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    Ciência e Cultura

    On-line version ISSN 2317-6660

    Cienc. Cult. vol.67 no.4 São Paulo Oct./Dec. 2015

    http://dx.doi.org/10.21800/2317-66602015000400015 

    PALEONTOLOGIA
    ARTIGOS

     

    A paleontologia no século XXI: novas técnicas e interpretações

     

     

    Juliana Manso Sayão RenanI; Alfredo Machado BantimII

    IProfessora adjunta do Centro Acadêmico de Vitória, Departamento de Ciências Biológicas, Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e membro da Academia Brasileira de Ciências
    IIDoutorando do Programa de Pós-Graduação em Geociências da UFPE

     

     

    A paleontologia constitui um ramo da ciência que se encarrega de estudar os fósseis e entender como se deram as sucessões de fauna e flora em nosso planeta, ao longo de milhões de anos (1). Para isso, desde os primeiros trabalhos realizados na área, se caracterizou como uma ciência primordialmente descritiva. Isso pode ser explicado por uma tendência que acontecia no início do século XIX, quando a morfologia era tida como a "menina dos olhos " das ciências biológicas, direcionando os estudos para descrições anatômicas e morfológicas detalhadas, incluindo o conhecimento das características microscópicas e das teorias de geração e determinação da forma. Na paleontologia não foi diferente, e por mais que algumas técnicas de microscopia tivessem sido empregadas apenas rotineiramente, essas não vingaram até muito recentemente.

    Foi nas décadas de 1980 e 1990, a partir de um conhecimento maior a respeito dos organismos pretéritos da Terra, que os paleontólogos se viram com inúmeros debates a respeito dos organismos fósseis que estudavam. Apenas descrever, identificar e classificar já não era suficiente para saciar sua curiosidade. Começaram então a buscar técnicas que permitissem entender algumas questões relacionadas com a biologia desses organismos, muitos deles extintos sem deixar descendentes. Dentre elas estavam perguntas relacionadas à idade dos organismos ao serem fossilizados. Se aqueles animais cresciam rápido ou lentamente. Se seu corpo seria capaz de desenvolver determinados movimentos. Em qual ambiente viviam e suas adaptações para aquele tipo de vida. Mais recentemente, se perguntaram qual a capacidade e alcance dos órgãos sensoriais dos organismos fossilizados. Para resolver esses dilemas, algumas técnicas oriundas de áreas correlatas começaram a ser empregadas. Com os novos métodos, vieram também novas análises e interpretações acerca do conteúdo fossilífero. Dentre estas destacamos a paleohistologia, a microscopia eletrônica de varredura, a tomografia computadorizada com a geração de imagens para impressão em três dimensões e, atualmente, a paleometria.

    Embora os primeiros estudos envolvendo as técnicas mencionadas acima e suas adaptações para sua utilização com os fósseis tenham se originado em países da Europa e também nos Estados Unidos, atualmente, todas podem ser encontradas em utilização no Brasil. Aos poucos os pesquisadores nacionais foram direcionando suas pesquisas para uma ou mais de uma dessas técnicas, resultando no surgimento de laboratórios especializados, com todos os equipamentos necessários para estudos de cunho paleobio-lógico em nosso país. As principais instituições que fazem desse tema suas pesquisas atualmente são: o Museu Nacional ligado à Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), a Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), a Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), a Universidade de São Paulo (USP, campus Ribeirão Preto), a Universidade Federal do Cariri (UFCA) e a Universidade Regional do Cariri (Urca).

     

    RECUPERANDO INFORMAÇÕES PALEOBIOLÓGICAS DE ORGANISMOS EXTINTOS

    A paleohistologia está mais relacionada ao estudo da composição dos ossos fossilizados (osteohistologia), no entanto também pode ser empregada para o estudo de vegetais, principalmente na análise dos tecidos que compõem os lenhos, chamada de dendrologia. Através dos estudos osteohistológicos é possível revelar quatro sinais sobre a biologia dos fósseis: ontogenia, filogenia, mecânica de deposição dos tecidos e influências ambientais (2). Existe um consenso de que esses sinais se refletem na micromorfologia dos tecidos depositados no osso, a qualquer momento da vida do fóssil analisado. Para o emprego dessa técnica é necessário retirar uma porção do osso com o auxílio de uma serra diamantada. O fragmento do fóssil é então envolvido em resina transparente e colado numa lâmina de vidro. A parte oposta à lâmina é submetida a um desgaste através de um equipamento chamado politriz, onde lixas de diferentes granulometrias desbastam o fragmento na resina, até que fique muito fina e transparente para ser observada ao microscópio (2).

