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    Ciência e Cultura

    versión On-line ISSN 2317-6660

    Cienc. Cult. vol.67 no.4 São Paulo oct./dic. 2015

    http://dx.doi.org/10.21800/2317-66602015000400018 

    ARTIGOS
    ENSAIOS

     

    Reciclagem e destinação do lixo eletrônico em Goiânia

     

     

    Dagmar Borges da SilvaI; Cláudia Cristina Sousa de PaivaII; Julianna Affonso F. SouzaIII; Rodrigo Elias de RezendeIV; Sueli Maria Moraes PachecoV; Eline JonasVI; Irmtraut Araci Hoffmann PfrimerVII; Luc VandenbergheVIII

    ITecnóloga em processamento de dados e professora de informática do Instituto Federal de Goiás. É acadêmica e bolsista do Programa de Suporte à Pós-Graduação de Instituições de Ensino Particulares (Prosup/Capes) no Mestrado em Ciências Ambientais e Saúde da Pontifícia Universidade Católica de Goiás (PUC-GO). Email: bs.dagmar@gmail.com
    IIFarmacêutica bioquímica e professora da Universidade Paulista e Universidade Estácio de Sá, na cidade de Goiânia (GO). Atua na área de manipulação de produtos farmacêuticos e cosméticos. É mestranda em ciências ambientais e saúde da PUC-GO
    IIIProfessora e coordenadora pedagógica na Anhanguera Educacional em Goiânia (GO) na área de gestão de empresas. É mestranda em ciências ambientais e saúde da PUC-GO
    IVContador e professor de ciências contábeis na Universidade Estadual de Goiás (UEG). É mestrando em ciências ambientais e saúde da PUC-GO
    VProfessora de geografia no Colégio da Polícia Militar de Porangatu-Goiás. É mestranda em ciências ambientais e saúde da PUC-GO
    VISocióloga e professora-doutora do Mestrado em Ciências Ambientais e Saúde da PUC-GO
    VIIFarmacêutica bioquímica e professora doutora do Mestrado em Ciências Ambientais e Saúde da PUC-GO
    VIIIPsicoterapeuta e psicólogo clínico e professor-doutor do Mestrado em Ciências Ambientais e Saúde da PUC-GO

     

     

    A presença de computadores e materiais eletroeletrônicos está totalmente incorporada à vida cotidiana da atualidade. As mídias digitais não cessam de se expandir e, em vários países, incluindo-se o Brasil, o número de celulares chega perto ou já é maior que o número de habitantes (1). E, em relação ao comportamento social, percebe-se que possuir o aparelho mais moderno é uma meta quase comum, cuja consequência é um assustador aumento do lixo eletrônico. Alguns dados impressionantes a esse respeito podem ser descritos. Em janeiro de 2012, o Brasil já havia superado a marca de 245 milhões de celulares (1). Um cidadão britânico produz em média 3,3 toneladas de lixo eletrônico ao longo da vida. Embora 80% dos componentes de um celular poderiam ser reciclados, em 2009 apenas 3% dos aparelhos tinham esse fim. O tempo de vida médio de um celular é de 18 meses, e o de um computador três anos (2).Em 2011, havia 5,6 bilhões de aparelhos celulares, 11% a mais que no ano anterior, segundo a Gartner Newsroom (3).

    Herat e Agamuthu (4) destacam dois países no cenário global do lixo eletrônico: Estados Unidos, maior gerador de lixo eletrônico do mundo, e Índia, país com maior taxa mundial de crescimento da indústria eletrônica. Entretanto, não menos importante é a China, considerada um dos países de maior potencial produtor de lixo eletrônico nos próximos anos, em razão do ritmo crescente de industrialização, além de sediar o maior lixão internacional de resíduos eletrônicos (5). No que se refere à gestão do lixo eletrônico e pioneirismo em legislar sobre o assunto, a Suíça é apontada como país-modelo (6). Nos quatro casos, a preocupação essencial não é apenas com a geração do lixo eletrônico, mas com sua reciclagem e destinação, pois é indubitável que o seu descarte inapropriado (em lixões ou aterros sanitários) gera degradação ambiental. Isso por causa da composição de inúmeros metais pesados que os constituem. A produção de eletrônicos enseja por si só o desgaste de recursos naturais.

    Artigo publicado no site do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma) mostra o Brasil em primeiro lugar na produção de lixo eletrônico derivado de computadores (mais de 0,5 kg per capita/ano), ultrapassando mesmo a África do Sul, Marrocos e México, países com altos níveis de venda de computadores que obtiveram índice um pouco superior a 0,4kg per capita/ano (7). De acordo com estudo da Universidade das Nações Unidas, para se construir um único computador são utilizados cerca de 1800 quilos de materiais dos mais diversos tipos, sendo que, desse total, 1500 quilos somente de água na fabricação, 240 quilos de combustíveis fósseis e 22 de produtos químicos.

