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    Ciência e Cultura

    versão impressa ISSN 0009-6725

    Cienc. Cult. vol.72 no.1 São Paulo jan./mar. 2020

    http://dx.doi.org/10.21800/2317-66602020000100006 

    MUNDO
    METEOROLOGIA

     

    Previsão do tempo e comunicação sempre de mãos dadas

     

     

    Tatiana Jorgetti Fernandes

     

     

     

    No dia 19 de agosto de 2019 o céu da cidade de São Paulo virou notícia no mundo todo. No meio da tarde os paulistanos tiveram que acender as luzes. Rapidamente os meteorologistas explicaram o fenômeno: a causa da escuridão foi a formação de nebulosidade associada à passagem de um sistema frontal, que pode ter sofrido influência das queimadas que aconteciam em grandes áreas da América do Sul. A meteorologia, no entanto, não está presente apenas em situações extremas como essa, ao contrário a previsão do tempo influencia o cotidiano de toda a sociedade.

    Atividades essenciais - como sistemas de transporte aéreos e náuticos, agricultura, construção civil, pesca, turismo - dependem de conhecer e prever as condições do tempo. A atividade também está fortemente relacionada com questões de segurança, especialmente quando se trata de eventos extremos: "É parte da minha rotina de trabalho comunicar à defesa civil sobre a possibilidade de tempestades, granizo e ventos fortes", explica Ana Ávila, meteorologista e pesquisadora do Centro de Pesquisas Meteorológicas e Climáticas Aplicadas à Agricultura da Universidade Estadual de Campinas (Cepagri/Unicamp).

    A previsão do tempo tem um papel fundamental em diversas atividades econômicas, como no setor agrícola. Pryscilla Paiva, jornalista e editora de tempo e clima no Canal Rural, relata que 60% da audiência do site do canal vem da busca informações sobre meteorologia. "O tempo é o único insumo da agricultura sobre o qual o produtor não tem total controle, o que ele pode fazer é se preparar com antecedência e usá-lo como ferramenta".

    A comunicação é parte essencial da previsão do tempo. "A linguagem acessível é algo muito importante em nossa profissão" comenta Ávila. Além disso, o desenvolvimento da previsão do tempo a que temos acesso hoje não seria possível sem a evolução dos meios de comunicação. Hoje a previsão do tempo chega até nós pela TV, rádio, sites, aplicativos de celulares e até pelas redes sociais.

     

    HISTÓRIAS DA PREVISÃO DO TEMPO

    O interesse pela meteorologia começou em torno de 10 mil anos atrás, quando o homem passou a fixar moradia e plantar seu alimento. Mas conforme lembra Giovanni Dolif, meteorologista e pesquisador do Centro de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden), "as primeiras informações da meteorologia surgiram no contexto da navegação, que deu grande impulso para o conhecimento meteorológico". Os primeiros registros de previsão são do século XIX, realizados em Londres, Inglaterra, por Robert Fitzroy, capitão do navio do naturalista inglês Charles Darwin. Antes dele, algumas variáveis da atmosfera eram medidas por instrumentos, fornecendo informações isoladas das condições do tempo. Mas como ressalta Dolif, "a atmosfera envolve todo o planeta e o que acontece em determinado lugar é sempre influenciado pelo que acontece a centenas ou milhares de quilômetros dali". Assim, apenas após a invenção do telégrafo elétrico, em 1837, "o compartilhamento de dados e informações meteorológicas possibilitou uma visão ampla dos sistemas meteorológicos e isso foi um grande avanço, um grande salto na meteorologia", destaca. O pioneiro Robert Fitzroy utilizou os dados recebidos via telégrafo para emitir avisos de tempestades na região costeira em 1860. Em 1861, ele passou a publicar previsões diárias no jornal The Times, em Londres.

    No início do século XX, com a invenção do rádio, informações meteorológicas passaram a ser disseminadas com maior agilidade e começaram a ser realizadas transmissões de previsões do tempo para as embarcações. A primeira transmissão de um boletim de previsão do tempo via rádio foi realizada em Boston, em 1925. Pela televisão foi em 1936, na BBC. "Com a utilização de imagens e mapas ficou muito mais simples descrever as condições do tempo do que só descrevendo com a voz", conta Dolif.

     

    O TEMPO DOS NÚMEROS

    O desenvolvimento da previsão numérica do tempo, baseada na resolução de equações matemáticas que representam as leis físicas, caracterizou outro importante avanço na ciência de prever o tempo. A primeira previsão utilizando recursos computacionais foi realizada nos Estados Unidos, em 1950, pelo Eniac, primeiro computador digital eletrônico de grande escala. Com o tempo, modelos numéricos passaram a ser desenvolvidos e executados em diversos centros de meteorologia ao redor do mundo, mas essas primeiras previsões representavam a atmosfera de forma bastante simplificada e apontavam apenas padrões gerais. A qualidade das previsões do tempo contou também com apoio institucional. Ainda em 1950 foi estabelecida a Organização Meteorológica Mundial (WMO, na sigla em inglês), que um ano depois se tornou uma agência especializada da Organização das Nações Unidas, em um esforço de cooperação para facilitar o intercâmbio gratuito e irrestrito de dados, informações, produtos e serviços meteorológicos.

    Avanços tecnológicos na segunda metade do século XX foram marcados pela obtenção de dados por sensoriamento remoto, que produziram melhorias significativas nas previsões numéricas. Os radares militares passaram a ser utilizados para medições meteorológicas, após o fim da Segunda Guerra Mundial. O primeiro satélite meteorológico foi o Tiros-1, lançado em abril de 1960 pela Nasa, inaugurando uma nova era de observações meteorológicas. Dolif ressalta o grande desenvolvimento na qualidade das previsões na década de 1980 "por conta do advento dos satélites meteorológicos que proporcionaram uma visão mais ampla do nosso planeta". Em paralelo ao aumento de quantidade e qualidade dos dados meteorológicos, "com o aumento da capacidade dos computadores foi possível fazer previsões para mais tempo a frente e com maior grau de detalhamento", afirma Dolif. Finalmente, o advento da internet possibilita hoje o processamento e a troca de bilhões de informações meteorológicas em tempo real.

     

     

    Atualmente as previsões do tempo têm índices de acerto superiores a 85% nos três primeiros dias, e contam com três elementos principais: a rede de observações, os modelos numéricos e os meteorologistas. A rede de observações, coordenada pela WMO, consolida dados coletados a partir de satélites meteorológicos, radares, estações meteorológicas, radiossondas, aeronaves, navios e outras fontes. Quanto maior quantidade, cobertura e precisão das informações, melhor a qualidade das previsões. A partir da análise dos dados meteorológicos, dos resultados dos modelos e levando em conta as particularidades de cada região, os meteorologistas avaliam as condições do tempo, elaboram as previsões e as comunicam para a sociedade. "Como a quantidade de informações é muito grande, o desafio é interpretá-las e levá-las ao público de forma eficiente e clara", aponta Dolif.