    Vários aspectos da história de vida de vertebrados extintos são dedutíveis a partir da microestru-tura do osso fossilizado. Por meio da análise histológica é possível inferir as adaptações no estilo de vida, os gradientes e estratégias de crescimento e indicar o seu estágio ontogenético. A quantidade e o tipo de tecido ósseo encontrado nessas estruturas fósseis são importantes para entender como se deu o seu desenvolvimento e a ligação existente com o estágio ontogenético. Os ossos podem mostrar marcas de crescimento, mais comumente chamadas de linhas de pausa de crescimento, demonstradas pela deposição óssea, mesmo que por duração desconhecida e linhas de polimento. Através de suposições bem fundamentadas de ciclicidade de crescimento anual, os registros de marcas de crescimento podem ser quantificados; esta técnica é denominada esqueletocronologia. Os registros de crescimento estão contidos em cada tipo de osso, isso porque cada um está ligado a uma determinada taxa de deposição, uma relação conhecida como regra de Amprino.

    De uma maneira geral, pode-se dividir o tipo de tecido ósseo em três grupos: crescimento rápido, composto por osso fibro-la-melar sem linhas de pausa de crescimento; taxas de crescimento intermediário, indicadas por osso fibro-lamelar com linhas de pausa de crescimento e baixas taxas de crescimento, sendo indicadas por osso lamelar-zonal (3). Análises paleohistológicas em ossos constituem, portanto, uma das melhores formas de identificar diferentes estágios ontogenéticos em populações de organismos extintos tais como: dinossauros, pterossauros (répteis voadores) e fósseis de cro-codilomorfos (todos arcossauros).

    Tudo começou em 1861 quando Richard Owen, por uma questão de rotina, resolveu retirar uma amostra do osso do dinossauro Scelidosaurusharrisonii Owen, 1861 e realizar uma secção fina ao descrevê-lo (4). Apesar da análise da estrutura microscópica do osso fossilizado não ter sido um campo bem desenvolvido, nesses anos iniciais, algumas décadas depois e principalmente no século seguinte alguns pesquisadores foram considerados pioneiros nesses estudos como: Quekett, Gross, Foote, Enlow, Peabody, de Ricqles e Reid (5). O que nem sempre percebemos é que embora ossos fósseis tenham sido seccionados por séculos, eles nunca foram amostrados sistematicamente até recentemente (4). Isso fez com que, por muito tempo, todas as pesquisas paleohistológicas tratassem de trabalhos isolados, sendo uma área bastante solitária.

    Esse cenário começou a se modificar nos anos de 1980 e 1990, quando o paleontólogo norteamericano John R. Horner e colegas contemporâneos, como o alemão Martin Sander, começaram a utilizar melhores amostras para tentar explicar as idades e taxas metabólicas dos dinossauros (6). Essa revolução se deu, primordialmente, por Horner coletar seus fósseis na região de Montana (EUA) e ser o curador da coleção, se permitindo utilizar sistematicamente esse material para sua pesquisa, o que gerou um procedimento padrão para os estudos paleohistológicos (4). Foi então que, em seus trabalhos, teve acesso a uma variação de tamanhos e idades dos espécimes que analisou, sempre recolhendo amostras do mesmo tipo de osso e do mesmo ponto nos diferentes indivíduos (2). Juntamente com esse novo pioneirismo, Anusuya Chinsamy, Jack Horner, Martin Sander e seus alunos, logo aplicaram as novas abordagens para um grande número de outros grupos de animais fósseis como anfíbios, répteis e aves.

