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    Ciência e Cultura

    Print version ISSN 0009-6725On-line version ISSN 2317-6660

    Cienc. Cult. vol.59 no.4 São Paulo  2007

     

     

     

     

    TRABALHO

    Oportunidades e exclusão na sociedade da informação

     

    Há cinco anos, após um amplo levantamento realizado por pesquisadores da Unicamp, USP, UFMG e do Senai, o Ministério do Trabalho lançava uma nova Classificação Brasileira de Ocupações (CBO) para contemplar as mudanças econômicas e tecnológicas ocorridas no mercado em mais de duas décadas desde a sua primeira versão. Ali já estavam contempladas profissões emergentes como a de webmaster (administrador de sites), web designer (desenhista de páginas da internet) e editor de conteúdo para a internet. E novas ocupações surgiram de lá para cá, como no crescente mercado de educação a distância, ainda não catalogadas pelo Ministério do Trabalho.

    Uma delas é a do "tutor", cuja tarefa não se restringe à monitoria dos alunos em aulas presenciais de cursos a distância. "Na verdade, esse profissional deve ser um conhecedor de todo o curso e ainda ter conhecimentos específicos para esclarecer dúvidas dos alunos", afirma João Batista Simão, pesquisador da UnB na área de ciência da informação. Outra ocupação é a do "produtor de conteúdos educacionais" ou "planejador instrucional", que tem a função de elaborar o material adequado para esses cursos a distância. "Em algumas instituições, ele é responsável também por pesquisar sobre o tema do curso, entrevistar especialistas sobre o assunto, fazer coleta de dados, montar a diagramação do curso, separando-o em módulos, e definir o modo de interação do aluno com o curso", completa Simão. Segundo ele, ainda não existe no país curso de graduação para formar produtores de conteúdo, e os que atuam nessa área geralmente vêem da pedagogia, de engenharias ou da análise de sistemas.

    ENSINO À DISTÂNCIA O pesquisador da UnB cita levantamento da Associação Brasileira de Educação a Distância, segundo o qual mais de 2,2 milhões de brasileiros já estudaram ou estão em algum desses cursos credenciados pelo Ministério da Educação. Ele acrescenta dados da Associação e-Learning Brasil: entre 1999 e 2005, o investimento de empresas e instituições de ensino em treinamento de funcionários, cursos rápidos, graduação e pós-graduação foi de R$ 470 milhões, e deve crescer a uma média de 40% ao ano até 2010.

    Boa parte do aumento desse setor se deve à percepção dos empresários de que há um retorno na formação de seus funcionários, além do baixo custo desss cursos."A escola formal nunca deu conta de formar exclusivamente para o mercado e nem é esse o papel dela. Boa parte da formação acontece no próprio trabalho", diz Ana Maria Bianchi, da USP, que trabalhou no levantamento de 2002 feito para o Ministério do Trabalho.

    O estudo já apontava uma tendência que tem se consolidado nos últimos anos: além de gerar novas profissões, as mudanças tecnológicas envolvem toda a economia e afetam, em maior ou menor grau, praticamente todas as ocupações. Além de reduzir postos de trabalho com a automação de caixas de banco, elevadores, bombas de combustível e catracas de ônibus, o leque de funções também se amplia. É o caso do locutor de rádio ou TV: não basta mais ter uma boa voz; tem que atuar em todo o processo da produção até a apresentação. Com as novas tecnologias facilitadoras, o próprio locutor pode substituir o operador em transmissões externas de rádio, por exemplo.

    DESEMPREGO Assim como nas comunicações, vários setores da economia passaram por um processo de reestruturação e enxugamento de seus quadros. "O desemprego não é causado apenas pelos avanços tecnológicos. Aumentou, sim, a concorrência por um posto de trabalho. O mercado ficou mais competitivo, em parte pelas tecnologias, em parte pelas inovações. A produtividade aumentou no mundo inteiro nos mais diversos setores", avalia Bianchi.

    A automatização não somente aumentou muito o desemprego em alguns setores, como, em muitos casos, aumentou o número de horas trabalhadas", acrescenta Georgete Rodrigues, da UnB, que teve a colaboração de Simão e de Patrícia de Andrade, do MCT, em estudo sobre a Sociedade da Informação no Brasil e em Portugal. "Se por um lado a internet, por exemplo, possibilitou às pessoas tornarem-se trabalhadores autônomos, os computadores e celulares disponibilizados pelas grandes empresas aos seus funcionários acabaram tornando-os ‘escravos modernos’", completa.

    EXCLUSÃO Tanto as novas oportunidades de emprego, como a de editor de web ou a de produtor de conteúdo para ensino à distância, quanto a competição acirrada e a "escravização digital" nos mais diversos setores, afetam diretamente a vida de quem já tem acesso às novas tecnologias. Mas o estudo de Georgete, Simão e Patrícia aponta a chance bem maior de Portugal ser bem sucedido em suas políticas para construção de uma sociedade da informação do que o Brasil, não apenas por ter uma população bem menor mas por contar com apoio financeiro da União Européia.

    De fato, uma pesquisa realizada pelo Núcleo de Informação e Coordenação do Comitê Gestor da Internet no Brasil, entre julho e agosto de 2006, mostra que mais da metade da população do país com 10 anos de idade ou mais nunca havia usado um computador na vida. Entre as tecnologias de informação e comunicação (TIC), a televisão, o rádio, o telefone celular móvel e o telefone fixo estão presentes em um percentual de domicílios bem maior que o computador, que aparece em apenas 19,30% das residências brasileiras. E é em casa que a maioria (43,39%) afirma usar o computador, percentual bem acima dos que usam em centros de acesso pago – como as lan houses e os cyber cafés – (25,40%), no trabalho (25,03%), na escola (18,48%), na casa de outra pessoa (16,69%) ou em centros de acesso gratuito – como os telecentros públicos ou comunitários – (3,91%).

    Mesmo entre as pessoas que já usaram computador alguma vez, 59,42% diz que suas habilidades com o computador não são suficientes para o mercado de trabalho. Esse percentual fica acima de 70% entre os que pertencem às classes D e E, entre os que possuem renda familiar até R$ 500 e entre os que têm no máximo o ensino fundamental de instrução.

     

    Rodrigo Cunha