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    Ciência e Cultura

    versión On-line ISSN 2317-6660

    Cienc. Cult. vol.65 no.4 São Paulo  2013

    http://dx.doi.org/10.21800/S0009-67252013000400004 

     

    A vida de pesquisadores brasileiros fora do país

     

    O desejo de ampliar horizontes e trabalhar em laboratórios de ponta em outro país são alguns dos motivos que, em 2012, levaram 11,5 mil pesquisadores a deixarem o Brasil, rumo a universidades estrangeiras, segundo a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes). O programa Ciência sem Fronteiras, por sua vez, enviou quase seis mil bolsistas para realizar estudos no exterior desde dezembro de 2011.

    Esforço, organização e flexibilidade são elementos indispensáveis para aqueles pesquisadores brasileiros que optaram por viver definitivamente ou passar longos períodos no exterior.

    A economista Ionara Costa ilustra o que pode ser considerado uma trajetória bem-sucedida no exterior. Mestre e doutora em política científica e tecnológica pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Ionara mora e trabalha na Europa desde 2004.

    Atualmente, ela está desenvolvendo uma pesquisa sobre o fluxo de conhecimento nas subsidiárias de multinacionais latino-americanas, com financiamento do programa Marie Curie Fellow da Research Executive Agency, da Comissão Europeia. O estudo é feito no Centre of Research in Innovation Management (Centrim), ligado à Universidade de Brighton, na Inglaterra.

     

     

    Ionara mora na fronteira entre Bélgica e Holanda desde 2004, quando foi contratada como pesquisadora pelo Instituto da Universidade das Nações Unidas de Pesquisa Econômica e Social em Inovação e Tecnologia (UNU-Merit), em Maastricht, na Holanda, onde trabalhou até 2008. Na época, ela já havia concluído o doutorado e estava tentando, sem sucesso, concursos em universidades públicas brasileiras, quando ficou sabendo da seleção no UNU-Merit. "Eu me candidatei em março e no mês seguinte me chamaram para a seleção", conta.

    A bem sucedida trajetória de Ionara envolveu, no entanto, uma série de desafios comuns a qualquer pesquisador brasileiro que decida viver no exterior: da barreira da língua à competitividade do ambiente de trabalho, passando pela adaptação à cultura de um país entrangeiro.

    BARREIRA DA LÍNGUA O domínio da língua é um fator essencial para a integração e o bom desenvolvimento da pesquisa, opina André Luiz Sica de Campos, que fez o doutorado no Science and Technology Policy Research (Spru), da Universidade de Sussex, Reino Unido, com bolsa do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). "Eu já tinha um bom domínio do inglês, mas a fluência só vem com o passar dos anos", diz o economista, que atualmente é professor de economia e gestão da Faculdade de Ciências Aplicadas da Unicamp, em Limeira, São Paulo e Faculty Fellow da Brighton Business School, da Universidade de Brighton, Inglaterra.

    Para Ionara, a dificuldade de se comunicar em inglês gera um acanhamento entre os brasileiros no exterior. "No Brasil, somos pouco expostos ao inglês, tudo é traduzido". Esse comportamento tende a nos colocar em desvantagem em ambientes acadêmicos altamente competitivos e intensamente internacionalizados. "Os indianos são muito agressivos e competitivos. Já os chineses não falam tão bem o inglês, mas acreditam que se expressam bem e não são tímidos", relata a pesquisadora.

    BARREIRAS CULTURAIS As diferenças culturais também pesam, pondera Katlin Brauer Massirer, que fez doutorado em genética, biologia celular e molecular e bioinformática, na Universidade da Califórnia, em San Diego, Estados Unidos. "A estrutura é excelente em termos de orientação e apoio em questões práticas, como conseguir uma carteira de motorista ou declarar imposto de renda. Mas no Brasil o ambiente é mais caloroso, a ajuda também é emocional", diz.

    O ritmo de trabalho costuma ser diferente do que os brasileiros estão acostumados, o que pode gerar frustração. "É tudo muito prático. Os professores recebem bem, mas uma vez que você entra num grupo, tem que se virar. Não é como aqui, que tem alguém que pega na sua mão e mostra como fazer o experimento", conta Katlin. "A postura é: os materiais estão aqui, os reagentes são esses.

    Leia os artigos e faça", continua a pesquisadora que retornou ao Brasil em janeiro de 2012. Em um ambiente com pesquisadores de várias partes do mundo querendo ser os melhores, a concorrência é intensa. "Soma-se a isso a pressão, cada vez maior, para publicar artigos, sempre em revistas científicas com alto grau de impacto", relembra Ionana.

    VANTAGENS Os desafios e dificuldades são compensados pelos inegáveis ganhos no campo profissional, propiciados por um ambiente altamente profissionalizado. Katlin conta que, no primeiro ano de doutorado, todos os alunos passam seis semanas em laboratórios diferentes, com objetivo de conhecer a universidade. "É um sistema menos engessado do que o do Brasil, onde o doutorando, em geral, tem de ingressar no programa com o tema de pesquisa já definido".

    A rede de relacionamento que se estabelece nesses centros de pesquisa também é decisiva para a carreira do pesquisador. Isso pode fazer a diferença em situações delicadas como quando o período da bolsa termina, mas o pesquisador precisa permanecer no exterior para concluir seu trabalho. Foi o que aconteceu com André Campos: a bolsa terminou e ele negociou com o CNPq sua permanência no Reino Unido para finalizar a pesquisa. Mas teve que encontrar trabalho para se sustentar. "Consegui ingressar num projeto na Universidade de Londres e dividia a semana entre o doutorado e o trabalho", conta ele.

    VOLTANDO PARA CASA Para esses pesquisadores nômades a volta para casa pode significar um recomeço em todos os sentidos. Foi o que ocorreu com Katlin que, em virtude da legislação brasileira, não pode trazer consigo reagentes, animais transgênicos e vetores que desenvolveu durante os anos de pesquisa nos Estados Unidos. Arcando com os custos do transporte , ela trouxe só uma pequena parte do que produziu fora do país. Com eles ela está produzindo, novamente, no Centro de Biologia Molecular e Engenharia Genética (CBMEG), na Unicamp, onde trabalha atualmente, os materiais que necessita para suas pesquisas.

     

    Maria Marta Avancini