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    Ciência e Cultura

    Print version ISSN 0009-6725

    Cienc. Cult. vol.72 no.1 São Paulo Jan./Mar. 2020

    http://dx.doi.org/10.21800/2317-66602020000100021 

    CULTURA
    POESIA

     

    Rodrigo Suzuki Cintra

    Graduado em filosofia pela Universidade de São Paulo (FFLCH-USP) e graduado, mestre e doutor em direito pela USP (Largo de São Francisco). Realizou suas pesquisas de pós-doutorado na Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, em Portugal. É professor da Universidade São Judas Tadeu

     

     

    AQUELA MULHER

    "'But I'm always true to you, darlin', in my fashion..."
    Porter, por Ella

    Não sabia, talvez sabia.
    Procurava encontrar
    a exata medida
    da frase.

    Olhava no dentro dos olhos.

    Mentia, semínima.

    ***

     

    A GAROTA DOS ESPAÇOS INFINITOS

    E tinha aquela história daquela garota performática,
      assintótica,  
      cósmica,  
      ubíqua,  
        tóxica mesmo.

     

    EXPLICAÇÃO (GEOMÉTRICA) DA TRAGÉDIA

    E já tenho saudade das histórias
    pode ser
    que não aconteceram ainda

    estou embriagado de tragédia.

    Entre uma paixão que está longe
    para frente
    e o verso que escrevo nesse momento

    estou alucinado de desejo.

    Uma hipótese trágica não é nem o que
    simplesmente aconteceu
    tampouco aquilo que se previu por certo

    estou insone de sonhos.

    Sou homem-personagem do próprio futuro
    suspiro agora
    os instantes do que é destino ocasionalmente

    estou fingido de quase.

    Sinto que tudo que vejo operará meio
    pelo acaso
    do que inevitavelmente foi determinado por um triz

    estou poeta de amanhã.

    Embriagado do desejo alucinado de sonhar
    acordado tudo
    que por pouco eu fingi para um depois nesse poema

    estou inverso de forma.

     

    GEOMETRIAS DE COSMOS

    Nas geometrias de cosmos
    não há harmonia dos astros
    nem estrutura misteriosa
    de ordenação das pequenas coisas

    tudo é um compasso
    de relâmpago
    um estouro repente de luz
    na brevidade
    do escuro do profundo

    a pele não tem sentido
    de tempo
    que não seja delicadeza

    uma história não começa
    no espaço
    antes de ser saudade

    toda a pintura é ainda
    mais dor
    pela tonalidade do indefinido

    os instantes teimam
    um infinito
    no silêncio do quase

    e estou apaixonado
    por alguém
    pelo talvez das possibilidades

    Nunca olho para as estrelas de madrugada
    tenho o firmamento dentro de mim

     

    HAMLET

    "O resto é silêncio"
    Shakespeare de Hamlet

    O retrato escapa da tela
    e ultrapassa a moldura determinada
    - escultura avessa à própria massa

    A fala foge ao impresso
    um pensamento sugere outro
    - livro que termina sem fim

    O passo para fora do palco
    descobre o fenômeno improvável
    - peça dentro da mesma peça

    A questão além da existência
    o não-ser pondera sobre ser
    - personagem que inventa seu autor

    Um suspiro no limite da vida
    nascimento do silêncio eterno
    nada significa a verdade do real

    ***

     

    O DELÍRIO DE RENATUS CARTESIUS

    IMENSO
    LOGRO,
    EX-ISTO!

     

    O SISTEMA DOS OBJETOS

    Meu pai bate em objetos inanimados.
    Reclama desta inata rebeldia
    com que se negam
    a obedecer sua vontade.

    Reconhece na independência das coisas
    de si
    uma profunda falta de respeito,
    uma primeira subversão.

    Então repreende fisicamente esses seres sem vida
    para trazer de volta
    a verdadeira ordem das coisas,

    sem suspeitar motins,
    quando estes se recusam
    a sentir dor.

    ainda assim

    arriscar um poema que não
    seja cálculo
    que a forma
    fosse subtraída
    como em um assalto

    de propósito

    só impulso
    de pensamento
    um fluxo
    de algo que surge
    como o que é inexplicável

    meio sem querer

    todo desejo
    de viver o texto
    sem tempo ou espaço
    é cartada sem curinga
    como um blefe

    de caso pensado

    em todo verso
    existe a necessidade
    de morte
    das ideias que surgem
    como do nada

    oportunamente

    apenas aquilo que é
    espontâneo
    se destaca se o caso for separar
    de si toda forma de eu

    como um bilhete de suicida.

     

     

    Rodrigo Suzuki Cintra é graduado em filosofia pela Universidade de São Paulo (FFLCH-USP) e graduado, mestre e doutor em direito pela USP (Largo de São Francisco). Realizou suas pesquisas de pós-doutorado na Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, em Portugal. É professor da Universidade São Judas Tadeu. É autor dos livros Liberalismo e natureza - a propriedade em John Locke (Ateliê Editorial, 2010), Shakespeare e Maquiavel - a tragédia da política e do direito (Alameda, 2016) e do livro de poemas Geometrias de cosmos (Ateliê Editorial, 2019). Tem um livro de ekhprasis na internet intitulado A galeria invisível, veiculado pelo site da Revista Zagaia (www.zagaiaemrevista.com.br).