    No Brasil a tendência logo foi seguida e, no início dos anos 2000, surgiram os primeiros trabalhos independentes de paleohistologia dos fósseis nacionais (7). Foi dada uma especial atenção aos estudos com arcossauros (pterossauros e crocodilomorfos) e também com mamíferos. Um dos destaques atuais foi a observação da microes-trutura dos ossos do crocodilo marinho Guarinisuchusmunizi, encontrado nas rochas localizadas no litoral do estado de Pernambuco. Nessa pesquisa verificou-se, a partir da análise da tíbia e do fêmur, que essa espécie de crocodilo possuía ossos bastante leves e vascu-larizados, o que poderia conferir a esse animal a capacidade de ser um exímio nadador (8). A partir dessa e de outras características observadas na composição do osso, os autores propuseram que o animal teria a capacidade de ocupar o nicho de predador nas águas da costa nordeste do Brasil, após a grande extinção dos dinossauros e dos grandes répteis marinhos. Mais recentemente, uma outra publicação de julho de 2015 nos Anais da Academia Brasileira de Ciências, fruto de uma parceria entre pesquisadores brasileiros e chineses, revelou a ausência de um tecido depositado na cavidade medular por fêmeas em época de postura de ovos em um exemplar de pterossauro Kunpengopterus sp. que possuía dois ovos em seu interior. O trabalho foi conduzido pelo paleontólogo chinês Xiaolin Wang e colaboradores e revelou ainda que os pterossauros tinham dois ovários funcionais capazes de gerar ovos simultaneamente e não apenas um como se pensava anteriormente (9).

    A mesma técnica utilizada para confeccionar lâminas de ossos, também apresentou excelentes resultados nos estudos das cascas de ovos fossilizados e de dentes de dinossauros, lagartos marinhos e crocodilos fósseis. Destacamos que a utilização dessa técnica nesse caso específico, juntamente com imagens feitas através de microscópio eletrônico de varredura (figura 1), permitiu que fosse identificado o grupo de animais ao qual pertenceram fragmentos de cascas e ovos fossilizados, sem a presença dos esqueletos dos animais que os colocaram. Entre os trabalhos realizados, está o que foi publicado no ano passado pelo então estudante de mestrado Julio Marsola e colegas de diferentes instituições brasileiras e estrangeiras, que identificou, a partir da microestrutura da casca, o primeiro ovo fossilizado de um pássaro que viveu no Brasil durante a era Mesozoica (entre 252 e 66 milhões de anos atrás) (10).

     

    APLICAÇÃO DA TOMOGRAFIA COMPUTADORIZADA NOS FÓSSEIS

    A tomografia computadorizada é uma técnica bastante recente, descoberta no ano de 1961 pelo médico neurologista norte-americano William Henry Oldendorf, que realizou as primeiras experiências com imagens computadorizadas. Este processo foi modernizado pelo inglês Godfrey Newbold Hounsfield, que aperfeiçoou os conhecimentos e desenvolveu uma forma de reconstruir imagens a partir dos raios X por meio da tomografia axial computadorizada. Apesar disso, o primeiro tomógrafo computadorizado do Brasil foi instalado apenas em 1971, no Hospital Beneficência Portuguesa, em São Paulo. Contudo a técnica de tomografia, até então utilizada para fins médicos e de identificação de doenças, apenas foi utilizada em outras áreas a partir da década de 1980, para aquisição de imagens tridimensionais.

    O aparelho tomógrafo é caracterizado basicamente pela parte mais proeminente, o "Gantry", uma moldura circular, rotatória com um tubo de raios-X montado em um lado e um detector no lado oposto. Um feixe de raios-X em formato de leque gira o tubo de raios-X e o detector em torno do paciente ou da amostra analisada. Conforme o aparelho roda, milhares de imagens são tiradas em uma rotação resultando em uma imagem de seção transversal completa do corpo. Baseado nesses dados é possível se criar uma visualização 3D além de visões de diferentes ângulos. Exames de tomografia fornecem imagens bem mais detalhadas do que os de raios-X convencionais, especialmente no caso de vasos sanguíneos e tecidos moles tais como órgãos internos e músculos.

    Essa técnica começou a ser aplicada em estudos paleontológicos a partir do ano de 1984 quando Glenn C. Conroy e Michael W. Vannier publicaram um trabalho na renomada revista acadêmica Science. Em seu trabalho analisaram crânios bem preservados de mamíferos ungulados do Oligoceno e Mioceno e (de 34 a 23 milhões de anos aproximadamente (11). Posteriormente essa técnica passou a ser amplamente utilizada por paleontólogos, pois fornecia uma nova perspectiva de análise de fósseis, podendo ser utilizada como base para diferentes tipos de pesquisas, não somente em estudos de vertebrados, mas também aplicada em invertebrados e até vegetais fósseis. A tomografia computadorizada se tornou então a principal ferramenta para elucidar a anatomia dos táxons fósseis, incluindo estudos da caixa craniana e do ouvido interno no caso dos vertebrados (12).

