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Ciência e Cultura
versão impressa ISSN 0009-6725
Cienc. Cult. vol.65 no.1 São Paulo jan. 2013
http://dx.doi.org/10.21800/S0009-67252013000100004
Agricultura familiar
Faltam incentivos para que a biotecnologia germine no campo
A agricultura familiar é responsável por mais de 70% dos alimentos consumidos pela população brasileira. No entanto, apesar de representar 84,4% dos estabelecimentos agropecuários do país, segundo os dados mais atuais (Censo Agropecuário de 2006 veja box), apenas os grandes latifundiários têm o capital necessário para o investimento em produtos biotecnológicos de ponta. Dessa forma, "ao passo que as grandes propriedades possuem cada vez mais subsídios do governo para o cultivo das principais commodities como a cana-de-açúcar e a soja , a agricultura familiar passa por dificuldades de ordem tanto técnica quanto política e econômica", destaca o engenheiro agrônomo Piero Oliveira da Embrapa Meio Ambiente.
Muitos dos esforços feitos para estimular o avanço da agricultura no Brasil têm secundarizado a posição do chamado "pequeno agricultor" e valorizado o setor de biotecnologia, sobretudo a entrada de produtos em uma rede de importantes parceiros comerciais e mercados competitivos. Neste cenário, o pequeno agricultor não só encontra dificuldade para pagar produtos protegidos por patentes (sementes e insumos agrícolas, por exemplo), como também vê encarecidos seus custos e diminuídas suas margens de lucro.
BIOTECNOLOGIA NO CAMPO São tantos os entraves de ordem político-econômica para a liberação e popularização de produtos da engenharia genética atualmente, são 53 as variedades de organismos geneticamente modificados (OGMs) liberados pela Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio) que há quem defenda mudança de nomenclatura da área. "A área poderia ser renomeada de bioeconomia, afinal a prioridade agora é desenvolver produtos com aplicabilidade comercial e estabelecer parcerias prévias com indústrias. Só assim é possível gerar negócio", enfatiza Maria Sueli Soares Felipe, docente do curso de ciências genômicas e biotecnologia da Universidade Católica de Brasília (UCB).
Trazendo à baila o agricultor familiar, o contrassenso da situação é de uma complexidade alarmante. Muito da sua incoerência se deve à falta de estímulo governamental destinado ao trabalhador rural de pequena produção. O reflexo de tal limitação se reflete não só no círculo desse trabalhador, como em toda a comunidade que desfruta do produto cultivado por ele. Embora os profissionais de biotecnologia desenvolvam com maestria genes tolerantes à seca e a outros agravantes, a propriedade intelectual e o controle corporativo dificultam que os benefícios científicos e tecnológicos cheguem àqueles que não são latifundiários.
Políticas públicas estruturadas com o uso da engenharia genética têm crescido e obtido entusiasmo por uma parcela dos produtores um exemplo é o recente Projeto Algodão de Minas Gerais, que tem o apoio da Secretaria do Estado de Agricultura para o fortalecimento do cultivo sustentável do algodão no norte de Minas Gerais. Apesar de movimentos sociais lutarem contra a utilização de transgênicos, estes já vêm tomando parte do mercado e, especificamente no que concerne a agricultura familiar, já atingiu a produção de milho e quase que inteiramente a de soja.
INCENTIVOS A CAMINHO Um prospecto menos alarmante para o agronegócio familiar está se delineando aos poucos. Em novembro de 2012, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) firmou um acordo com a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), objetivando destinar R$ 23 milhões para a criação de um programa de incentivo à agricultura familiar. Um mês depois, por sua vez, foi aprovado o Regulamento do Fundo de Agricultura Familiar do Mercosul (FAF), que financiará projetos de estímulos ao setor com isso, o Brasil aportará US$225 mil anuais com políticas públicas para a agricultura familiar. Ainda nessa rota, a Organização das Nações Unidas (ONU) declarou que 2014 será o Ano Internacional da Agricultura Familiar.
O panorama competitivo da economia rural também intenciona beneficiar o setor ao instituir o Sistema Nacional de Certificação da Produção da Agricultura Familiar. Aprovado pela Comissão de Desenvolvimento Econômico, Indústria e Comércio, o Projeto de Lei 52/11 do deputado Assis do Couto (PT-PR) propõe que os produtos dos agricultores familiares sejam identificados por selos, potencializando as chances de um tratamento mais adequado em relação ao crédito rural, aumentado a demanda e a qualidade de seus produtos. Com a certificação, o trabalhador também poderá ter acesso privilegiado a recursos do crédito rural financiamento para ajudar no custeio da produção e comercialização de itens agropecuários e outros programas governamentais.
Apesar de tais ações no setor, a agricultura familiar segue marginalizada. Para a mudança deste quadro, enfatiza Oliveira, "é imprescindível reiterar a necessidade de um maior entendimento social e político sobre a falta de estrutura disponível para os chamados "pequenos produtores" de nosso país, buscando apoiar o cultivo de alimentos que garantam a segurança alimentar da população".
Lídia Rogatto