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    Ciência e Cultura

    Print version ISSN 0009-6725

    Cienc. Cult. vol.65 no.1 São Paulo Jan. 2013

    http://dx.doi.org/10.21800/S0009-67252013000100026 

     

    RÉGIS BONVICINO

     

    HONG KONG

    É a eternidade e a sinceridade
    na traseira de um ônibus
    É o terraço do antigo edifício do Bank of China
    à noite

    É uma cortina de fog
    É o novo Bank of China
    acima da linha das luzes, pontiagudo
    É um míssil de Beijing

    É o monge taoísta a caráter pisando firme
    no tapete vermelho do Regency Hyatt
    É a água de uma cachoeira caindo na linha do trem
    da janela do quarto

    a China liquidando Hong Kong
    É um mendigo que se automutila e vai à caça de seu income
    É um garoto mordendo um cigarro pela manhã
    É uma gravata pendurada num cabide

    inspired by Italy
    É Jobim e Astrud Gilberto num alto-falante
    de Lamma Island
    É um prato de vagem com carne moída

    É uma droga que emagrece macacos obesos
    É o design vanguardista da garrafa do Jasmine tea
    Cai o prédio velho do mercado da Tung Choi
    Street, espinafre d'água

    É um chinês desdentado numa aquarela
    É a careca do poeta Yu Jian produzindo energia
    limpa e renovável
    no saguão de um hotel
    É um ataque de budas de neon

    É uma dançarina exagerada de tango
    É um túmulo com terraço e vista para o mar
    É um papagaio da Amazônia num poleiro de ouro
    Uma flûte de champanhe Perrier-Jouët

    É Tin Chan Temple
    um buda gigante
    geladeira de Coca-colas no abdôme
    É "Delay no more"

    adesivos em Ladies Market
    Diu lay lo mo, fuck your mother
    É um audi com vidros fumados
    É Hermès

    A lua cheia, pela metade
    É uma nuvem sobre o mar
    uma pantera
    O sol mais tarde

     

    TATUAGEM

    Flávia, salve-se deste mundo
    com uma tatuagem
    eis algumas possibilidades:

    Olhos, cílios e rímel de Cleópatra

    Uma ave imóvel num relógio

    O sexto dedo do panda

    Uma frase:
    a flor de plástico morre duas vezes,
    árvores antes que seja tarde

    Um morcego assassino da espécie nureon

    O sol escuro de solaria

    Mosca negra, de tórax robusto, antenas agudas

    Qualquer cabeça num capuz

    Um velho se masturbando
    diante de um túmulo

    Um boxeador de músculos flácidos

    Um índio da tribo Akuntsu

     

    Régis Bonvicino nasceu na cidade de São Paulo, em 1955. Formou-se em direito pela USP, em 1978. Estreou na imprensa, já como escritor, em 1975, no Jornal do Arena. Trabalhou como articulista do Jornal da Tarde, da revista Isto é, e da Folha de S. Paulo até 1989, entre outros empregos. Fundou, em 2001, e codirige, ao lado de Charles Bernstein, a revista Sibila, que, em 2007, tornou-se exclusivamente eletrônica : <http://www.sibila.com.br>. Seus poemas estão traduzidos para inglês, espanhol, francês, chinês, catalão, finlandês, dinamarquês e outras línguas. Boa parte deles se encontra reunida no volume Até Agora (SP, Imprensa Oficial, 2010). Os poemas aqui apresentados são inéditos e fazem parte de seu próximo livro, ainda sem título.