    Os estudos pioneiros no Brasil utilizando a tomografia computadorizada foram realizados por pesquisadores do setor de paleo-vertebrados do Museu Nacional da UFRJ, a partir dos anos 1994 quando Sérgio Alex Azevedo e colaboradores ressaltaram a importância do uso da tomografia em vertebrados fósseis. Dois anos depois, Alexander Kellner, da mesma instituição, aplicou a técnica de tomografia para descrever morfologicamente as cavidades internas de dois crânios de pterossauros do Brasil, um anhanguerídeo e um tapejarídeo (13). Após esses estudos iniciais, diversos grupos de pesquisadores do Brasil começaram a utilizar essa importante técnica em pesquisas paleontológicas.

    Ao utilizar a tomografia na paleontologia, percebeu-se que o mapeamento de imagens 3D e a utilização de modelos tridimensionais criados em computação gráfica poderiam também contribuir para a manutenção de coleções paleontológicas, armazenando informações sobre a morfologia de cada exemplar em um novo formato, o 3D digital. Concomitantemente, essa nova técnica de aquisição de dados possibilitou a visualização de estruturas internas dos fósseis sem preparação mecânica, diminuindo a probabilidade de ocasionar qualquer tipo de dano nos fósseis excepcionais. Além disso, a prototipagem aliada a estudos mais acurados de anatomia, fisiologia e biomecânica, gerou uma sub-área dentro da paleontologia e da neurologia, a paleoneurologia.

    A paleoneurologia é o estudo da evolução do cérebro por meio de análise de endocasts cerebrais, com a finalidade de determinar traços endocranianos e volumes cerebrais. A paleoneurologia combina técnicas de outros campos de estudo incluindo a paleontologia e arqueologia. Fósseis de crânios e seus endocasts podem ser comparados entre si, podendo-se traçar inferências sobre a anatomia funcional, fisiologia e filogenia. A paleoneurologia é em grande parte influenciada pela neurociência como um todo; sem o conhecimento substancial sobre a funcionalidade atual dos cérebros e endocasts, seria impossível fazer inferências sobre a funcionalidade dos cérebros em fósseis.

    Um exemplo da aplicação da paleoneurologia em fósseis brasileiros, é o estudo do pesquisador Pablo Rodrigues da UFRGS, publicado este ano, no qual foram obtidas reconstruções tridimensionais do crânio e moldes digitais do encéfalo e orelha interna do cinodonte Brasilitherium riograndensis - encontrado em rochas do período Triássico do sul do Brasil - a partir de imagens de tomografias computadorizadas. Nesse trabalho, ele também descreveu os aspectos da caixa craniana e a trajetória de alguns vasos cranianos. Ele pôde concluir com essa análise que, em comparação com outros cinodontes não-mamaliaformes, o molde endocraniano de Brasilitherium possui um aumento do encéfalo, especialmente dos bulbos olfatórios, relativamente maiores do que os de outros cinodontes do período Triássico, o que pode representar um aumento na capacidade de ouvir altas frequências (14). Além disso, esse estudo fortaleceu a proposta da evolução do cérebro dos mamíferos, inicialmente associada a pressões seletivas para melhor acuidade sensorial, em cinodontes pequenos e, possivelmente, noturnos que viveram durante o Mesozoico.

     

    DESVENDANDO AS CARACTERÍSTICAS MICROESTRUTURAIS DOS FOSSEIS

    O microscópio eletrônico de varredura (MEV) é um dos mais importantes instrumentos disponíveis para a observação e análise das características microestruturais de materiais sólidos. O primeiro trabalho reconhecido descrevendo o conceito de um MEV é o de Knoll em 1935. Posteriormente, Von Ardenne, em 1938, construiu um microscópio eletrônico de varredura e transmissão (STEM) adaptando bobinas de varredura a um microscópio eletrônico de transmissão. Desde os primeiros estudos em MEV, o primeiro instrumento comercial apenas foi construído em 1965 e, após isso, muitos avanços foram obtidos. Atualmente, os modernos microscópios eletrônicos de varredura são equipados com estrutura digital que permite o armazenamento temporário da imagem para observação ou, até mesmo, a transferência por rede para outras partes do planeta.

