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    Ciência e Cultura

    versión On-line ISSN 2317-6660

    Cienc. Cult. vol.67 no.1 São Paulo enero/mar. 2015

    http://dx.doi.org/10.21800/2317-66602015000100018 

    CULTURA

     

    Kandinsky no Brasil: exposição viaja pela vida e obra do pai do abstracionismo

     

     

    "Para um homem russo, a arte era um luxo inadmissível". Apesar de ter escrito isso em sua autobiografia, Wassily Kandinsky tornou-se um dos pintores mais influentes do século XX e é considerado hoje o pioneiro do abstracionismo, além de um dos maiores teóricos das vanguardas artísticas do começo do século. E algumas de suas maiores obras estarão presentes na exposição Kandinsky: tudo começa num ponto, que chegou ao Brasil em novembro e vai passar por quatro capitais ao longo de 2015. A exposição faz uma viagem pela vida do pintor russo, mostrando não apenas suas obras, mas também influências marcantes em sua trajetória artística, como sua relação com outros pintores, com a música, com a espiritualidade e com a cultura popular. São mais de 150 peças, que incluem quadros de todas as fases do pintor, coleções de objetos de cerâmica, xilogravuras e litografias, símbolos religiosos, instrumentos e tambores usados em rituais de xamanismo, além de trabalhos de outros artistas que influenciaram Kandinsky. "A maior parte da mostra apresentada ao público brasileiro é dedicada justamente aos pormenores que explicam e completam o nos-so conhecimento sobre Kandinsky", aponta Evgenia Petrova, diretora do Museu Estatal Russo de São Petersburgo e curadora da exposição.

    A biografia do artista orientou a disposição das obras, além de artigos e catálogos das exposições organizadas durante a vida do pintor para melhor compreendê-lo. "A nosso ver, o contexto em meio ao qual Kandinsky se formava como artista plástico é um fator muito importante", explica a curadora.

    Montagem única, Múltiplas visões Dessa forma, o Brasil receberá uma montagem única, com obras que vieram, principalmente, da coleção do Museu Estatal Russo, mas também de empréstimos feitos de outros sete museus russos e de coleções particulares da Alemanha, Áustria, Inglaterra e França. Para apresentar tantas peças, a exposição foi organizada em cinco blocos, identificados por temas: a relação com a cultura popular e o folclore russo; o universo espiritual do xamanismo no norte da Rússia; as experiências na Alemanha; o diálogo entre música e pintura e outros pintores contemporâneos de Kandinsky. Os blocos pretendem ajudar os visitantes a conhecer não só as principais obras do pintor russo, mas também suas influências e o relacionamento com outros artistas. O público também poderá conhecer um espaço interativo que permite que se faça uma imersão em um dos quadros de Kandinsky. Com óculos de realidade aumentada, é possível ver o quadro se desmembrando de acordo com o movimento do visitante.

    Viagem de descobertas Antes de se tornar um dos pioneiros do abstracionismo, Kandinsky especializou-se em direito trabalhista, atuando na área e chegando a ser professor na Faculdade de Direito de Moscou. No entanto, uma excursão científica mudou o rumo de sua vida. Enviado como jurista e etnográfico para Vologda, no extremo noroeste da Rússia, o artista teve contato com as tribos nórdicas primitivas e com o xamanismo. Os trajes, as práticas místicas, os contos populares e as canções folclóricas acabaram exercendo uma grande influência nas obras do pintor. Voltando da expedição, Kandinsky passou a se envolver cada vez mais com a pintura. "No início, sua pintura era baseada em paisagens e apresentava um estilo naïf e popular", explica Christiane Wagner, professora do Instituto de Artes da Unicamp. Porém, a excursão científica foi apenas uma entre as muitas viagens que o pintor fez pelo mundo e que permitiram seu contato com outros artistas e outras formas de expressão. Além disso, sua própria reflexão sobre a arte fez com que o abstracionismo se tornasse cada vez mais forte em suas obras. "Kandinsky sempre pensou sobre os meios e objetivos ao realizar sua pintura. Portanto, no início, sua pintura surgia da representação mínima em traços e formas das paisagens e do folclore eslavo. Depois, caracterizou-se pelo limite da proporção formal e equilíbrio com as cores, passando a se compor de signos representando a natureza por meio de simples elementos formais", diz.

    Abstracionismo O artista desenvolve seus primeiros estudos não figurativos na década de 1910, o que faz que seja considerado o primeiro pintor ocidental a produzir uma tela abstrata. Utilizando esboços figurativos em aquarela para estudos de composições finais (improvisações), Kandinsky inicia um processo de simplificação das formas. "Entre os esboços em aquarela e a pintura final, Kandinsky não distinguia mais o esboço da obra final, terminando por assinar o esboço que é hoje considerado a primeira aquarela abstrata", aponta Christiane.

    Kandinsky era também teórico da arte, tendo escrito vários livros que defendiam suas ideias a respeito do abstracionismo. Ainda em 1910, ele publicou sua teoria da arte Do espiritual na arte, afirmando que não estávamos suficientemente avançados em pintura para estar profundamente impressionados por uma composição de formas e cores totalmente emancipada. "Essa teoria é a referência do seu pensamento sobre a arte abstrata e a sua realização artística, a qual consiste em uma estética pela impressão das formas e cores. Além disso, percebe-se a capacidade de transferência para a tela dessa impressão pelo artista, seguindo os imperativos abstratos, que se consolidaram em suas composições", afirma Wagner.

    Com suas pinceladas rápidas e de cores fortes, cheias de significado e sentimento, as obras de Kandinsky logo chamaram a atenção do público - porém causando sentimentos controversos: enquanto alguns aplaudiam sua genialidade, outros repudiavam sua obra. O abstracionismo de Kandinsky representou uma ruptura radical em relação à arte figurativa tradicional, mantendo-se atual até os dias de hoje. "Sua obra mantém um diálogo com a atualidade no que concerne à relação da arte com o progresso constante da ciência e da técnica. Por meio do abstracionismo de Kandinsky, a percepção imediata em sua composição revela, de forma concreta, o interior do artista e sua relação com o universo, caracterizando a expressão metafísica, na qual, nos dias de hoje, se mantém atual", conclui a pesquisadora.

     

    Chris Bueno