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    Ciência e Cultura

    versão impressa ISSN 0009-6725

    Cienc. Cult. vol.64 no.1 São Paulo jan. 2012

    http://dx.doi.org/10.21800/S0009-67252012000100004 

    BRASIL
    MINERAÇÃO

     

    Terras-raras: uma oportunidade imperdível?

     

     

    Bruno Buys

     

     

    Em uma recente e inesperada mudança de política externa, a China - que detém um quase monopólio sobre os metais conhecidos como "terras-raras" - começou a reduzir cotas de exportação destas matérias-primas, impactando assim diversas cadeias produtivas. Essa redução fez com que os preços disparassem, causando reações em diversos países, principalmente nos desenvolvidos, dependentes dessa matéria-prima usada na produção de bens de alta tecnologia. O Brasil, que já foi líder na produção de terras-raras, no passado, prepara-se para reabrir o negócio. O aumento de preços desses metais deflagrou uma movimentação em torno da "nova" oportunidade.

    Os minérios mais explorados comercialmente de terras-raras são a monazita, a bastnasita - ambos respondem por aproximadamente 90% da produção - e a xenotima. Graças às suas características químicas inerentes, esses minérios dão excelentes ímãs, portanto são peças-chave em diversas cadeias produtivas, como a indústria eletroeletrônica. Outras aplicações são em produtos de alta tecnologia, como diodos emissores de luz (LED's, sigla em inglês), catalisadores para produção de gasolina, turbinas de vento, motores elétricos, entre outros. A explosão de mobilidade em dispositivos de informática e telecomunicações e, mais ainda, a indústria de motores elétricos promete alçar os terras raras a condições de crescente importância na economia e indústria. Porém, ainda assim, é considerada uma atividade "de nicho": como comparação, tem-se que o mercado mundial anual de terras-raras gire em torno de US$ 5 bilhões; em contrapartida, negócio anunciado em agosto de 2011, a Google anunciou a compra da divisão de mobilidade da Motorola por US$ 12,5 bilhões.

    No começo do século passado, o Brasil chegou a ser o principal produtor mundial, explorando as areias monazíticas, que ocorrem nos litorais do Rio de Janeiro até o sul da Bahia, e são ricas em terras-raras, principalmente o cério, o lantânio e o ítrio. De acordo com Francisco Lapido Loureiro, pesquisador do Centro de Tecnologia Mineral (Cetem), nos anos 1960 os Estados Unidos passaram a ser o maior produtor mundial, para serem ultrapassados pela Austrália na década seguinte. Nos anos 1980 a China tomou a dianteira, com pesados investimentos no setor, e a produção a partir da mina de Bayan Obo, na Mongólia.

    Com a chegada do fornecimento chinês, tornou-se mais barato importar da China. Além disso, a cadeia de produção dos terras-raras exige técnicas para separação dos metais a partir dos minerais, que envolvem reagentes químicos com alto impacto ambiental. No entanto, a China priorizou o desenvolvimento industrial e econômico, investiu nessa cadeia produtiva, o que resultou, em um semi-monopólio sobre os terras-raras. Agora, são três as preocupações aliadas às restrições à exportação de terras-raras na China: o aumento de padrões internacionais de proteção ambiental, o crescente consumo desses minérios, estratégicos para a crescente indústria de alta tecnologia, e a mineração clandestina, o que tem resultado em altos preços.

     

    CENÁRIO INTERNACIONAL DE RETOMADA

    A mina norte-americana de Mountain Pass, na Califórnia, desativada em 2002, e gerida pela empresa Molycorp Minerals, está em preparação para a retomada de atividades. A empresa avalia que em 2012 concluirá sua expansão e modernização das instalações, com produção estimada em 18 mil toneladas de minério por ano.

    Na Austrália, outro país detentor de reservas de terras-raras, a mina de Mount Weld, de propriedade da Lynas Corporation, começou a operar após receber as licenças de operação e ambientais do governo. Em maio último foram iniciadas as primeiras atividades de extração e concentração de terras-raras.

    Enquanto isso, no Brasil, a Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial (ABDI) e a Confederação Nacional da Indústria (CNI) encomendaram um estudo para implantação de capacidade de produção de ímãs de alta potência - uma das aplicações dos terras-raras - à Fundação Centros de Referência em Tecnologias Inovadoras (Fundação Certi), com a participação do Instituto Fraunhofer, do Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT) e do Cetem, instituto de pesquisa vinculado ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação, e à Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC).

    Segundo Carlos Alberto Schneider, da Fundação Certi, o desenvolvimento de capacidade de produção desses ímãs, a partir dos terras-raras nacionais, ocorre em meio a uma corrida para acesso a esses minerais. "Nós, na Fundação Certi, fomos procurados diversas vezes por empresas brasileiras que buscavam uma solução para o problema da falta de minerais, com a redução das exportações chinesas". Schneider relata que o estudo conduzido pela fundação verificou em detalhes a capacidade de o Brasil ser um fornecedor de terras-raras. O processo de produção foi estudado em suas etapas: a mineração, concentração, separação dos terras-raras (pode ocorrer mais de um tipo no mesmo minério) e posterior redução (a forma que ocorre na natureza é como óxido e a redução dos óxidos os converte na forma metálica).

    Já Fernando José Gomes Landgraf, diretor de inovação do IPT, afirma que "a grande oportunidade na questão dos terras-raras é na cadeia de produção de motores elétricos. Empresas brasileiras como a WEG, a Embraco, que já têm atuação na área de motores elétricos, poderiam se beneficiar fortemente de uma nacionalização dessa etapa. Por isso o estudo conduzido pela Fundação Certi é oportuno, dada a ênfase na produção de super-ímãs".

    Se durante os anos 1990 o Brasil cessou totalmente sua produção de terras-raras por conta dos baixos preços do produto chinês, o atual momento coloca as seguintes perguntas: vai haver continuidade no investimento em pesquisa, desenvolvimento e produção em larga escala, se o preço dos produtos importados voltar a cair? Com o retorno dos Estados Unidos e da Austrália à produção, é possível - de fato, é provável - que o produto seja oferecido novamente no mercado? Qual será o ambiente regulatório e fiscal promovido pelo governo para a exploração de terras-raras? Se o preço do produto internacional cair, o que acontece com os produtores?

    No que depender de um cálculo estritamente numérico, os preços baixos de importação podem novamente inviabilizar a indústria brasileira. Mas se o setor for considerado estratégico, e resultados forem buscados em longo prazo, é possível que o país domine uma cadeia produtiva que, embora seja um nicho específico, tem tido importância e valor agregado crescentes, em um mundo altamente tecnológico.