    A aplicação dessa técnica é primordial para análises micro-estruturais em fósseis. O uso do MEV na paleobotânica é o mais utilizado, pois geralmente os fósseis de plantas apresentam caracteres epidérmicos preservados ou estruturas anatômicas tridimensionais, que sao importantes quando a anatomia estomática de uma planta fóssil pode ser utilizada para distinguir diferentes grupos entre as plantas. Estudos anatômicos sao suficientes para reconhecer a composição de uma pale-oflora (Figura 1A). Análises estomáticas também podem ser feitas para distinguir diferentes grupos de plantas (Figura 1B). Na maioria dos casos, ao se analisar parte da cutícula de uma folha fossilizada, as estruturas preservadas ali são iguais ou bastante semelhantes às encontradas nas folhas de vegetais atuais. A palinologia (estudo de pólens, esporos) também é auxiliada pelo MEV, quando grãos de pólen apresentam morfologia polínica semelhante, sendo apenas diferenciados em MEV.

    Além disso, a microscopia eletrônica pode ser utilizada em alguns exemplares de vertebrados fósseis, que apresentem alguma preservação de tecido mole. O caso mais famoso no Brasil é a descoberta de vasos sanguíneos e fibras musculares preservados em um fóssil de dinossauro, a espécie Santanaraptorplacidus Kellner, 1999 encontrada no interior do Ceará, na bacia do Araripe. Dessa mesma localidade fossilífera, outros espécimes de fósseis, ao serem analisados sob a ótica do microscópio eletrônico, apresentaram tecidos moles e estruturas microscópicas. Existem peixes com fibras musculares preservadas em concreções e parasitas preservados em seus coprólitos, ocorrência de estruturas pilosas (similares a pelos) preservadas em asas de pterossauros, estruturas de coloração (me-lanossomos) preservados em penas e plumas e possíveis bactérias preservadas em uma crista composta por tecido mole de um pte-rossauro tapejarídeo.

     

    DADOS SOBRE A COMPOSIÇÃO DOS FÓSSEIS

    Uma técnica que vem ganhando reconhecimento nos estudos paleontológicos no Brasil e no mundo é a paleometria. Tendo em vista a constituição química geral dos organismos, os fósseis podem ser adequadamente estudados por técnicas de paleometria tais como: infravermelho, espectroscopia Raman, difração de raios X e fluorescencia de raios-X, com intuito de identificar e caracterizar os compostos que constituem o material fossilizado. Com o uso da paleometria pode-se elucidar a composição química de esqueletos de vertebrados e invertebrados, além da composição de lenhos e fragmentos de vegetais fossilizados, o que viabiliza a compreensão de processos de fossilização, paleoambientes e mudanças de clima, possibilitando traçar evidencias adicionais a respeito das condições e processos tafonômicos.

    Os principais trabalhos de paleometria no Brasil remetem a estudos na bacia do Araripe. O trabalho pioneiro na utilização da paleometria, em fósseis da bacia do Araripe, foi realizado em 2007 por Ricardo Lima e colaboradores que submeteram à difração de raios-X e espectroscopia na região do infravermelho amostras retiradas de escamas fósseis de um peixe da espécie Rhacolepis buccalis Agassiz, 1841 preservado em uma concreção calcária da formação Romualdo. Com isso, os pesquisadores perceberam que a maior parte da composição química da amostra era similar a de escamas de peixes atuais, concluindo que a fossilização pouco alterou a composição das escamas.

    Recentemente, em 2014, Adriana Delgado e colaboradores realizaram um trabalho compilando algumas aplicações paleo-métricas em diferentes fósseis, tais como parte do esqueleto duro de Corumbella werneri Hahn, Hahn, Leonardos, Pflugand Walde 1982, aspectos geoquímicos acerca de bivalves de água doce do Grupo Bauru e a preservação excepcional de artrópodes da formação Crato. Os autores utilizaram reflexão difusa no infravermelho (DRIFT) e energia dispersiva de raios-X (EDX) para elucidar os tipos de esqueletogênese na amostra fóssil de Corumbella. No caso dos bivalves, a DRIFT revelou-se importante para elucidar aspectos sobre a morte e fossilização desses organismos. Quanto aos artrópodes da formação Crato, a análise morfológica com microscopia eletrônica de varredura (MEV) associado com EDX foi mais viável para compreender o processo de fossilização e traçar implicações paleoambientais.

