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    Ciência e Cultura

    versão impressa ISSN 0009-6725versão On-line ISSN 2317-6660

    Cienc. Cult. v.62 n.4 São Paulo out. 2010

     

     

    ONGs

    Agenda internacional intensifica crescimento de instituições em defesa do meio ambiente no Brasil

     

     

    A explosão no número de organizações não governamentais (ONGs) é um fenômeno mundial que se acentuou a partir da década de 1990. No Brasil, entre os anos de 2002 e 2005, houve um crescimento de 22,6% no número de associações e fundações sem fins lucrativos, que chegou a 338,2 mil em 2005, segundo estudo realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Isoladamente, o grupo de entidades de proteção animal e do meio ambiente teve aumento de 61%, ou seja, um percentual quase três vezes superior à média da expansão nacional de ONGs em geral no mesmo período. "Tivemos um 'surto' de mobilização política e de movimentos ambientalistas no país", constata Rosana Corazza, professora de economia e jornalismo da Faculdades de Campinas (Facamp) e mestre em política científica e tecnológica, pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Tal crescimento parece refletir a crescente preocupação mundial com o tema.

    O cenário internacional começou a se tornar favorável à questão do meio ambiente desde o final da década de 1960 e ao longo da década seguinte. No Brasil, os movimentos da sociedade civil, assim como os grupos ambientalistas só passaram a ganhar força nos anos 1980. As discussões oriundas dos efeitos negativos da energia nuclear, bem como de denúncias sobre os efeitos cumulativos dos agroquímicos no meio ambiente, geraram uma crescente consciência ambiental. "A chamada Revolução Verde, na década de 1960, trouxe um aumento gigantesco da produção e da produtividade agrícolas graças à mecanização, ao uso de agroquímicos e ao avanço técnico-científico na produção de sementes e cultivares", conta Rosana. Dentre as tradicionais ONGs ambientalistas estão a WWF (World Wildlife Fund), uma das mais populares do mundo, criada em 1961, e o Greenpeace, que surgiu dez anos depois e é formada por um dos grupos ativistas ambientais mais combativos mundialmente.

    SOS MATA ATLÂNTICA No aspecto político, o Brasil passou por profunda transformação com a transição do fim do regime militar para a nova democracia, com a presença dos governos civis e o pluralismo partidário, permitindo que os movimentos da sociedade civil saíssem da "ilegalidade", sobretudo após a promulgação da nova Constituição, em 1989. Ainda, com a publicação do Relatório Brundtland (Nosso Futuro Comum), da Comissão Mundial para o Meio Ambiente e Desenvolvimento da Organização das Nações Unidas (ONU), em 1987, foi concebido o conceito de "desenvolvimento sustentável", amplamente divulgado e empregado a partir de então. É nesse contexto que ocorreu a criação da maioria das ONGs ambientais no Brasil. Entre elas, está uma das maiores ONGs ambientais brasileiras, a SOS Mata Atlântica. "O contexto, na década de 1980, era propício, pois havia muita gente envolvida na agenda ambiental e já começava o movimento pela regularização do meio ambiente", afirma Mario Cesar Mantovani, diretor de mobilização dessa ONG.

    Criada em 1986, a SOS Mata Atlântica foi inicialmente formada por jornalistas, cientistas, empresários, e não somente por ambientalistas. "Isso garantiu a pluralidade na forma de organização e na busca de financiamento", conta Mantovani. Eram 360 filiados em 1988, hoje são cerca de 210 mil sócios. A contribuição dos filiados mais do que triplicou a partir do final dos anos 1990 e representou a maior fatia do total de recursos da organização em 2009, 31%, seguida pelos recursos vinculados a projetos (30%) e verbas arrecadadas em eventos e campanhas (28%). Segundo o balanço financeiro da organização, a verba total cresceu quase sete vezes entre os anos de 2000 (R$3,2 milhões) e 2009 (R$21,9 milhões).

    ECO-92: MARCO DO MOVIMENTO A Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente e o Desenvolvimento (CNUMAD), realizada no Rio de Janeiro em 1992, também conhecida como Cúpula da Terra ou Eco-92, foi um importante marco para o movimento ambientalista no Brasil, congregando chefes de Estado e representantes da sociedade civil dentro e fora do país. "Houve uma ampla legitimação social de iniciativas como os movimentos civis ambientalistas e também de inclusão de questões da problemática ambiental nas agendas de decisão pública e privada", explica Rosana. A Eco-92 ampliou a articulação entre as ONGs e fez surgir várias redes temáticas, como, por exemplo, a Rede das Águas e a Rede de ONGs da Mata Atlântica.

     

     

    Mais recentemente chamadas de organizações da sociedade civil, as ONGs são associações do terceiro setor, que se declaram com finalidades públicas e sem fins lucrativos, e que desenvolvem ações em diferentes áreas, geralmente mobilizando a opinião pública e o apoio da população para modificar determinados aspectos da sociedade. "Vejo o papel das ONGs em diversas frentes e uma das principais diz respeito à informação", completa Rosana.

    Mantovani lembra que a coleta de dados referentes ao meio ambiente serve como embasamento para a mobilização pública pela regulamentação do uso e preservação do meio ambiente. Um exemplo de trabalho nesse sentido é o "Atlas dos remanescentes florestais da Mata Atlântica", fruto de um convênio entre a SOS Mata Atlântica e o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). O documento, cuja primeira edição foi publicada em 1990, traz informações sobre a dinâmica das alterações na vegetação nativa da área abrangida pelo estudo. Assim, além das campanhas e programas de mobilização da sociedade, a ONG desenvolve também um importante trabalho técnico: atuar "na tradução das informações técnicas para políticas públicas".

    Rosana aponta, ainda, outro papel fundamental das ONGs ambientais: a fiscalização, de forma a complementar o papel do setor público. "Algo da 'missão' do Estado no controle de atividades geradoras de impacto econômico foi 'assumido' dentro das missões das ONGs ambientalistas", diz. Nesse sentido, há que se considerar as relações de poder entre o terceiro setor e o setor privado, através do chamado "marketing ambiental". A pesquisadora chama a atenção, por outro lado, para a manipulação de dados que podem favorecer agentes econômicos. "Costumo dizer que vivemos na sociedade da informação, mas que isso não significa que vivemos na sociedade do conhecimento", enfatiza. A sociedade civil, organizada e mobilizada, pode, portanto, definir os rumos das políticas ambientais e o futuro do meio ambiente.

    PERFIL DAS ONGS AMBIENTAIS NO BRASIL

    As entidades sem fins lucrativos relacionadas com o meio ambiente e proteção animal somavam 2.562 em 2005, o que representa 0,8% do total de ONGs no país. A distribuição entre as grandes regiões fica concentrada na região Sudeste, com 1.243, seguida da região Sul (614), Nordeste (330), Centro-Oeste (211) e Norte (164). Do total de ONGs ativas em 2005: 16 foram criadas até 1970; 71 surgiram de 1971 a 1980; 260 de 1981 a 1990; 1.059 de 1991 a 2000; 960 de 2001 a 2004; e 196 em 2005.

     

    Ana Paula Morales