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    Ciência e Cultura

    On-line version ISSN 2317-6660

    Cienc. Cult. vol.66 no.1 São Paulo  2014

    http://dx.doi.org/10.21800/S0009-67252014000100010 

     

    APRESENTAÇÃO

    Por trás do microscópio

    Maria de Fátima Leite

     

     

    Muito se fala sobre as pesquisas que vêm sendo desenvolvidas na área da saúde por diversos centros e universidades em todo o mundo. Quando o tema é câncer as expectativas são enormes sobre o que há de novo em termos de tratamento, em como aumentar a qualidade de vida dos pacientes, e a pergunta que automaticamente surge é: encontraram a cura? Desde a década de 1990 os avanços tecnológicos em termos de recursos diagnósticos, abordagens cirúrgicas menos agressivas, associações quimioterápicas com vistas à redução de efeitos colaterais e toxicidade, assim como equipamentos de radioterapia mais eficientes contribuíram para o sucesso no tratamento da maioria dos tumores e, consequentemente, aumentando a sobrevida global.

    No Brasil, alguns centros de tratamento contam com algumas dessas tecnologias, como o PET-CT, equipamento que permite a identificação de tumores em órgãos, através de radiofármacos (imagem funcional), associado a um equipamento de tomografia computadorizada (imagem anatômica), bem como equipamentos de radioterapia por intensidade modulada de feixe, otimizando a entrega de radiação no volume tumoral, enquanto permite a redução de doses em tecidos normais. Além disso, institutos e universidades brasileiras estão desenvolvendo pesquisas sobre o câncer, com as mais variadas abordagens. O Ministério da Saúde possui programas de vigilância em saúde como o programa de vigilância de fatores de risco e proteção para doenças crônicas por inquérito telefônico (Vigitel), cujo foco principal é a identificação e monitoramento das principais doenças crônicas nas regiões brasileiras, o que permite a criação de políticas públicas que permitam o desenvolvimento de planos de enfrentamento de doenças. Uma dessas ações para o enfrentamento do câncer ginecológico é baseada em um estudo que descreve as tendências de cobertura dos exames preventivos de câncer de colo e útero e mamografia nas capitais brasileiras.

    Por ser uma doença de etiologia multivariada, com comportamento complexo, o câncer demanda vários estudos para a melhor compreensão dos mecanismos envolvidos na sua progressão, dentre eles, a produção de radicais livres. A inter-relação do estresse oxidativo com a epigenética também é de grande interesse, já que ambos encontram-se intimamente conectados com processos de progressão tumoral e já se sabe que inúmeras vias de sinalizações intracelulares ligadas ao câncer são reguladas por essas espécies reativas, mas ainda pouco se sabe como evitar os danos causados pelo seu excesso. A investigação do comportamento da célula tumoral constitui um dos principais pilares para o entendimento de como a doença evolui. A sinalização celular em câncer permite conhecer melhor como alterações em determinados genes promovem sua proliferação descontrolada, sua resistência a mecanismos de morte celular e como alguns tumores, com capacidade metastática, invadem outros sítios. As principais universidades brasileiras e o Instituto Nacional do Câncer têm várias linhas de pesquisa em biologia celular e molecular, voltadas para o melhor entendimento do comportamento da célula tumoral que, em última análise, melhora o direcionamento do tratamento e, em especial, a sinalização celular em câncer colorretal.

     

     

    A busca por novos potenciais alvos terapêuticos avança no Brasil abrangendo vários segmentos. A biodiversidade brasileira permite a prospecção de compostos de origem vegetal, bem como peptídeos extraídos de venenos de animais peçonhentos. Outra corrente trabalha com associação da radioterapia com a terapia gênica envolvendo sinalização intranuclear do íon cálcio e ainda a nanomedicina avança a passos largos para melhorar a quimioterapia.

    A escolha do tratamento ideal para um tipo de câncer geralmente se baseia em ensaios clínicos com uma grande população de pacientes, os quais apontam o melhor esquema terapêutico a ser utilizado. No Brasil, vários clinical trials estão em curso, envolvendo universidades e centros de oncologia, públicos e/ou privados. A pesquisa clínica vem se fortalecendo nos últimos anos e está em grande ascensão e é neste cenário que a qualidade destas pesquisas, em andamento, deve garantir os preceitos regulamentados pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), bem como princípios éticos universais. Estudos como a análise crítica da qualidade dos centros de estudos clínicos de Belo Horizonte, incentivam outros da mesma natureza e podem permitir o interesse de patrocinadores e investidores em pesquisa, atraindo novos estudos e formando polos de investigação clínica de excelência no país.

    As pesquisas, no Brasil, contam com apoio financeiro de agências de fomento em nível estadual, as chamadas FAPs, fundações de amparo à pesquisa e em nível nacional, como o Conselho Nacional de Pesquisa e Desenvolvimento Tecnológico (CNPq), Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) e, em nível internacional, recebem o apoio de agências como Fogarty/NIH e Howard Hughes Medical Institute (EUA). Além disso, bolsas de estudo, fornecidas por estas agências e, também, pela Capes, mantêm vários estudantes de mestrado e doutorado trabalhando em pesquisa com câncer. Há vários diretórios de pesquisa em todo o território nacional, cadastrados no CNPq, atuando em diversos segmentos como radioterapia, oncologia clínica, oncogenética, câncer da cavidade oral, cuidados paliativos, oncologia pediátrica, leucemias, cânceres ginecológicos, câncer masculino, terapia celular no câncer, terapia fotodinâmica e biofármacos em células animais, entre tantos outros.

    Por trás do microscópio, há o esforço conjunto de estudantes, pesquisadores, agências de fomento, pacientes voluntários e instituições, cujo objetivo comum é responder à pergunta: "Encontraram a cura?". Apesar da resposta ainda não poder ser um completo sim, pelo menos os resultados desses esforços sinalizam para que esse objetivo seja alcançado em breve. Este Núcleo Temático apresenta aos leitores um recorte de algumas pesquisas, bem como revisões sistemáticas na área que vêm sendo desenvolvidas por grupos de pesquisas brasileiros e que, certamente, contribuirão para um maior entendimento sobre o câncer.

     

    Maria de Fátima Leite é farmacêutica pela Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP), doutora pela University of Chicago e Escola Paulista de Medicina e pós-doutora pela Yale Univesity School of Medicine. É professora associada do Departamento de Fisiologia e Biofísica da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Coordena o Laboratório de Sinalização de Cálcio. Membro da Howard Hughes Medical Institute Fellow (2007-2011) e atualmente pesquisadora 1C do CNPq. Desenvolve vários projetos visando novos alvos terapêuticos para tratamento de câncer.