     

    REFERÊNCIAS

    1. Lima, F. J. & Bantim, R. A. M. 2013. "Introdução ao estudo dos fósseis e os processos envolvidos em sua preservação". In: Sayão, J. M. (ed) Fósseis do litoral norte de Pernambuco: evidências da extinção dos dinossauros. Gráfica Provisual, Recife, 96p.

    2. Padian, K. & Lamm, E. T. 2013. Bone histology of fossil tetrapods. University of Califórnia press, Los Angeles, 285p.

    3. Huttenlocker, A. K.; Woodward, H. N. & Hall, B.K. 2013. "The biology of bone". In: Padian, K. & Lamm, E. T. (eds.) 2013. Bone histology of fossil tetrapods. University of Califórnia press, Los Angeles, 285p: 13-34

    4. Padian, K. 2013. "Why study the bone microstructure of fossil tetrapods?". In: Padian, K. & Lamm, E.T. 2013. Bone histology of fossil tetrapods. University of Califórnia press, Los Angeles, 285p, 1-11.

    5. Steel, l. 2003. "The John Quekett sections and the earliest pterosaur histological studies". In: Buffetaut, E. & Mazin, J. M. (eds) 2003. "Evolution and palaeobiology of pterosaurs". Geological Society, London, Special Publications, 217, 325-334.

    6. Horner, J. R.; De Ricqlés, A. J. & Padian, K. 1999. "Variation in skeletochronological indicators of the hadrosaurid dinosaur Hypacrosaurus: implications for age assessement of dinosaurs". Paleobiology, 25: 295-304.

    7. Sayão, J. M. 2003. " Histovariability in bones of two pterodactyloid pterosaurs from the Santana formation, Araripe basin, Brazil: preliminary results". Geological Society, London, Special Publications, 217: 335-342

    8. Andrade, R. C. L. P. & Sayão J. M. 2014. "Paleohistology and lifestyle inferences of a dyrosaurid (Archosauria: Crocodylomorpha) from Paraíba basin (Northeastern Brazil)". PLoS ONE 9(7): e102189. doi:10.1371/journal.pone.0102189

    9. Wang, X.; Kellner, A..W..A.; Cheng, X.; Jiang, S.; Wang, Q.; Sayão, J. M.; Rodrigues, T.; Costa, F. R.; Li, N.; Meng, X. & Zhou, Z. 2015. "Eggshell and histology provide insight on thelLife history of a pterosaur with two functional ovaries". Anais da Academia Brasileira de Ciências. http://dx.doi.org/10.1590/00013765201520150364

    10. Marsola, J. C. A.; Grellet-Tinner, G.; Montefeltro, F. C.; Sayão, J. M.; Hsiou, A. S. & Langer, M.C. 2014. "The first fossil avian egg from Brazil". Alcheringa: An Australasian Journal of Palaeontology, 38:4,563-567,

    11. Vannier, M. W.; Conroy, G. C.; Marsh, J. L. & Knapp, R. H. 1985. "Three-dimensional cranial surface reconstructions using high-resolution computed tomography". Am. J. Phys. Anthropol., 67:299-311.

    12. Sobral G., Hipsleya C. A. & Müller J. 2012. "Braincase redescription of Dysalotosauruslettowvorbecki (Dinosauria, Ornithopoda) based on computed tomography". Journal of Vertebrate Paleontology, 32(5):1090-1102.

    13. Kellner, A. W. A. 1996. "Description of the braincase of two early cretaceous pterosaurs (Pterodactyloidea) from Brazil". American Museum Novitates, 3175:1-36.

    14. Rodrigues, P. G. 2011. "Reconstituições digitais do encéfalo e da orelha interna de Brasilitheriumriograndensis Bonaparte et al., 2003, e considerações sobre a evolução neurológica e sensorial na transição entre cinodontes não-mamalianos e mamíferos". Dissertação de mestrado. Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Programa de Pós-Graduação em Geociências. 220p.