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    Ciência e Cultura

    versão impressa ISSN 0009-6725versão On-line ISSN 2317-6660

    Cienc. Cult. v.61 n.1 São Paulo  2009

     

    LIVROS INDÍGENAS

    LÍNGUA MATERNA PREDOMINA, MAS SEM APOIO FEDERAL DIRETO

     

    A Coordenação Escolar Indígena, órgão da Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade (Secad) do Ministério da Educação (MEC), divulgou em julho passado um balanço dos livros específicos para educação indígena que produziu e distribuiu entre 2005 e 2008. Foram 65 no total, elaborados pelos próprios professores indígenas e por membros das comunidades, dos quais mais da metade leva a língua indígena para as escolas dessas comunidades: 11 são bilíngues e 23 são na língua materna dos índios. Embora essa predominância fortaleça o direito indígena a um ensino bilíngue, previsto desde a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), de 1996, há indigenistas que consideram pequeno o número dessas publicações e alertam para o fim dos editais do MEC para produção e distribuição desses livros.

    As obras em línguas indígenas ou bilíngues abordam temas ligados à cultura e à história dos povos indígenas, como calendário de plantio, caça, pesca e de festas, conhecimentos matemáticos e de plantas medicinais, culinária, escrita, fala. A elaboração dos conteúdos foi feita a partir de pesquisas feitas pelos professores indígenas junto a caciques, pajés e idosos das comunidades. Os livros resgatam cantigas, lendas, histórias e o vocabulário. De acordo com a Secad, os livros produzidos desde 2005, quando a Comissão Nacional de Apoio à Produção de Material Didático Indígena (Capema) começou a avaliá-los para uso nas escolas indígenas, representam 36 povos das regiões Sudeste, Nordeste, Norte e Centro-Oeste. Essas duas últimas concentram a maior produção de livros em línguas maternas e bilíngues, 29.

     

     

    "Para todo o Brasil, para todas as escolas indígenas, para os mais de 220 povos, para os mais de 177 mil alunos das escolas indígenas, é pouco", avalia Luis Donisete Grupioni, do Instituto de Pesquisa e Formação em Educação Indígena (Iepé), entidade de apoio a comunidades indígenas do Amapá e do norte do Pará. De acordo com o MEC, atualmente, há cerca de 170 línguas indígenas em uso nas comunidades de 210 etnias brasileiras, mas não há um número preciso de quantas das 2.422 escolas indígenas do país registradas no último censo, de 2006, são bilíngues. A Secad não informa quantas delas receberam os 65 livros já produzidos, que têm tiragem entre mil e dez mil exemplares, mas acrescenta que outros 25 já estão sendo produzidos.

    BUSCA POR ESCOLARIZAÇÃO A taxa de crescimento das populações indígenas é mais que o dobro da média nacional (de aproximadamente 1,4% ao ano), mas o crescimento de alunos matriculados em escolas indígenas é ainda maior: de 2002 a 2006, eles aumentaram em 48,7%. Grande parte do material didático produzido por professores indígenas e distribuído pelo MEC é de cartilhas de alfabetização ou coletâneas de textos curtos voltadas para o primeiro segmento do ensino fundamental, de 1ª a 4ª séries, que concentram 60,5% do total de indígenas matriculados. Mas o segundo segmento, de 5ª a 8ª, que teve um aumento de 78,1% nas matrículas de 2002 a 2006, também está contemplado nas obras apoiadas pelo MEC. É o caso de Pesquisa sobre as línguas baré e uerekena, livro para alunos falantes do nheengatu, que apresenta, em formato de dicionário, espécies de aves, peixes, animais e objetos de trabalho em nheengatu e uerekena. O nheengatu, língua geral falada por índios e portugueses no século XVI, ainda se mantém viva na Amazônia, e desde 2003 é uma das línguas oficiais do município de São Gabriel da Cachoeira (AM).

    "Desde que a Capema foi criada, apenas dois editais foram lançados, um para obras novas, outro para reedições, e boa parte dessa produção está vindo a público porque foi elaborada por organizações indígenas, de apoio e universidades", diz Grupioni. "Agora, organizações de professores indígenas, escolas indígenas, universidades e organizações de apoio que estejam produzindo materiais didáticos não podem mais contar com o MEC, porque simplesmente não haverá mais editais para esse tipo de produção específica para as escolas indígenas. Esses grupos e movimentos terão que solicitar esses apoios para as secretarias de educação estaduais, porque só elas agora podem acessar o recurso federal para essa finalidade", completa.

    Essa política do MEC não afetou apenas a educação indígena. Após descobrir irregularidades na aplicação de recursos do programa Brasil Alfabetizado, também da Secad, foram suspensos todos os repasses de dinheiro para ONGs, e apenas estados e municípios recebem atualmente o recurso. Segundo o MEC, por pertencerem aos sistemas estaduais e municipais de ensino, todas as escolas indígenas têm acesso ao Programa Nacional do Livro Didático, que enviou para as escolas indígenas, ao longo de 2006, cerca de 600 mil livros, num investimento superior a R$ 3 milhões.

     

    Rodrigo Cunha