SciELO - Scientific Electronic Library Online

 
vol.67 número4 índice de autoresíndice de materiabúsqueda de artículos
Home Pagelista alfabética de revistas  

Servicios Personalizados

Revista

Articulo

Indicadores

    Links relacionados

    • En proceso de indezaciónCitado por Google
    • No hay articulos similaresSimilares en SciELO

    Compartir


    Ciência e Cultura

    versión On-line ISSN 2317-6660

    Cienc. Cult. vol.67 no.4 São Paulo oct./dic. 2015

    http://dx.doi.org/10.21800/2317-66602015000400020 

    ARTISTA DA ESPONTANEIDADE

     

    Público brasileiro pôde acompanhar a maior mostra de Miró já organizada no país

     

     

    Patricia Piacentini

     

     

    De 24 de maio a 23 de agosto, São Paulo recebeu 112 obras do artista espanhol Joan Miró (1893-1983) na exposição "A força da matéria " realizada pelo Instituto Tomie Ohtake em parceria com a Fundação Miró de Barcelona. A mostra seguiu para Florianópolis, no Museu de Arte de Santa Catarina (MASC), onde permanecerá até 14 de novembro.

    Na capital paulista, 397.134 pessoas foram conferir a exposição. "Essa é a maior mostra de Miró já organizada no Brasil e permite que o público possa ver mais de 40 pinturas do artista, técnica pela qual seus trabalhos ficaram mais conhecidos. Antes, o que tinha vindo para cá eram somente gravuras ou poucas pinturas", salienta Julia Lima, pesquisadora e membro do Núcleo de Pesquisa e Curadoria do Instituto Tomie Ohtake. Das 112 obras, são 41 pinturas, 22 esculturas, 20 desenhos, 26 gravuras e três objetos (pontos de partida de esculturas). O conjunto se completa com fotografias sobre a trajetória do artista. "É importante notar que essa mostra traz uma seleção de 50 anos de produção de Miró, o que faz com que o público possa acompanhar visualmente cada mudança, cada experimentação, cada salto do trabalho", afirma a pesquisadora.

    A exposição foi dividida em três grandes blocos: as décadas de 1930 e 1940, com destaque para as pinturas e desenhos da época da Guerra Civil Espanhola e da Segunda Guerra Mundial; 1950 e 1960, onde o público confere técnicas diversas e que mostra uma fase de experimentação de Miró, momento em que ele mostra seu talento nas esculturas; e, finalmente os anos 1970, em que seu trabalho questiona o sentido final da arte, com destaque para a coleção de gravuras.

    Além da pintura, Miró trabalhou sobre diferentes suportes, como tela, papel, madeira, papel de embrulho, tecido, telas de outros artistas. "Na mostra há objetos usados pelo artista como ponto de partida para as esculturas, gravuras (também de diversas técnicas - água-tinta, água-forte etc.), desenhos e vídeos que mostram Miró em ação e contam do processo criativo do artista", diz Lima.

     

    DESCONSTRUÇÕES

    Miró produziu intensamente durante toda a vida, convivia com as próprias obras no ateliê por anos e chegava a destruí-las ou revisitá-las, recobrindo com tinta pinturas antigas. Lima afirma que há exemplos disso na exposição, inclusive, telas pintadas em 1940 e que foram recobertas quase totalmente com tinta preta em 1974 pelo artista. "Ele sempre falava do desejo de 'destruir' a pintura. No entanto, essa vontade se traduzia numa prática que criava novos modos de pintar - abandonando o cavalete e partindo para o chão, abdicando da tela e usando qualquer suporte material que encontrasse, abandonando a figura, mas não sem se fixar unicamente em formas e cores".

    São obras bem coloridas com a presença do amarelo, vermelho, azul, branco, preto, roxo, verde e laranja em toda a sua produção, mesmo nos períodos de conflito. "As cores não necessariamente refletiam as emoções do artista, mas tinham ligação com o contexto em que vivia, um espelho do momento político mais do que de seu estado emocional", explica a pesquisadora.

    O processo de criação de Miró busca a espontaneidade do gesto. Ao observar as pinturas do artista espanhol, são comuns as comparações com traços infantis. Segundo a curadora do Instituto Tomie Ohtake, na verdade, isso reflete sua espontaneidade. "Mais do que infantil ou primitivo, o trabalho de Miró buscava, sobretudo o espontâneo. Era uma vontade de criar algo e surpreender a si mesmo com o que havia desenhado ou pintado. Seu objetivo era expressar a simplicidade do infantil por meio de um gesto quase não pensado, um ímpeto, mas ao mesmo tempo construído com muito cuidado para não se ater a fórmulas prontas ou a gestos já dominados", finaliza a pesquisadora.

     

     

    Joan Miró - o pintor que queria desaprender

    Joan Miró nasceu em Barcelona, Espanha, em 1893. Ainda jovem, adotou uma pintura de colorido intenso, com forte influência do movimento fauvista, que teve como seus principais representantes os artistas Henry Matisse e Maurice de Vlaminck. Em 1920, Miró viaja para Paris, cidade que impactou profundamente sua personalidade. Durante todo o período em que permaneceu na capital francesa, Miró não pintou uma única tela. Porém, entrou em contato com as artes de vanguarda: conheceu o cubista Pablo Picasso e se impressionou com as ideias do poeta francês Tristan Tzara, grande agitador do dadaísmo. Fez ainda amizade com o fundador do movimento surrealista, o escritor e poeta francês André Breton, Além de trazer pinturas de diversas fases do artista, a mostra teve ainda esculturas e gravuras.

    Miró se aproximou também de João Cabral de Melo Neto quando o escritor brasileiro, autor de Morte e vida severina, foi vice-cônsul em Barcelona no final da década de 1940 e depois cônsul geral no final dos anos 1960. Cabral, destacando o trabalho de Miró, disse que tratava-se de uma "pintura viva onde se destacam dois elementos: rompimento com o paradigma tradicional da pintura renascentista e o desaprender de qualquer habilidade, o que mantém a força do inédito".