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    Ciência e Cultura

    Print version ISSN 0009-6725On-line version ISSN 2317-6660

    Cienc. Cult. vol.62 no.3 São Paulo  2010

     

     

    O FUTURO DA EXPLORAÇÃO MINERAL EM ÁGUAS BRASILEIRAS E INTERNACIONAIS

    Kaiser Gonçalves de Souza

     

     

    Plataforma Continental Jurídica Brasileira, com uma área de 4,5 milhões de quilômetros quadrados, é o espaço geográfico marinho sobre o qual o Brasil exerce direito de soberania para efeitos de exploração e aproveitamento dos seus recursos naturais. Ela é constituída pelo Mar Territorial Brasileiro, a Zona Econômica Exclusiva e a área de extensão da plataforma continental, além das 200 milhas náuticas, pleiteada junto às Nações Unidas (ONU) (figura 1). Atividades relacionadas com o desenvolvimento dos recursos minerais nessas regiões e em áreas oceânicas adjacentes são guiadas pela Política Nacional para os Recursos do Mar e pelo Plano Setorial para os Recursos do Mar. Esses instrumentos legais visam a promover o uso sustentável dos recursos minerais e biológicos no que diz que respeito ao desenvolvimento econômico e social do país (1).

     

     

    Para fins de atividades econômicas, o Brasil divide essas regiões em Áreas de Relevante Interesse Mineral (Arim) (figura 2). Elas são indicação de territórios de importância estratégica quanto ao potencial mineral, integrados por tipologia de substância de interesse econômico e estratégico para a União, o que leva também em conta a sustentabilidade ambiental da atividade (2). As Arims podem ser instrumentos eficazes para elaboração de diretrizes públicas, no sentido de evitar conflitos quando da criação de Unidades de Conservação, fundamentadas nas Áreas de Prioridade para Preservação da Biodiversidade.

     

     

    INSUMOS PARA A CONSTRUÇÃO CIVIL Entre os recursos atualmente confirmados com potencial significativo de exploração estão a areia e o cascalho, utilizados principalmente na construção civil e como fonte para reconstrução de praias erodidas ao longo da costa brasileira (3). Pesquisas feitas pelo Serviço Geológico do Brasil, universidades e empresas privadas, mapearam bilhões de metros cúbicos de areia quartzosa e cascalhos ao longo margem continental brasileira. Parte desse material já vem sendo utilizado para reconstrução de praias erodidas.

    Estudos desenvolvidos em Santa Catarina, ao longo da plataforma continental externa da região Sul do Brasil, revelam também boa quantidade de areia ao longo de duas áreas da plataforma continental interna, que foi estimada em 5,2 bilhões de m3 (Laguna até Mampituba) e 7,2 bilhões de m3 (São Francisco até Itajaí). Considerando-se que a exploração mineral de depósitos marinhos de areia e cascalho é habitualmente desenvolvida próximo da costa, a atividade de mineração deverá ocorrer de forma restrita e sustentável para minimizar danos ao ecossistema costeiro.

    INSUMOS PARA A AGRICULTURA Também foram localizados, sob águas marinhas brasileiras, depósitos de minerais bioclásticos ricos em carbonato de cálcio, material usado na agricultura, na produção de filtros para água, na indústria de cosméticos, em suplementos alimentares e implantes ósseos, na nutrição animal e no tratamento de água em lagos. As jazidas se concentram numa das mais extensas áreas de agregados bioclásticos do mundo, ao longo da plataforma continental, entre o rio Pará e Cabo Frio.

    Os sedimentos encontrados na plataforma continental interna (região mais próxima da linha da costa) e média são constituídos por areia e cascalho formados por algas coralíneas sólidas e ramificadas, "concreções" (segregação concêntrica de minerais ao redor de um núcleo), moluscos e carapaças de pequenos animais que se acumularam desde eras ancestrais. Acredita-se que o conteúdo dos sedimentos nas margens continentais noroeste e oeste do Brasil, até a latitude de Cabo Frio, seja rico em carbonatos, com percentuais superiores a 75% de CaCO, o que corresponde a aproximadamente 50 vezes mais que o disponível nas reservas continentais.

