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    Ciência e Cultura

    versión impresa ISSN 0009-6725versión On-line ISSN 2317-6660

    Cienc. Cult. v.62 n.spe1 São Paulo  2010

     

    O gerador eletrostático e suas aplicações

     

    OSCAR SALA
    Departamento de Física, Faculdade de Filosofia Ciências e Letras de  São Paulo

     

    A idéia de átomo indivisível perdeu sua significação na ciência quando Sir J. J. Thomson mostrou que em todos os átomos existe um constituinte comum (o elétron), de carga negativa e de massa cêrca de 2000 vêzes menor que o átomo de hidrogênio.

    Alguns anos depois Lord Rutherford investigando o fenômeno de difusão das partículas alfa, emitidas por substâncias radioativas, através de folhas metálicas extremamente delgadas, demonstrou que quasi tôda a massa dos átomos acha-se concentrada numa região de diâmetro cêrca de 10.000 vêzes menor do que os diâmetros atômicos. A essa região central, em torno da qual se distribuem os elétrons, deu o nome de núcleo.

    Sabe-se hoje em dia que o núcleo e constituido por protons e neutrons ligados por uma energia cêrca de um milhão de vêzes maior que a energia de ligação dos elétrons periféricos de um átomo. Em consequência, a estrutura do núcleo so pode ser investigada submetendo-o ao bombardeio de partículas de grande energia cinética  (alguns milhões de elétron-volts*) tais como as emitidas por processos radioativos e as (protons, deuterons, núcleos de He, elétrons, etc.) aceleradas pelas modernas máquinas para a desintegração nuclear.

    Bombardeando as núcleos atômicos com estas partículas de grande energia, pode-se observar como as mesmas são desviadas sob o efeito das fôrças nucleares ou como são absorvidas, aumentando assim a energia do  núcleo, e como êste se liberta dessa enorme energia de excitação.

     

    O acelerador eletrostático.

    Conhecem-se hoje cerca de uma dezena de instrumentos diferentes destinados à aceleração de partículas. Entre esses aceleradores, o que apresenta maiores vantagens, constituindo mesmo o aparelho mais importante para o estudo do núcleo na região de energias ate cerca de 10 milhões de elétron-volts, é o acelerador eletrostático Van de Graaff. Êste aparelho apresenta consideraveis vantagens sobre os demais, merecendo especial menção a grande homogeneidade da energia das partículas aceleradas, a grande intensidade do feixe produzido, urna ausência quasi total de radiação de fundo (que tende sempre a confundir os resultados e introduzir erros nas experiências) e a possibilidade de variar a energia do feixe de partículas de uma maneira contínua. Infelizmente, a energia máxima que pode ser obtida com um acelerador dessa natureza, de dimensões razoaveis, é limitada a cerca de dez milhões de elétron volts.

    O princípio de funcionamento do gerador eletrostático é extremamente simples e foi desenvolvido em 1931 por Van de Graaff (1).

    A máquina consiste essencialmente (fig. 1) de uma esfera metálica ôca suportada convenientemente no alto de uma coluna isolante. Uma correia em movimento, de material também isolante, transporta cargas, de maneira continua, entre a terra e o terminal de alta tensão. A coleção das cargas e feita utilizando-se um pente de ago colocado no interior da esfera metálica oca onde o campo é nulo (**), de maneira que a deposição e coleção das cargas e independente da voltagem no terminal de alta tensão.

     

     

    A deposição de cargas é feita estabelecendo-se uma diferença de potencial de alguns kilovolts entre o pente de carga e a correia de transporte.

    A voltagem máxima que se pode obter e limitada, unicamente, pela qualidade dos isolantes e pelo efeito corona. À medida que a carga e transportada ao terminal de alta tensão, a voltagem aumenta segundo a lei:

    onde i é a corrente total colectada na esfera e C a capacidade da esfera em relação à terra.

    O gerador opera numa voltagem de equilíbrio em que a corrente transferida pela correia e igual à corrente de carga; essa voltagem de equilíbrio pode ser variada controlando-se ou a corrente transferida pela correia ou a de carga externa.

    Devido principalmente ao efeito corona, as dimensões de um gerador dessa natureza para tensões elevadas (2 ou 3 milhões de volts) seriam enormes. A experiência mostra, no entanto, que se pode diminuir o efeito corona construindo-se o equipamento no interior de um tanque cheio de ar, sob pressão elevada.

    Herb e seus colaboradores (2) (em Wisconsin) construiram um aparelho dessa natureza trabalhando sob pressão de 7 atmosferas. Mostraram, também, que potenciais mais elevados podiam ser obtidos introduzindo na câmara de pressão uma pequena porcentagem de freon (C Cl2 F2). Contribue, ainda, para a diminuição do efeito corona, assim como das correntes de perda nos isolantes, a uniformidade do campo no espaço ocupado pelas partes componentes do gerador — suportes isolantes, correia para transporte de cargas e tubos aceleradores; para se conseguir essa uniformidade é utilidade uma série de aneis metálicos (hoops) isolados entre si e dispostos segundo a maneira indicada na fig. 2.  Outro  melhoramento  adicional foi conseguido pelo emprêgo de três esferas concêntricas em lugar de uma única na alta tensão.

