos de software. "Felizmente, a variedade de espaços e a diversidade dos grupos presentes quebraram, até certo ponto, a estrutura hierárquica e as tendências comerciais da conferência", comenta Aaron Shaw, pesquisador da Universidade de Berkeley que estuda o movimento software livre. Ele diz ter ficado feliz ao ver vários jovens, esparramados pelo chão com seus laptops abertos. "A atmosfera de circo, ou feira, sentida nos cantos do evento, também era reforçada pelos robôs esquisitos que circulavam, junto com os geeks do Debian soando seus apitos", ressalta. Os "geeks do Debian" a que ele se refere, são os usuários e desenvolvedores de uma das muitas variações do sistema operacional livre GNU/Linux, o Debian.

    Fabrício Solagna, membro da organização do evento, aponta alguns fatores estruturais que teriam feito o Fisl atingir seu público recorde este ano. "Realizamos atividades importantes que abriram espaço de diálogo com outros setores da sociedade. Citaria o seminário ‘Além das redes’; um encontro de Cultura Colaborativa, também realizado na capital gaúcha; além de um profundo envolvimento com os pontos de cultura da região Sul, por conta da aprovação do Projeto Minuano Digital pelo Ministério da Cultura (Minc)". Pontos de cultura são espaços organizados por ONGs e patrocinados pelo Minc, que procuram integrar atividades culturais com o registro digital dessas manifestações, fazendo uso prioritário de softwares livres. Solagna lembra também que o evento, que nos últimos dois anos foi realizado em um espaço empresarial, este ano retornou à PUC, onde foi realizado desde sua primeira edição, o que ajudaria a integrar o público universitário.

     

     

    GLOBO, TERRA, UOL, YAHOO, GOOGLE, TELEFÔNICA... O crescimento do número de empresas de comunicação participantes como patrocinadoras e expositoras no evento também chamou a atenção. Estaria havendo um boom de interesse das "ponto com" no software livre? Segundo Solagna, haveria duas explicações. A primeira, refere-se a um maior esforço de mobilização da mídia. Mas, além disso, teria havido uma espécie de "efeito Campus Party". Trata–se de um evento realizado na Espanha, desde 1997, e que reúne diversas manifestações culturais em torno das tecnologias de informação e comunicação, como games, blogs e celulares. Patrocinado pela Telefônica, teve uma primeira edição brasileira neste ano, com boa repercussão na imprensa e grande presença da comunidade software livre. "Isso serviu para estabelecer um link entre os eventos, para que as empresas de comunicação maiores descobrissem a importância e a irradiação do tema software livre", diz Solagna.

    Para Aaron Shaw, entretanto, as empresas entenderam pouco do espírito da comunidade software livre. UOL e Caixa Econômica Federal, por exemplo, distribuíram brindes sem qualquer relação com as propostas do software livre. Ao mesmo tempo, Shaw considera que a força do Fisl vem dessas contradições.

     

     

    No próximo ano, quando o Fisl faz dez anos, o objetivo será elevar o número de participantes para dez mil. "Nosso desafio agora será marcar, de forma ainda mais forte, a presença do software livre na vida das pessoas", diz Sady Jacques, coordenador geral do evento.

     

    Rafael Evangelista