    Amplamente utilizada como fertilizante e fonte de fósforo na indústria química, a fosforita tem sido encontrada e estudada na plataforma continental externa (parte da plataforma mais distante da costa) e no talude superior (região de declive em direção às áreas mais profundas do oceano, ao longo da margem continental brasileira). Depósitos de fosforitas marinhas foram encontrados em áreas de ressurgência costeira, onde as águas mais profundas, ricas em nutrientes, emergem em direção à superfície, com alta produtividade biológica.

    Pesquisas científicas desenvolvidas no Brasil indicam a ocorrência de rochas fosfáticas no "guyot" (elevação submarina cônica com topo plano) do Ceará, com conteúdo máximo de 18,4% de pentóxido de fósforo (P2OS). Outra pesquisa descreveu, preliminarmente, a ocorrência de nódulos fosfáticos na plataforma continental do Rio Grande do Sul.

    MATERIAI NÃO METÁLICOS Na margem continental brasileira encontram se depósitos naturais de sais minerais produzidos pela evaporação de grandes volumes de água. Eles também são conhecidos como "evaporitos". Formados há mais de 100 milhões de anos e compostos por substâncias como anídrica, gipsita, halita, potássio e sais de manganês, os evaporitos foram encontrados desde a bacia de Alagoas até o platô de São Paulo. Esses evaporitos correspondem à camada chamada de "sal" na terminologia da indústria do petróleo. Abaixo dessa camada foram encontrados gigantescos depósitos de óleo, que são chamados de depósitos do pré-sal (formados antes do "sal").

    A maior largura da bacia de sal ocorre na costa de Santos, estendendo-se por 650 quilômetros no platô de São Paulo. O sal pode estar associado a estruturas de "domos" (resultantes do movimento ascendente de massa salina, de forma aproximadamente cilíndrica) ou de "almofada" (estrutura similar ao domo, mas de forma mais achatada), respectivamente, ocorrendo nas porções norte e sul da bacia evaporítica.

    Foram identificados em Sergipe e na bacia de Alagoas sais de potássio e de magnésio, apresentando de 15 a 50 metros de espessura e localizados a 3 mil metros de profundidade. A mesma pesquisa mostrou a ocorrência de domos salinos, com grande conteúdo de halita, no domo de Barra Nova, sob as águas do Espírito Santo.

    Os domos identificados no limite norte de Abrolhos e Mucuri, na Bahia, juntamente com os de Barra Nova, podem ser economicamente interessantes, uma vez que esses depósitos são encontrados em águas relativamente rasas e não estão distantes da costa. O Brasil vem desenvolvendo pesquisas científicas com o intuito de definir áreas com interesse potencial para a mineração dos evaporitos, mas a exploração ainda não teve início.

    Todas as bacias com hidrocarbonetos tendem a conter também enxofre. O elemento, na forma de sulfeto, pode estar em camadas estratificadas ou presente em rochas, revestindo domos salinos. A origem dos sulfetos está ligada ao processo de redução do sulfato de anídrica para gás sulfídrico, por ação de bactérias. Na presença dos hidrocarbonetos, ocorre a oxidação desse gás, que libera os sulfetos na forma elementar. No Brasil, depósitos de sulfeto podem ser encontrados ao norte de Abrolhos. Três domos encontram-se entre 60 e 70 quilômetros da costa, numa profundidade de 20 a 30 metros.

    MATERIAIS METÁLICOS Minerais pesados estão presentes ao longo da costa brasileira, do Piauí ao Rio Grande do Sul. Atividades de extração de ilmenita, rutilo, monazita e zircônio são realizadas atualmente na Paraíba, Bahia, Espírito Santo e Rio de Janeiro. Jazidas de ilmenita, zircão e monazita tem sido estudadas em diferentes localidades da plataforma continental interna do Brasil, para identificação de elementos de alto valor econômico tais como titânio, zircônio, césio, lantânio, neodímio, tório, ouro, diamante e fósforo.