     

     

    Com êstes aperfeiçoamentos, Herb e seus colaboradores obtiveram, com uma maquina de dimensões modestas, 4.5 milhões de volts, tensão máxima ate hoje atingida com equipamentos dessa natureza.

    O acelerador eletrostático em construção no Departamento de Física da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da Universidade de São Paulo e também do tipo de alta pressão e horizontal, como o de Wisconsin (3) (fig. 3); êsse aparelho permitirá atingir uma tensão máxima de cerca de 4 milhões de volts. Alguns melhoramentos serão introduzidos neste acelerador de maneira a se obter melhor regulação de voltagem bem como correntes mais intensas no feixe e maior homogeneidade na energia das partículas do feixe, possibilitando assim extender consideravelmente o campo de investigação com aparelhos dessa natureza.

     

     

    A Importância  dos Aceleradores Eletrostáticos

    Os aceleradores eletrostáticos ocupam posição única nas experiências em que são requeridas medidas de alta precisão. Sua importância na física nuclear pode ser melhor apreciada pelo enorme interêsse de alguns trabalhos já realizados com o auxilio de aceleradores dessa natureza e pelo grande número dêstes instrumentos ora em construção nos mais avançados centros de pesquisas.

    Como primeiro exemplo, citaremos os trabalhos de Tuve, Hafstad, Heydenburg (4) e Herb, Kerst, Parkinson e Plain (5) sobre a difusão de protons por protons. Devido a precisão com que puderam ser feitas estas medidas (incidentalmente são até hoje os trabalhos mais precisos neste assunto) pode-se mostrar que o desvio experimental da conhecida formula de Mott para difusão de partículas carregadas, pode ser explicada como devido a uma fôrça atrativa de curto alcance ( ~ 10–13cm) que se superpõe à fôrça repulsiva coulomb na qual a fórmula de Mott é baseada.

    Estas experiências constituem a primeira prova convincente da existência de fôrças atrativas de curto alcance responsaveis pela ligação dos neutrons e protons para a formação do núcleo.

    Trabalhos recentes sobre o fenômeno da ressonância, feitos na Universidade de Wisconsin por Schoemaker e Bender (6), mostram, pela primeira vez, o efeito de interferência entre os protons difundidos pelo potencial nuclear e os protons difundidos pela ação de um nível de ressonância nuclear no alumínio em 985 Kev.

    Utilizando um feixe de protons extremamente homogêneo, Herb, Snowdon e Sala (7) puderam determinar com precisão as energias do limiar de certas reações nucleares e de certos níveis agudos de ressonância.

    Dada a elevada precisão dessas determinações,  servem  elas  de padrão  de  referência para calibração de outros aceleradores. Esta calibração é de grande importância pois a determinação de certas relações fundamentais, como a diferença de massa entre o neutron e o proton, dependem criticamente da precisão com que se conhecem as energias das partículas envolvidas.

    O acelerador eletrostático é ainda de importância única onde são necessárias fontes intensas de neutrons monocromáticos e de energia controlavel.

    Adair, Barschall, Bockelman e Sala (8), utilizando o acelerador eletrostático de Wisconsin para produção de neutrons, estudaram a variação das secções de choque dos neutrons em vários elementos variando a energia dêsses neutrons de 30 Kev a 1 Mev.

    Êstes estudos fornecem informações sobre a distribuição dos níveis de energia nos núcleos, contribuindo assim com enorme e preciso material experimental para uma teoria estatística do núcleo  atômico.

    Um aparelho dessa natureza pode ainda ser utilizado para a produção de isótopos radioativos cujo interêsse é enorme tanto em pesquisas na física nuclear como nas varias aplicações em biologia, agricultura, metalurgia, etc.

     

    BIBLIOGRAFIA

    1. R.  J.  VAN  DE  GRAAFF —  Phys.  Rev.  38, 1919 (1931).

    2.  R.  G.  HERB,  C.  TURNER,  C.  HUDSON  e R. WARREN — Phys. Rev. 53, 579 (1940).

    3. O. SALA e R. G. HERB — Boletim da «American Physical Society - Madison Meeting - Nº 4 Vol. 23.

    4. TUVE, HEYDENBERG e HAFSTAD — Phys. Rev.  50, 807 (1936).

    5. HERB,  KERST,  PARKINSON  e  PLAIN — Phys. Rev. 55, 998  (1939).

    6. Em  impressão  na  Phys.  Rev. (1949).

    7. Phys.  Rev., 75, 246 (1949).

    8. Em impressão na Phys. Rev.  (1949)  e ANL — 4175.

     

     

    (*) O elétron-volt é uma unidade introduzida para a medida de energia; é precisamente a energia adquirida por um elétron acelerado por uma diferença de potencial de 1 volt. Para termos uma noção da ordem de grandeza dessa unidade basta lembrarmos que a energia libertada nas reações químicas é da ordem  de alguns  elétrons volts.
    (**) Em virtude de um conhecido teorema de eletrostática, a carga depositada no pente escôa para a superficie externa da esfera e o campo no interior e nulo.