     

    OPORTUNIDADES NO LIXO

    No Brasil, enquanto uns desconhecem o destino do lixo eletrônico, outros já descobriram oportunidades de lucro advindo desse descarte. Em Goiânia, a empresa Sucata Eletrônica, criada em 1998, foi a primeira a perceber como tirar proveito do que está sendo jogado fora e garante que a maioria dos componentes de um computador é reaproveitável. Metais preciosos como a prata e o ouro, além de valiosos, podem ser reutilizados. Desafios relacionados ao lixo eletrônico trouxeram à tona a experiência de Rodrigo Baggio que, ao lançar uma grande campanha de arrecadação de computadores, explicitou que não era o caso de disponibilizar equipamentos eletrônicos para pessoas socialmente excluídas, pois elas não sabiam como utilizá-los. Nasceu assim a primeira Escola de Informática e Cidadania (EIC), no morro Dona Marta, na cidade do Rio de Janeiro, oferecendo cursos básicos de informática. Fundada por Baggio em 1995, tornou-se uma da Organização Não-Governamental (ONG) apartidária, utilizando as tecnologias da informação e comunicação (TICs) para melhorar a qualidade de vida da população e fomentar o exercício da cidadania. Depois disso foi criado o Comitê para Democratização da Informática (CDI) no Brasil e no mundo, a fim de usar a tecnologia e estimular o empreendedorismo e a cidadania.

     


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    Em Goiás, no ano 2000, foi criado o Comitê para Democratização da Informática (CDI-GO) que, nessa trajetória, impactou mais de 26 mil pessoas, entre crianças, jovens, adolescentes, adultos, idosos e pessoas em situação de risco social. Após o desmonte de computadores e reaproveitamento de componentes eletrônicos, o restante do lixo eletrônico (fios de cobre, placas de metal, alumínio, prata, ouro, plástico etc) é destinado a parceiros como, por exemplo, a empresa Sucata Eletrônica, para nova separação e reciclagem.

    Conforme se afirmou anteriormente, o lixo eletrônico é um dos mais novos problemas da modernidade. O quesito ambiental, colocado pela ONG do CDI-GO sobre a reciclagem de lixo eletrônico, também vem se configurando para o desenvolvimento da comunidade. Como coletar? Como reciclar? Como destinar? O chamado resíduo tecnológico começa a ser acumulado de maneira preocupante em aterros e lixões tornando-se um dos problemas da modernidade e, assim, um problema de saúde pública.O acúmulo de lixo eletrônico não foi previsto pelas indústrias e nem mesmo pela sociedade (8), como se percebe pelo tratamento dado à área de informática que, por muito tempo, não foi vista como uma indústria poluidora, antes que o crescimento tecnológico acelerado diminuísse enormemente o ciclo de vida dos equipamentos, gerando grandes quantidades desse lixo.Evidenciam-se, atualmente, os problemas ambientais produzidos pelo descarte indevido do lixo eletrônico, como a contaminação do meio ambiente e o surgimento de várias doenças causadas pela absorção de metais pesados como chumbo, cádmio e mercúrio e a absorção de dioxinas provenientes de plásticos, muito utilizados nos produtos eletrônicos. Ao serem depositadas na natureza, essas substâncias entram na cadeia alimentar pela base e seguem por toda ela, atingindo diversificadas espécies de animais, inclusive o ser humano. Desta maneira, os consumidores finais são os que acabam ingerindo a maior quantidade de substâncias nocivas e os que mais sofrem com as consequências, estando entre elas doenças graves, como o câncer (9).

     

     

    TECNOLOGIA DO BEM

    Pensando no futuro, o CDI-GO abrigou projetos de inclusão digital nos Comitês para Democratização da Informática de Goiás Comunidade (CDIs Comunidade), oferecendo cursos básicos e avançados de informática e cidadania, oficinas planejadas de acordo com a necessidade de segmentos do mercado e projetos específicos, nacionais e internacionais, elaborados de acordo com as necessidades de cada parceiro/comunidade. Os dados mostram uma crescente integração desses projetos com as comunidades que, paralelamente, utilizam as mídias sociais, desempenhando papel revolucionário, para reivindicar ou mobilizar a sociedade contra desigualdades sociais em sua cidade. Os objetivos reais do CDI-GO vislumbram a plataforma de mobilização social, convidando a sociedade e diferentes comunidades para promover ações que usem a "tecnologia do bem", por exemplo para a criação de um aplicativo que tenha a função de melhorar a coleta seletiva de um determinado bairro (10). Importa destacar, por um lado, que o CDI-GO possui parceiros, doadores, associados colaboradores e voluntários visando manter a ONG e, por outro, que as agressões ao meio ambiente afetam, de modo desigual, as pessoas que dele dependem para viver e trabalhar. Desta forma, parte significativa do lixo eletrônico já é, hoje, oferecida em plataformas colaborativas e não remuneradas. O mesmo pode ser dito do uso de materiais reciclados com base na preocupação explícita de reduzir seu impacto nos ecossistemas: reciclagem de materiais eletrônicos e seu reaproveitamento ajudam outras pessoas que precisam, como no caso do CDI-GO.