    Somente o depósito de Cumuruxatiba, na Bahia, contem 171 mil toneladas de ilmenita, 4 mil toneladas de monazita e 365 mil toneladas de zircônio e rutilo. Na zona costeira do Rio Grande do Sul foram encontrados, na região de Bujuru, depósitos de minerais pesados cujo potencial estimado é de 40 milhões de toneladas. Parte dessa acumulação está relacionada com a linha da costa e constitui-se, geralmente, de depósitos prolongados, paralelos e "subparalelos" (com leve ângulo de incidência) à praia, com largura de 30 a 100 metros e 18 quilômetros de comprimento. Outros depósitos estão relacionados a campos de dunas de surgimento recente na escala geológica, cobrindo terras de formação mais antiga.

    Nódulos polimetalicos ocorrem na forma de concreções porosas, de diversos tamanhos e formas, encontradas em camadas superficiais finas e descontínuas no assoalho oceânico, a profundidade média de 5 mil metros. Dragagens realizadas no platô de Pernambuco, a 2 mil metros de profundidade, recuperaram 150 quilos de materiais predominantemente constituídos de nódulos com densa cobertura metálica e com diâmetro variando entre 2 e 12 centímetros. Por volta de 90% dos nódulos recuperados apresentavam um núcleo de rochas fosfáticas com camadas concêntricas de 0,5 a 0,7 centímetros de espessura. Uma pesquisa recente indicou também áreas promissoras em região de mar aberto, no Atlântico Sul, incluindo a bacia oceânica adjacente à ilha de Trindade.

    NOVOS ESTUDOS Dois grandes programas nacionais, desenvolvidos no âmbito da Comissão Interministerial para os Recursos do Mar (CIRM) integram vários projetos de pesquisa para a plataforma continental brasileira e área oceânicas adjacentes do Atlântico Sul e Equatorial. Eles são o Programa de Avaliação da Potencialidade Mineral da Plataforma Continental Jurídica Brasileira (Remplac) e o Programa de Prospecção e Exploração dos Recursos Minerais da Área Internacional do Atlântico Sul e Equatorial (Proarea).

    Entre os projetos de pesquisa, desenvolvido em parceria entre o Serviço Geológico do Brasil (CPRM), a Diretoria de Hidrografia e Navegação (Marinha do Brasil) e universidades brasileiras estão as pesquisas de depósitos hidrotermais, ricos em zinco, cobre, ouro e prata, localizados na plataforma continental do Brasil e de crostas cobaltíferas das áreas internacionais adjacentes à plataforma continental brasileira. Essas áreas de pesquisa incluem o estudo das condições geológicas das áreas onde existem essas fontes minerais.

    Outra iniciativa que deverá ser posta em prática pelo Serviço Geológico do Brasil (CPRM) é a organização da geologia do Atlântico Sul e Equatorial em sistemas de informações geográficas. Seria como a continuidade de outro projeto também desenvolvido pela CPRM que tem como objetivo um extenso mapeamento geológico dos oceanos Atlântico Sul e Equatorial.

    Além disso, entre os projetos para 2010, no contexto do Remplac e do Proarea, estão estudos de viabilidade econômica, técnica e ambiental dos sítios de grande potencial para mineração.

     

    Kaiser Gonçalves de Souza é geólogo, doutor em geologia marinha pela Universidade de Paris VI e concluiu o pós-doutorado no Instituto de Geociências e Recursos Naturais em Hannover, Alemanha (1993). Atualmente é chefe da Divisão de Geologia Marinha, no Serviço Geológico do Brasil (CPRM).

     

     

    REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

    1. Souza, K. G.; Pereira, C. V.; Rocha Neto, M. B. "Arcabouço legal internacional e o espaço marinho brasileiro". Revista Parcerias Estratégicas, Centro de Gestão e Estudos Estratégicos (CGEE), no.24, pp.41-59. 2007.

    2. Souza, K. G.; Martins, L. R. S.; Cavalcante, V. M. M.; Pereira, C. V.; Borges, L. "Recursos não-vivos da Plataforma Continental Brasileira e áreas oceânicas adjacentes". Gravel (Porto Alegre. CD-Rom), Vol.Março, pp.1-77. 2009.

    3. Martins, L. R. S.; Souza, K. G. "Ocorrências de recursos minerais na plataforma continental brasileira e áreas oceânicas adjacentes". Revista Parcerias Estratégicas, Centro de Gestão e Estudos Estratégicos (CGEE), no 24, pp.137-190. 2007.