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    Ciência e Cultura

    versión On-line ISSN 2317-6660

    Cienc. Cult. vol.71 no.1 São Paulo enero/marzo 2019

    http://dx.doi.org/10.21800/2317-66602019000100017 

    CULTURA
    LIVROS

     

    Com crise no mercado editorial, e‑book começa a ganhar espaço

     

     

    Leonardo Fernandes

     

     

    O livro eletrônico Não tá sopa: sambas e sambistas no Rio de Janeiro, de 1890 a 1930 (Editora da Unicamp, 2015), de Maria Clementina Pereira Cunha, descreve a ascensão do grupo musical Os Oito Batutas, no início do século XX. É um livro para ler, mas também para ouvir já que ainda resgata algumas das raras gravações do início da indústria fonográfica no país. Mesmo em meio a chiados e estalos do registro original, fica evidente o virtuosismo de composições como Urubu - até hoje um clássico do choro.

    Mesmo que o livro digital conte com mais atrativos que o impresso e tenha potencial para alcançar outras audiências, o mercado ainda é de nicho. Segundo o primeiro Censo do Livro Digital, lançado em 2017, os e-books correspondem a apenas 1,09 % do faturamento total das editoras. Das 794 editoras brasileiras analisadas, apenas 294 produzem e comercializam conteúdos digitais. Em 2016, período analisado pelo estudo realizado pela Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe), o comércio de e-books movimentou R$ 42,5 milhões. Um valor nada desprezível, mas pálido em comparação com os R$ 3,8 bilhões arrecadados na venda de cópias físicas no mesmo período. "De fato, há um crescimento muito lento no mercado dos livros digitais no Brasil. Mas isso se dá pelo fato de que uma boa parte das editoras não conhece direito o que é o formato e, o pior, temem que a nova mídia possa atrapalhar o modelo de negócios a que já estão acostumados", avalia José Fernando Tavares, proprietário da Booknando Livros e especialista em produção e acessibilidade em livros digitais. Segundo ele, ainda não há uma percepção clara de que o digital é uma plataforma diferente do impresso, com uma outra lógica de produção e distribuição. "A atual crise do mercado editorial não estimulou o investimento em novas alternativas de negócio, mas engessou o setor a só apostar no que dá mais retorno, que é o impresso", aponta.

     

    CRISE

    O mercado editorial brasileiro realmente tem motivos para se preocupar. Em 2018, afundadas em dívidas, duas gigantes do setor no Brasil, a Livraria Cultura e a Saraiva fecharam diversas lojas. A crise no setor livreiro também teve impacto nas editoras universitárias. Um estudo realizado pela Associação Brasileira das Editoras Universitárias (Abeu) revela que a academia diminuiu consideravelmente a tiragem de livros impressos nos últimos três anos. Em 2015, quase metade das editoras investia em tiragens de mil exemplares, o que correspondia a 48,8% das entidades que participaram da pesquisa. Em 2017, essas tiragens maiores se tornaram exceção, caindo para 28,2%. Atualmente, 63,5% das editoras universitárias optam por lançamentos de títulos com menos de 500 exemplares.

     


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    Apesar de os dados serem preocupantes, é preciso levar em consideração que o levantamento, divulgado em agosto de 2018, abarca dados de 85 editoras dentre 123 associadas da Abeu, o que equivale a 70% da amostra. Mas, se as tiragens impressas diminuíram, as editoras cada vez mais estão investindo no livro digital. Em 2015, apenas 39,3% das editoras publicavam e-books; hoje este índice saltou para mais da metade: 52,9%. Também se nota um aumento no número de editoras que passaram a publicar simultaneamente o impresso e o digital: de 15,5% em 2015 para 32,9% em 2018. Os organizadores do estudo especulam que esse crescimento pode refletir em uma intenção de alavancar a venda do livro físico por meio do digital.

    Assim como no caso das editoras comerciais, as acadêmicas ainda preferem publicar em papel, mas o número de lançamentos nos dois formatos está quase se equiparando nas editoras universitárias. Em 2017, foram publicados 1.971 títulos de primeira edição em formato impresso e 1.233 em formato digital. Mais do que uma contenção de custos, a ascensão dos e-books entre as editoras acadêmicas pode indicar um posicionamento político. A grande maioria das universidades, 62,4% dos entrevistados, não comercializa os seus livros digitais, afirmando oferecer o conteúdo gratuitamente.

    Lançada em 2015, a coleção Históri@ Illustrada, que abriga o livro eletrônico Não tá sopa, citado no início desta reportagem, é a primeira incursão da Editora da Unicamp no mundo dos e-books. A aposta no formato é uma tentativa de expandir a divulgação da pesquisa histórica para além do texto, combinando imagens, sons e vídeos à leitura. "A ideia é fazer com que o leitor compartilhe com o autor o acesso às fontes que fundamentam sua narrativa. Acreditamos que assim tornamos esses conteúdos não apenas mais inteligíveis, mas também mais atraentes para um público leitor não especializado", afirma Cunha.

     

    PÚBLICO LEITOR

    Para entender um pouco melhor a relação do público acadêmico com o livro digital, a pesquisa Livros eletrônicos na universidade, apesar de restrita aos alunos da Universidade de São Paulo (USP), pode oferecer alguma luz em um território ainda nebuloso. Realizada em 2015 por iniciativa da Editora da Universidade de São Paulo (Edusp), o questionário contou com a participação de 6.663 pessoas entre alunos da graduação, pós-graduação e funcionários. A maioria afirmou que tem o hábito de ler o e-book na tela do computador, o que representa 71,9% dos entrevistados. Apenas 29,3% dos participantes utiliza o smartphone como suporte para a leitura de livros eletrônicos. Em relação aos tablets, 36,9% dos participantes declarou utilizar esses dispositivos para leitura. E 20,9% tem o costume de ler em e-readers.

    Quando perguntados sobre as desvantagens do livro eletrônico em relação ao livro impresso, mais da metade dos participantes, 59,2%, afirmou que a leitura em tela é cansativa. Mas na avaliação do estudo essa desvantagem se deve ao fato de que a maioria dos participantes lê obras digitais em telas iluminadas, tais como as de computadores e tablets, e não nos e-readers, dotados de tela e-ink e, portanto, mais adequados à leitura.

    Percebe-se também que ainda há uma relação emocional com o livro impresso. Quase metade dos leitores de obras acadêmicas, 43,7%, considerou muito importante poder anotar ou grifar trechos e isso foi apontado como um dos motivos para não adotar o e-book. Outra preocupação é uma desconfiança em relação à obsolescência do formato digital: como seria a conservação desses livros ao longo dos anos? "Uma das dificuldades da aceitação do e-book é o receio que se tem em relação às inovações tecnológicas. Todo ano são lançados novos modelos de celular, tablet, por exemplo. E também estão surgindo a toda hora novos formatos para os livros digitais. Ainda não estamos caminhando para uma padronização", lembra Ricardo Lima, coordenador editorial da Editora da Unicamp. "Imagina quem tinha uma bela coleção de filmes em VHS? O que fazer com isso? Corre-se o risco de adquirir uma biblioteca inteira em um formato que pode estar obsoleto em pouco tempo", aponta Lima