    O que nem todo mundo sabe é que esses materiais têm quase 100% de aproveitamento em indústrias de reciclagem. O plástico da impressora, por exemplo, serve para a produção de sandálias, brinquedos e baldes, como acontece na empresa Sucata Eletrônica. E quanto aos outros componentes da impressora, depois de retirados os cartuchos de tinta, alguns são triturados no proces-so de reciclagem. Plásticos e metais são separados de cabos e fios que são revendidos como matéria-prima. O vidro do monitor de vídeo é moído para ser vendido como matéria-prima para pisos-cerâmicos, para-brisas e bolinhas de gude. Também o plástico, o metal e o silicone do teclado são triturados e vendidos como matérias-primas. O alumínio das placas eletrônicas vai para a fabricação de janelas e basculantes. Ouro, prata e níquel são extraídos de placas eletrônicas para serem reutilizados em novos chips ou vendidos para joalherias. A maior parte dessas impressoras chega à empresa de maneira informal e tem sua origem desconhecida, configurando uma situação pouco perceptível (11) e ainda existem sérias lacunas no que diz respeito à reciclagem e destinação do lixo eletrônico em Goiânia. Mas, mesmo que haja incertezas e falta de compreensão, é preciso acreditar que o início está acontecendo, ainda que minimamente. E um primeiro resultado é a constatação de uma maior conscientização entre a sociedade (da menor à maior idade) quanto ao meio ambiente e à necessidade de tratamento do lixo eletrônico.

    Com base no exposto, pode-se afirmar que a questão do lixo eletrônico vem se tornando uma realidade cada vez mais palpável e preocupante, o que tem causado reflexos no crescimento e relativo amadurecimento da legislação nacional sobre o assunto. O ritmo acelerado de produção desses resíduos, aliado à melhor compreensão dos riscos à saúde e ao meio ambiente decorrentes do seu descarte inadequado, confere um caráter de urgência ainda maior à temática. Contudo, a medida real do problema ainda é, em grande parte, desconhecida. Estatísticas confiáveis ou oficiais são escassas e a cadeia de pós-consumo está longe de atingir a maturidade. Declarações de agentes envolvidos apontam a necessidade de maiores esclarecimentos sobre a reciclagem e sobre a destinação, de forma geral, do lixo eletrônico. As concepções estão, ainda, majoritariamente, associadas a visões simplistas, que apontam para uma compreensão mínima sobre a proteção ao meio ambiente.

     

    REFERÊNCIAS

    1. Anatei, Agência Nacional de Telecomunicações. Disponível em: <http://www.infomoney.com.br/minhas-financas/noticia/2343572/celulares-numero-no-vas-linhas-janeiro-maior-dos-ultimos-anos>. Acesso em: 17 nov 2014.

    2. Prizibisczki, C.. Disponível em: <http://www.oeco.org.br/reportagens/2184l--impactos-do-desenvolvimento-tecnologico>. Acesso em: 17 nov 2014.

    3. GartnerNewsroom. Disponível em: <http://www.gartner.com/technology/home.jsp>. Acessoem: 17 nov 2014.

    4. Herat, S.; Agamuthu, P. "E-waste: a problem or an opportunity? Review ofissues, challenges and solutions in Asian countries". Waste Management & Research, London, v. 30, n. 11, p. 1113-1129, nov. 2012.

    5. Pnuma, Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente. Disponível em: <http://www.pnuma.org.br>. Acesso em: 16 fev 2015.

    6. Queiruga, D.; González, B.G.; Lannelongue, G. "Evolution of the electronic waste management system in Spain". Journal of Cleaner Production, (24), 56-65. 2012.

    7. Schluep, M. et al. "Reciclagem e recursos do lixo eletrônico. Inovação sustentável e transferência de estudos tecnológicos do setor industrial". Programa de Meio Ambiente das Nações Unidas e da Universidade das Nações Unidas, 2009. p. 45.

    8. Mattos, K.M. da C.; Mattos, K.M.C.; Perales, W. J. S.. "Os impactos ambientais causados pelo lixo eletrônico e o uso da logística reversa para minimizar os efeitos causados ao meio ambiente". Encontro Nacional de Engenharia de Produção, v. 28, 2008.

    9. Oliveira, B.C., et al. Projeto E-lixo. São Paulo: EACH, 2010.

    10. Pacheco, Q. I.. Comitê para Democratização de Informática de Goiás. In: CDI Goiás - Transformando vidas através da tecnologia. Goiânia, Goiás. Disponível em: www.cdigoias.org.br. Acesso em 15 nov 2014.

    11. Sucata Eletrônica, empresa. Comunicação Oral em 19 nov 2014.